Está em tramitação no Senado uma proposta legislativa que, se for aprovada, permitirá aos turistas de chegada ao Brasil dobrar o valor das compras isentas de impostos e taxação de bagagem, nas chamadas lojas francas (ou “free shops”). Hoje, o limite de compra nos free shops é de US$ 500 no desembarque por via aérea ou marítima – em caso de fronteira terrestre, o valor é ainda menor: R$ 300. O projeto propõe estabelecer esse limite em US$ 1,2 mil por passageiro, algo em torno de R$ 2,4 mil – ou o equivalente em outra moeda.
Confira a íntegra do Projeto de Lei do Senado 355/2012
Brasil tem 263 free shops distribuídos por 13 cidades
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O projeto está em exame na Comissão de Relações Exteriores, à espera de um relator – o que deve acontecer, prevê o autor da proposição, senador Cyro Miranda (PSDB-GO), na próxima semana. Uma vez designada a relatoria, a matéria segue para outro colegiado temático, a Comissão de Assuntos Econômicos, onde será apreciada em caráter terminativo (sem necessidade de votação em plenário, caso não haja recurso para isso). Depois dessa fase de tramitação, e devidamente aprovada, a matéria segue para a Câmara.
O senador diz acreditar que ninguém vai se opor à votação em plenário. Ele conta que conversou com muitos parlamentares sobre o assunto, com boa receptividade. “A não ser que o governo ache que isso não é interessante – se achar isso, é melhor acabar com essas lojas”, opina, lembrando que as free shops foram concebidas para evitar que o dinheiro gasto com compras por quem viajava para o exterior não saísse do país.
Com a valorização do real diante do dólar e do euro, o preço dos produtos para os brasileiros ficou muito baixo no exterior. Os que podem viajar para o exterior voltam de outros países abarrotados de produtos. E a diferença nos free shops pela não incidência de impostos tornou-se menos atraente. Cyro acredita que o aumento da cota fará com que os valores cobrados pelos produtos nas lojas dos aeroportos caia, com o aumento da oferta. Aquecendo uma atividade econômica que acontece dentro do próprio país, com geração de empregos e pagamentos de outros impostos, para o funcionamento das próprias lojas.
Cyro até acha que o ideal, com cálculos e correções de defasagem de moeda desde a instituição do sistema free shop, fosse que a cota de compras ultrapassasse R$ 2 mil.
Correção que, segundo o senador, é questão de racionalidade mercadológica. “Não estamos criando nada novo – quem criou foi o governo. É a mesma coisa que não deixar mais subir o preço dos automóveis, com os carros custando sempre o mesmo preço. [A indústria automobilística] ia deixar de fabricar”, compara Cyro Miranda, admitindo não saber qual será a reação da Receita Federal.
“Isso era uma coisa que estava despercebida por todo mundo. Acho que a própria Receita não se deu conta disso, nem nunca foi incomodada com isso. Ela deve fazer uma análise, e vai ver que não existe nada que não precise ser corrigido”, acrescentou.
Lobby?
Cyro diz ter sido procurado por empresários do setor, que disseram estar perdendo o interesse nos free shops. Mas o senador fez questão de frisar que não se trata de lobby.
“Eu não diria lobby, mas uma reivindicação. Eles vieram pontuar uma coisa alegando que estão sendo prejudicados. Eles vieram fazer uma queixa”, declarou o parlamentar goiano, lembrando que, segundo os empresários, esse tipo de comércio vai desaparecer “em cinco ou seis anos” se não houver o aumento da cota.
“Para você ter uma ideia, o limite de 500 dólares existe desde a década de 1960. Com a inflação acima do dólar, de 1960 para cá, daqui a pouco só vai dar para comprar um vidro de perfume. Eles estão dizendo que os free shops não estão se justificando daqui pra frente. As vendas estão caindo tremendamente”, relatou.
O senador, que considera justa a demanda de empresários do setor, quis ilustrar a situação com um exemplo. “Antigamente, se comprava um perfume por 35 dólares. Hoje, esse perfume custa de 90 a 110 dólares. Nunca houve correção [do limite de compras]. Eu acho que está na hora de fazer [o projeto], acho mais do que justo. Ou então acaba com isso. O comércio em free shops está se tornando desprezível”, emendou.
Impacto mínimo
O senador diz que o aumento do limite de compras não terá qualquer impacto para as contas da Receita Federal. Para o tucano, o limite, uma vez instituído, deveria ter sido corrigido sazonalmente, de acordo com as variações inflacionárias e a realidade da economia em cada época – situação do mercado financeiro, taxa de juros, valorização da moeda etc. Para Cyro, a estabilidade do dólar nas últimas décadas justifica a correção.
“Se o governo criou, fez uma previsão. Só que não corrigiu mais essa previsão. No passado, esse limite representava muito mais”, observou o senador, para quem o estímulo dado à época para consumidores e comerciantes está defasado em seus próprios propósitos. “O dólar, durante muitos anos, não teve correção, ficou como moeda forte. De uns 15 anos pra cá, começou a haver uma movimentação muito grande. O que temos de decidir? Se não quiserem aprovar o aumento com esse projeto, então temos que acabar com os free shops”, argumenta.
O senador diz que sua equipe fez uma pesquisa sobre a prática em alguns países, e verificou que as cotas são “muito maiores” em boa parte deles. “A gente tem visto também que o empresário do setor está cada vez investindo menos, diminuindo a quantidade de produtos, porque não retorno”, acrescentou, ressalvando não ter feito cálculos gerais sobre a arrecadação em nível nacional. “Mas eu te garanto que é muito pouco.”
Para o senador, manter a taxa no nível atual equivale a querer impor restrições às viagens, por exemplo fixando duas viagens internacionais por ano para cada brasileiro – algo impraticável e irracional, diz.