Erich Decat
Enquanto a CPI dos Cartões Corporativos aguarda os acertos finais entre governo e oposição para ser instalada, um outro pedido de investigação começa a circular nos corredores da Câmara. Com base em reportagem publicada pelo Congresso em Foco, o deputado Ivan Valente (Psol-SP) está colhendo assinaturas para que a Casa investigue o pagamento da dívida pública.
“Este é o verdadeiro escândalo dos cartões. O pagamento dessa dívida beneficia apenas os cartões dos banqueiros”, declarou. “A auditoria da dívida pública vai mostrar que ela é ilegítima e ilegal, uma vez que já pagamos essa dívida de oito a dez vezes”, acrescentou.
A iniciativa de Valente se baseia em matéria publicada por este site no último dia 28 que aponta que o atual governo, desde a posse do presidente Lula, em 2003, destinou mais de R$ 851 bilhões somente para o pagamento de juros nominais da dívida pública consolidada (interna e externa).
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Para se ter uma idéia desse valor, é como se cada um dos 186 milhões de brasileiros tivesse desembolsado R$ 4,57 mil, nos últimos cinco anos, apenas para o pagamento de juros da dívida, contraída pelos governos federal, estaduais e municipais, o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e as estatais brasileiras.
O montante equivale a 22 vezes o que o governo federal previa arrecadar só em 2008 com a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), extinta no último dia 31 após ser rejeitada pelos senadores (leia mais).
Lula e FHC
De acordo com ele, a investigação não deve se restringir apenas à administração do atual governo, mas tem de se voltar também para o governo tucano de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002).
“Durante a gestão de Fernando Henrique Cardoso, o pagamento de juros e o esforço fiscal para viabilizá-lo foram condicionados à chamada Lei de Responsabilidade Fiscal, fazendo com que os estados e municípios dessem prioridade para o pagamento de juros da dívida interna em detrimento de gastos sociais, criando um déficit de atendimento à população mais carente e a necessidade de serviços públicos essenciais. Como exemplo, o município de São Paulo destina 13% do seu orçamento para o pagamento de juros da dívida”, afirma o deputado em seu requerimento (veja a íntegra).
Valente diz ter coletado, até agora, cerca de 30 das 171 assinaturas necessárias para a criação de uma CPI na Câmara. Segundo o documento, o objetivo da comissão é “investigar a dívida pública da União, Estados e municípios, o pagamento de juros da mesma, os beneficiários destes pagamentos e o seu monumental impacto nas políticas sociais e no desenvolvimento sustentável do país”.
“A dívida pública e a sangria de recursos públicos destinados ao pagamento de juros foram muitas vezes postos em debate, mas ainda não mereceram o tratamento adequado por parte do Congresso Nacional. Este é o instrumento democrático mais adequado e eficaz para investigar a fundo esta questão e suas conseqüências para o desenvolvimento e a soberania nacional”, defende o deputado do Psol em outro trecho do requerimento que corre a Câmara.
Futuro indefinido
Procurado pela reportagem, o líder do governo na Casa, Henrique Fontanta (PT-RS), disse que não comentaria o pedido de investigação porque ainda não conhece o conteúdo do requerimento.
Apesar de também não ter o pleno conhecimento da proposta de Valente, o líder do DEM, Onyx Lorenzoni (RS), defende a investigação dos gastos. “O deputado Ivan Valente ainda não me procurou, mas a tese apresentada por ele é interessante, principalmente, por envolver dinheiro público”, avalia. O líder do PT na Casa, Luiz Sérgio (RJ), não retornou os recados deixados pela reportagem.
Em 2005, o Congresso engavetou o pedido de criação da CPI das Dívidas Interna e Externa, apresentado pela então deputada Dra. Clair (PT-PR). Ex-coordenadora da Frente Parlamentar de Acompanhamento da Dívida Pública, Dra. Clair chegou a reunir assinaturas de 188 deputados e 31 senadores para exigir uma auditoria da dívida pública por parte do Congresso, conforme prevê a Constituição. O requerimento, no entanto, acabou sendo engavetado pela falta de interesse tanto do governo quanto da oposição em levar a apuração adiante.