A três meses de concluir suas investigações, a CPI dos Correios corre contra o tempo para fechar o elo entre a origem e o destino dos mais de R$ 151 milhões em empréstimos feitos pelo empresário Marcos Valério nos bancos Rural e BMG, declarados por ele à Procuradoria Geral da República (PGR). Acusado de financiar o caixa dois do PT, Valério alega ter repassado R$ 55 milhões desse montante para pessoas indicadas pelo então tesoureiro do partido, Delúbio Soares. Caso não haja prorrogação dos trabalhos, a CPI terá apenas até novembro para concluir suas investigações e apresentar o relatório final.
“O foco das investigações agora vai ser a origem dos recursos das contas do empresário Marcos Valério”, disse o presidente da CPI, senador Delcídio Amaral (PT-MS). Até agora, a comissão não conseguiu precisar quanto, nem a fonte do dinheiro que teria irrigado campanhas eleitorais de petistas e partidos da base aliada. Nem até que ponto se sustenta a versão de caixa dois assumida pelos principais personagens de um dos maiores escândalos políticos do país, muito menos a cifra de dinheiro público usado na transação.“Depois de ouvirmos depoimentos contundentes, agora é o momento da paciência e da análise de documentos”, ponderou o relator da CPI, deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR).
O problema é que a documentação em poder da comissão está longe de comprovar o destino dos outros R$ 96 milhões levantados por meio de 11 contratos assinados por Valério. Um dos principais desafios dos parlamentares é descobrir se esse dinheiro foi mesmo destinado a políticos. “Temos que esclarecer qual relação financeira havia entre Marcos Valério e Delúbio Soares”, afirmou o deputado Gustavo Fruet (PSDB-PR), sub-relator responsável pela movimentação financeira. “Não significa que esses R$ 151 milhões foram integralmente repassados para o PT”, advertiu Fruet ao Congresso em Foco . Veja aqui a lista dos empréstimos.
Uma das hipóteses com a qual trabalham os técnicos e integrantes da CPI é que muitos desses empréstimos (sete no Rural e quatro no BMG) foram tomados para a rolagem de dívidas. Essas operações são chamadas no mercado de “mata-mata”. A informação é sustentada por um dos advogados do empresário mineiro. “Valério só assinou cinco contratos”, disse João Manoel Martins ao Congresso em Foco .
Publicidade
Diferentemente das informações obtidas pela CPI e declaradas pelo empresário ao Ministério Público, a assessoria de imprensa de Valério confirmou que ele tomou somente cinco empréstimos em nome de suas empresas para o PT, entre os anos de 2003 e 2004, no total de R$ 55 milhões. Corrigida hoje, a dívida alcançaria a marca de R$ 92,5 milhões.
Mas o valor cobrado judicialmente por Valério dos petistas é ainda maior. Na última sexta-feira, o empresário entrou com duas notificações na Justiça. Além do grosso da dívida, o sócio da SMP&B reivindica o pagamento de uma parcela de R$ 460 mil de um empréstimo feito pelo PT e coberto por ele no BMG.
De acordo com o advogado do empresário, as dívidas contraídas pelo Partido dos Trabalhadores com o seu cliente foram confirmadas pelo próprio Delúbio, em depoimento prestado à CPI do Mensalão, na última quinta-feira. Os recursos, segundo Valério, foram utilizados para financiar campanhas eleitorais de petistas e políticos da base aliada.
A antiga e a atual direção nacional do PT ignoram veementemente a existência da dívida contraída diretamente pelo empresário. No mês passado, o Diretório Nacional disse que só vai arcar com os empréstimos feitos exclusivamente pelo partido. A atual cúpula já avisou: não vai reconhecer os contratos de gaveta feitos pelo ex-tesoureiro sem a anuência da direção nacional.
Na verdade, o partido admite apenas dois empréstimos avalizados por Valério. Reportagem do Congresso em Foco da última quinta-feira revelou que essas operações já haviam sido reconhecidas na prestação de contas do Diretório Nacional do PT de 2003 ( leia mais ).
A comissão aguarda o envio desses contratos para saber qual o destino da movimentação milionária feita pelo empresário. Com esses papéis em mãos será possível, enfim, cruzar as informações e identificar quanto, de fato, abasteceu o caixa dois do PT.
De acordo com o Banco Central (responsável por verificar a saúde financeira das instituições bancárias), todos os contratos feitos pelo empresário com os bancos Rural e BMG foram realizados “sem provisão de pagamentos”, isto é, a fundo perdido. “Isso pode ser um indício de tráfico de influência de Valério nesses bancos”, avalia Gustavo Fruet.