VEJA
Um país de muito passado agora tem algum futuro
Em 1953, levado a julgamento pelo crime de ter enviado seus primeiros seguidores para um ataque suicida a um quartel, o jovem advogado Fidel Castro Ruz assumiu a própria defesa e o fez de forma magnífica. Antecipando a retórica magnética, grandiosa, arrogante mas farsesca que o caracterizaria pelo resto da vida política, disse aos juízes: "A história me absolverá". Passou-se mais de meio século e, aos 81 anos, conceda-se, Fidel está diante do tribunal da história. Visto o sofrimento que infligiu ao povo durante 49 anos como senhor absoluto de Cuba, a absolvição está fora de cogitação. Cabe recurso? Não dá mais tempo. Fidel está em fase terminal de uma grave doença e, na semana passada, anunciou que não mais concorreria à eleição indireta que escolhe o presidente e o comandante-em-chefe das Forças Armadas.
Lula surfa na supereconomia
Em troca do reconhecimento de sua independência, dois séculos atrás, o Brasil foi obrigado a absorver toda a dívida que Portugal tinha com bancos ingleses: uma fortuna, para o período, de 2 milhões de libras esterlinas. Foi a única dívida que o país herdou e a primeira de muitas gestadas por aqui mesmo. As crises mais dramáticas enfrentadas pelo Brasil ao longo de sua história deveram-se à falta de dólares ou de vergonha na cara para honrar compromissos internacionais assumidos pelo governo e por suas empresas. Desprovidos de qualquer base teórica sólida, governos sucessivos defenderam, sem enrubescer, a tese de que o atraso do país se devia à dependência financeira externa, uma espécie de pecado original. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva e seu PT perderam três eleições presidenciais (em 1989, 1994 e 1998) tendo como bandeira o calote da dívida externa. A ruptura de Lula com as idéias anacrônicas foi marcada pela divulgação da Carta ao Povo Brasileiro, em junho de 2002, em meio à turbulência financeira irradiada pela então provável ascensão do PT ao poder. No documento, o petista afirmava que, se eleito, honraria o pagamento da dívida. Fez mais do que isso. Na semana passada, o Banco Central anunciou que, em janeiro, pela primeira vez na história, o Brasil passou de devedor a credor externo.
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ÉPOCA
Cuba sem Fidel
Uma ilha no Caribe, do tamanho de Santa Catarina e com o PIB menor que o da Bahia, tornou-se, na semana passada, o epicentro de um furacão mundial, com tremores de alívio e tristeza sentidos em todos os continentes. O furacão leva o nome de Fidel Castro, de 81 anos, 1,91 metro de altura, o maior sobrevivente da história política mundial. O comunista Fidel resistiu a 638 tentativas de assassinato, nas contas do regime cubano, a dez presidentes americanos e a cinco papas. De cada dez cubanos vivos, sete só conheceram um líder. Prolixo, barbudo, de carisma irrefutável, um amante de charutos, mulheres e beisebol (leia mais), Fidel era o chefe de governo mais antigo do mundo até a terça-feira, quando decidiu deixar a Presidência após 49 anos para se tornar, como escreveu em sua carta aberta, “um simples soldado no campo das idéias”. Sua renúncia abriu um riquíssimo debate sobre o abismo entre os sonhos e a realidade da revolução que derrubou o ditador Fulgencio Batista em janeiro de 1959.
Contratos sob suspeita
Virou um caso de polícia, mas no começo a Fundação de Empreendimentos Científicos e Tecnológicos (Finatec), ligada à Universidade de Brasília (UnB), tinha objetivos nobres. Ela foi criada em 1992 por 12 professores da UnB para captar recursos para o desenvolvimento da pesquisa científica e tecnológica. Sua inspiração era o bem-sucedido exemplo de instituições tradicionais como a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), que há 40 anos dá apoio à pesquisa científica em São Paulo. Até 20 dias atrás, desconhecida fora dos meios universitários, a Finatec seguia uma rotina discreta. Ela saltou para as páginas dos jornais depois que uma investigação do Ministério Público do Distrito Federal concluiu que seu dinheiro estava sendo gasto em finalidades nada acadêmicas. Dos cofres da Finatec saíram R$ 389 mil para mobiliar – com artigos como um saca-rolhas de R$ 859 e lixeiras de R$ 1 mil – o apartamento do reitor da UnB, Timothy Mulholland.
