[fotografo]Ag. Câmara[/fotografo]
Equiparação de cargos de nível médio e superior divide funcionários do Congresso. Para analistas, medida abre caminho para igualdade salarial
Uma polêmica proposta de mudança nos cargos da Câmara tem o poder de elevar os gastos da Casa em R$ 80 milhões por ano, segundo cálculos de analistas do órgão. Proposta pelo sindicato dos funcionários do Congresso (Sindilegis), a medida exige que, nos próximos concursos, os candidatos a técnico legislativo tenham diploma universitário. Hoje é exigido apenas nível médio para essas vagas. Mas a análise de um caso semelhante pela Casa Civil da Presidência e uma ação do Ministério Público Federal sustentam que o mecanismo, na verdade, transforma cargos e acarreta
gastos extras aos cofres públicos. A Câmara, porém, não discute o assunto.
Os técnicos e o Sindilegis garantem que não haverá aumento salarial nenhum, mas apenas melhora na qualificação dos servidores. Hoje, a exigência é de ensino médio para esse tipo de cargo e curso superior para analistas. Atualmente, 90% dos técnicos têm formação superior completa.
O Sindilegis promete impedir qualquer aumento de salários. “Vamos colocar claramente que não haverá aumento de despesas”, diz o diretor de benefícios do sindicato, Hélder Azevedo. Ele afirma que o único objetivo da proposta do sindicato é melhorar a qualificação. Mas, se não haverá aumento e hoje 90% dos técnicos já têm curso superior, será apenas uma mudança de “status” no crachá? “Eu acho que também”, responde Azevedo, que acumula o cargo com a presidência da associação dos técnicos da Câmara (Astec).
Hoje, a Câmara tem 1.556 técnicos legislativos, que poderiam ser beneficiados pela medida. Preocupados, os analistas da Câmara passaram a semana temerosos de que a proposta seria enxertada como emenda no projeto de resolução que criou cargos comissionados para os recém-criados partidos Solidariedade e Pros, o que não aconteceu. Também achavam que iria para reunião da Mesa Diretora da Câmara na tarde de quinta-feira (18). O diretor geral, Sérgio Sampaio, negou essa possibilidade.
Fora das mãos
A proposta foi entregue a Sérgio Sampaio pelo Sindilegis em junho. Nela, o presidente da entidade, Nilton Paixão, diz que há uma “tendência nacional” de “elevar os cargos de nível médio, com atribuições de elevado grau de complexidade, para o nível superior”, como já aconteceu na Receita Federal, na Polícia Federal, no Banco Central e na Polícia Rodoviária Federal.
De acordo com Hélder Azevedo, o diretor-geral disse a ele que “não tem nada contra a medida”. Em entrevista ao site, porém, Sérgio Sampaio, afirmou que sequer sabia da existência da proposta. “Esse assunto nunca esteve na minha mão. Desconheço qualquer assunto”, afirmou Sampaio, categórico, na manhã de quarta-feira (18). “Não irá à reunião da Mesa”, continuou. Por meio da assessoria da Câmara, ele afirmou que “este assunto não está sendo tratado nem pela Administração, nem pela Mesa Diretora da Câmara dos Deputados”.
Remunerações superiores
Desde 2011, o Ministério Público pede a derrubada de medida semelhante na Receita Federal. Uma lei de 2007 fez os técnicos virarem analistas naquele órgão. Em ação direta de inconstitucionalidade, o então procurador-geral da República, Roberto Gurgel, disse que a medida é inconstitucional. “É evidente o prejuízo de dificílima reparação, uma vez que as transposições de servidores (…) resultam no pagamento de remunerações em valores superiores aos devidos e, consequentemente, em dispêndio indevido de receitas públicas, a ser renovado mensalmente”, disse ele na petição. O caso está no gabinete do ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes.
Hélder Azevedo diz que o Ministério Público está equivocado. Para exemplificar, ele enviou ao site julgamento do Supremo que considerou legal maior exigência em concurso públicos em Santa Catarina. Entretanto, o próprio STF disse que a medida implicou aumento de custos, mas que deveriam ser desprezados. “[A rejeição da liminar pedida] não afetará as finanças do Estado mais do que vinham sendo afetadas nestes últimos seis anos”, diz a decisão, relatada pelo então ministro Sidney Sanches. “Mesmo havendo aumento salarial, o que não é o caso nosso, ele negou o pedido de inconstitucionalidade”, explicou Azevedo.
Se fosse encampada pela Câmara, esta não seria a primeira tentativa da casa de exigir diploma de curso superior nos concursos para técnicos. A última vez foi em 2010, ao aprovar um plano de carreira que concedia aumentos de até 40% aos servidores, como mostrou o Congresso em Foco. Mas a Casa Civil vetou a medida por entender que o objetivo não era melhorar a qualificação dos servidores. “O dispositivo transforma cargos ocupados de nível médio em cargos de nível superior, resultando assim em ascensão funcional por via indireta”, registrou a mensagem de veto do então presidente Lula.
Azevedo, do Sindilegis, diz que a Casa Civil agiu com correção ao vetar o dispositivo. Agora, a nova exigência de curso superior não trará os custos como a anterior, porque a redação da lei que define os salários dos funcionários impediria a elevação de despesas, segundo ele.
No julgamento dos supersalários da Câmara, em agosto de 2013, o Tribunal de Contas da União (TCU) atribuiu à casa uma prática ilegal semelhante à proposta de agora: promover ilegalmente técnicos com salários de analistas. Esse mecanismo rendeu prejuízos de R$ 18 milhões por ano aos cofres públicos. Pela determinação do TCU, a promoção ilegal deveria ser suspensa pela casa a partir de outubro, mas as verbas ilegais recebidas no passado deveriam ser mantidas até serem absorvidas por novos aumentos salariais.
Equiparação
Analistas ouvidos pelo site entendem que a proposta do Sindilegis oferece custo zero num primeiro momento. Entretanto, num segundo instante, com a equiparação a “cargos de nível superior”, os técnicos exigiriam também igualdade com os salários dos analistas, que são maiores. Azevedo nega. “Queremos um servidor mais preparado e mais qualificado”, explica o diretor do sindicato, repetindo argumentos da proposta enviada a Sérgio Sampaio. “Tal medida, além de reduzir custos com a capacitação de servidores, está em sintonia com a orientação gestão estratégica da Casa, que entre outros valores inclui a busca pela excelência”, diz o ofício 109/13, assinado por Nilton Paixão.