João Batista Araujo e Oliveira*
Por meio do PL 336/2017, o senador Wilder Morais encaminha uma proposta para extinguir a progressão continuada na educação básica. Neste artigo, enviado para o Congresso em Foco, gostaria de convidar o senador – e a todos, como ele, empenhados na melhoria da educação – para fazer uma reflexão com base nas seguintes perguntas: o que dizem as evidências sobre o tema? Como poderia um senador da República contribuir para melhorar a educação no país?
As evidências estão do lado do senador quando ele aponta para os malefícios de uma educação de má qualidade, na escola e na vida. Alunos com escolaridade menor, incompleta, ou fraco desempenho, se dão mal na escola e pior na vida – especialmente na capacidade de ganhar a vida. Mas daí a dizer que a repetência vai melhorar a escola ou reduzir a criminalidade vai um abismo.
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Os resultados educacionais do Brasil mostram que, se fôssemos aplicar critérios minimamente rigorosos, mais da metade dos alunos do 5o ano deveriam ser reprovados – e possivelmente nunca deveriam ter chegado lá. No 9o ano, a proporção seria de mais de 80%.
Portanto, o fato de um aluno passar ou ser reprovado, no Brasil, não significa que quem passou sabe o necessário. Os números também mostram que o aluno que nunca foi reprovado, em média, tem notas melhores do que um aluno reprovado. Em outras palavras: a abolição da reprovação não piorou as notas na Prova Brasil do 5o ano. Não paira a menor sombra de dúvida quanto a isso.
Por outro lado, há evidências de que a reprovação – especialmente a reprovação em massa praticada no Brasil – faz muito mal. Primeiro, ela faz mal à economia – por exemplo, em 2015 desperdiçamos mais de 17 bilhões de reais com alunos reprovados no ensino fundamental e médio. Segundo, ela faz mal aos alunos – o aluno reprovado, especialmente o aluno multi-reprovado, tende a ter desempenho pior e é forte candidato à deserção escolar.
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Estudos do IDados, entre outros, também mostram o efeito negativo das classes com repetentes sobre os não repetentes. Em síntese: são nefastos os efeitos da repetência, especialmente da repetência em massa existente no Brasil. E ela se concentra em lugares onde os professores são os menos preparados. Tal como praticada, especialmente no Norte e Nordeste do país, ela constitui um verdadeiro genocídio.
Não há evidências de que a qualidade do ensino ou da aprendizagem piorou com a adoção do sistema de aprovação automática: ela era ruim e continua muito ruim. Também não há evidências de que a autoridade do professor fica diminuída sem o poder de reprovar: há sistemas educativos bem-sucedidos, em vários países, nos quais a função do professor é ensinar e torcer pelo sucesso do aluno – a avaliação e o julgamento são feitos por outras instâncias.
Também não há evidências de que os alunos não são alfabetizados no 1o ano por conta da aprovação automática: eles não são alfabetizados porque não há desejo das autoridades de que isso aconteça – basta ver as propostas das universidades públicas e do MEC para lidar com a questão. Por sua vez, a autoridade do professor não deriva do seu poder de aprovar ou reprovar – ela deriva de sua competência, do respeito que ele adquire em função da mesma e do apoio que ele recebe do diretor da escola e da sociedade.
Nada do que foi dito até aqui sugere que a aprovação automática contribui para melhorar a educação. Apenas estamos registrando que a reprovação não é solução para os graves problemas que afetam a educação brasileira, nem os da escola e nem os da violência e da criminalidade.
Como melhorar a educação? Há algumas poucas estratégias de sucesso comprovado no mundo, e elas são razoavelmente bem conhecidas. E elas reforçam a ideia de que não se melhora a educação por leis ou decretos. Se assim fosse, o Brasil seria o país mais bem-educado do mundo.
Para atingir os objetivos a que se propõe o Senador Wilder Morais, possivelmente seria muito mais benéfico para o país se os nossos legisladores empreendessem uma cruzada cívica para eliminar 95% da leis, decretos e pareceres que servem sobretudo a interesses corporativos, elevam os custos para os municípios e para o setor privado, e atrapalham a melhoria da educação. Além de um bom começo, isso poderia criar espaço para a revolução educacional de que tanto o nosso país precisa.
*João Batista Araujo e Oliveira é presidente do Instituto Alfa e Beto
<< Do mesmo autor: O Plano Nacional de Educação e o ajuste fiscal