Roberto Marques – Agência UniCeub
A legislação brasileira possui leis que condenam qualquer forma de preconceito aos portadores do vírus HIV. No entanto, as Forças Armadas exigem o exame que detecta o vírus. O resultado positivo impede o ingresso de soropositivos na carreira militar. O argumento está envolto de um discurso delicado, pois a ciência já comprovou que uma pessoa portadora de HIV pode não desenvolver Aids durante toda a vida, se tomar os cuidados indicados, gratuitamente disponibilizadas pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
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Para ingressar na carreira militar é preciso passar por um rigoroso teste de aptidão física. Os candidatos são submetidos a vários exames médicos que possam comprovar sua saúde física dentro dos parâmetros militares, e mesmo aprovados, não podem exercer o cargo se o exame de HIV for positivo.
Essa prática, embora alvo de críticas, não é proibida. Há militares que contraíram o vírus depois de ingressar nas Forças Armadas, e não foram exonerados, de acordo com a Ouvidoria do Exército Brasileiro. O assessor técnico do Ministério da Defesa, Alexandre Gonzaga, explicou que, por lei, as Forças Armadas têm autonomia para decidir não aceitar candidatos que apresentarem algum tipo de debilitação que os impeça de exercer seus cargos.
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Segundo o contra-almirante Flávio Augusto Viana Rocha, o exame que detecta o HIV é cobrado porque todo cargo de ingresso na Marinha passa pelo mesmo sistema rigoroso de aptidão física estabelecido no edital pela Lei n° 12.704. Mas, independentemente da função que ocupariam, os portadores do vírus são considerados inaptos e não podem integrar na Força.
A Ouvidoria do Exército admitiu que há vários oficiais portadores do HIV, visto que contraíram o vírus no período em que já representavam o Exército. Se confirmada a informação nesses casos, os funcionários são direcionados a cargos que não necessitem de exigências físicas. Ainda segundo a Ouvidoria, a prática que cobra o exame que detecta o HIV é adotada para o bem-estar do candidato, não sendo uma medida discriminatória.
“Os novos candidatos que entram na corporação são treinados para o combate e não devem portar nenhuma doença que comprometa sua disposição física”, ressaltou a Ouvidoria.
Legislação
Diferentemente das Forças Armadas, as empresas privadas e outras instituições públicas estão proibidas de pedir o exame de HIV aos aspirantes a vagas de trabalho. Essa regra está contida na Lei nº 11.199/2002, que considera discriminação aos portadores do HIV e das pessoas com Aids a exigência de exames de detecção do vírus em inscrições de concurso ou seleção para ingressar no serviço público e privado.
Alcídio Nogueira, 49, tem HIV e não esconde a doença. “Eu tenho Aids há dois anos e já trabalhei mesmo nessa situação. Nunca sofri preconceitos que me impedissem de arrumar trabalho, graças a Deus. Mas sei que nem todos têm essa sorte.”
A advogada Renata Salomão Gonsalves, 32, considera o assunto controverso. “Via de regra, as pessoas não podem sofrer preconceito por portar o vírus, ou qualquer outra doença. Além disso, não pode ser preterida uma contratação sob essa alegação”.
Segundo a especialista, antigamente havia muitos casos de demissões porque não existiam leis específicas para soropositivos e o acesso a medicamentos era muito limitado. Ainda de acordo com a advogada, em referência aos concursos militares, a exigência do exame de HIV não é uma proibição porque, em casos de concursos, há leis próprias que não têm especificidades.
“No geral, a administração pública precisa comprovar a incompatibilidade de candidatos para cargos aspirados. No caso, se há vaga para motoristas de transportes públicos, por exemplo, não pode haver contratação de pessoas cegas, por questões óbvias”.
De acordo com Renata Salomão, as Forças Armadas deveriam justificar o porquê da não contratação de um portador do HIV para funções que não necessitem de desgastes físicos que coloquem seu tratamento em risco. Mesmo assim, não existe uma lei que obrigue a efetivação de contratações nesses casos.