Pressionado pelos partidos políticos, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) voltou atrás ontem à noite no entendimento que havia anunciado dois dias antes e restabeleceu a flexibilidade na regra da verticalização para as eleições de outubro. O primeiro a reformar seu voto foi o presidente da corte, ministro Marco Aurélio Mello, que admitiu que a última decisão do TSE era "passível de falha".
"Não posso me substituir ao Congresso Nacional e insistir na verticalização pura", disse o presidente do TSE, que, na véspera, havia dito que não era um juiz ortodoxo e não teria receio em rever seu ponto de vista. Na terça-feira, porém, ele havia adotado outro tom para justificar a decisão do tribunal: "A verticalização existe ou não existe; ela não pode ser algo de fachada".
Após o julgamento, Marco Aurélio disse ter cometido um equívoco quando decidiu mudar a regra e afirmou estar dando "a mão à palmatória". "Sem dúvida alguma eu parti de um equívoco e dei a mão à palmatória, como incumbe a todo e qualquer juiz fazer tão logo convencido de assistir maior razão a um entendimento que rechaçara", declarou.
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Partidos comemoram
Com esse novo entendimento, o TSE abre espaço para os partidos fecharem alianças informais nos estados diferentes daquelas fechadas na disputa presidencial. Na decisão de terça-feira, que perdeu valor, o tribunal havia retirado dos partidos que não lançarem candidato a presidente da República a liberdade de coligações nos estados. A única exceção seriam as alianças com siglas que também estivessem fora da eleição nacional. A mudança ameaçava até mesmo a mais consolidada das alianças – a coligação entre PFL e PSDB.
Com o entendimento de ontem, os partidos que não tiverem candidatos à sucessão presidencial poderão fazer alianças nos Estados com qualquer sigla. Esse entendimento beneficia diretamente o PMDB, que ficará livre para se aliar nos estados com o PT ou PSDB, conforme a conveniência.
Publicidade"O TSE reconheceu um fator de segurança jurídica, ao reconsiderar a decisão que mudava as regras do jogo", comemorou o presidente do PFL, senador Jorge Bornhausen (SC). "Não acredito que haja mudanças nas regras daqui para frente", completou. A medida também foi saudada pelo presidente do PT, deputado Ricardo Berzoini (SP). "A contragosto, sou obrigado a concordar com o Bornhausen", brincou Berzoini, ao dizer que "prevaleceu o bom senso de não mudar a regra nas vésperas das convenções oficiais".
Admitindo que, se a decisão do TSE prevalecesse, dificilmente a aliança com os pefelistas vingaria, o coordenador da campanha de Geraldo Alckmin, senador Sérgio Guerra (PSDB-PE), disse que o recuo do tribunal selou de vez a coligação entre os dois partidos. “Acabou esse espasmo da crise. Vamos aprovar a criação da aliança com o PFL no domingo”, afirmou, em referência à convenção do partido marcada para Belo Horizonte.
"Volta ao mundo antigo"
Na avaliação do presidente do PMDB, deputado Michel Temer (SP), com a nova decisão do TSE, houve "volta ao mundo antigo". Ou seja, o PMDB mantém a tendência de não disputar a Presidência e não fechar aliança nacional com o PT nem com o PSDB.
O entendimento de terça-feira prejudicava principalmente o partido, que já havia decidido desistir da candidatura própria à Presidência. Sem candidato, de acordo com o breve entendimento do TSE, o PMDB só poderia se coligar nos estados com outras legendas sem candidatura própria à Presidência e que não estivessem coligadas com partidos que disputassem a Presidência. Dessa forma, ficaria impedido de se coligar nos estados com partidos como PDT, Psol, PT, PSDB e PFL, que têm candidato ou estão coligados no âmbito federal.
TSE nega pressão
Apesar do recuo e dos protestos das lideranças partidárias, o presidente do TSE negou que o tribunal tenha reformado sua decisão por causa de pressão política. "De forma alguma (sofreu pressão para mudar de entendimento). O Judiciário não age engajado numa política de governo ou por pressão política. O Judiciário age e atua tendo em conta as balizas e as normas do processo", disse Marco Aurélio de Mello.
"A verticalização é uma instituição que está indo para o túmulo. Mudar agora seria alterar as regras do jogo", afirmou o ministro Carlos Ayres Brito, justificando o seu recuo. Depois da decisão de terça-feira, o presidente do TSE foi visitado por várias lideranças políticas que cobrou dele esclarecimentos sobre as mudanças. Praticamente todos os partidos criticaram as alterações do tribunal.
Segundo o presidente do TSE, o Tribunal partiu do "pressuposto que o STF (Supremo Tribunal Federal) estabeleceu a verticalização pura". Ele afirmou que, depois de ler as notas taquigráficas do STF ontem à noite, verificou que não era essa a interpretação.
"O tribunal saiu fortalecido"
Mello negou que o recuo no entendimento represente um desgaste para o TSE. "O tribunal saiu fortalecido. Mostrou que não tem uma idéia concebida. O tribunal levou em conta a instabilidade política e não queria se tornar uma caixa de surpresas."
Ele rebateu ainda as críticas feitas por políticos que acusaram o TSE de ter legislado. "Não legislamos. Vivemos num sistema em que o direito é posto."