CARTA CAPITAL
Fidel Castro e o golpe de 1964
Mais coerente e desabrido do que seus pares, Ruy Mesquita disse que a Revolução Cubana foi a maior tragédia política do século passado. Trata-se de um ponto de vista que os senhores da mídia nativa certamente compartilham, embora menos claros e peremptórios do que Mesquita. Na minha opinião, a maior tragédia política do século passado para o Brasil foi o golpe de 1964, com todas as conseqüências e desdobramentos, pelos quais pagamos até hoje. Deste ângulo, a presença de Fidel Castro no cenário latino-americano teve importância notável. A decisiva contribuição do governo dos Estados Unidos e dos seus instrumentos de agressão, dos mais subdolosos aos mais ostensivos, ao golpe perpetrado pelos gendarmes da elite brasileira poderia ter outra dimensão caso não se percebesse na linha do horizonte a ilha de Fidel. Algo assim como a montanha nevoenta que surge aos olhos de Ulisses, o Odisseu, ao cabo de sua última viagem, que Dante cantou em lugar de Homero.
Sinais positivos no ar
Há indicadores promissores de um 2008 de relativa paz econômica no Brasil, a despeito da crise americana. A Bovespa zerou as perdas do ano, embalada por um sentimento de que as agências de classificação de riscos vão, em breve, conceder grau de investimento ao País, um carimbo de bom pagador. Também mudou o sinal do fluxo de moeda estrangeira. Depois de ficar negativo em janeiro, houve saldo positivo de 1,048 bilhão de dólares nos nove primeiros dias de fevereiro, informou o Banco Central. Em janeiro foram criados 142 mil novos postos de trabalhos formais, um aumento de 37 mil vagas em relação ao mesmo mês de 2007. O nível de utilização da capacidade instalada da indústria brasileira acomodou-se em 83% em dezembro, o que espanta o fantasma da falta de produtos por causa de instalações fabris insuficientes. A inflação, que chegou a assustar nos últimos dois meses de 2007, recuou para 0,54% em dezembro, uma queda de 0,20 ponto porcentual ante o mês anterior.
ISTO É
Alckmin será candidato
Quando dois ou mais tucanos ligados a Geraldo Alckmin estão reunidos, o governador paulista, José Serra (PSDB), é chamado de Dona Flor. Que fique muito claro: não se trata de uma referência pejorativa. A metáfora com a personagem de Jorge Amado, que desfilava pelas ruas de Salvador de braços dados com seus dois maridos – um de cada lado – tem um significado exclusivamente político. A não ser que consiga convencer o prefeito Gilberto Kassab (DEM) a abrir mão de postular a reeleição, Serra terá que entrar na disputa eleitoral paulistana com um candidato em cada braço. Respaldado em números de pesquisas pré-eleitorais, Alckmin decidiu que não atenderá aos apelos do governador e de Fernando Henrique Cardoso e irá disputar a Prefeitura de São Paulo. Já está inclusive montando sua estrutura de campanha. "É claro que a manutenção da aliança com o DEM é importante para o PSDB e para o País, mas essa parceria não precisa necessariamente ocorrer desde o primeiro turno da eleição municipal", tem dito Alckmin a interlocutores tanto do PSDB como do DEM.
Retrato da impunidade
Depois de 30 anos, um dos mais longos processos da Justiça brasileira chegou a um veredicto. O Supremo Tribunal Federal (STF) condenou o deputado Paulo Salim Maluf (PP-SP) e mais cinco réus a ressarcirem o Estado de São Paulo em R$ 4,3 bilhões. Trata-se do chamado caso Paulipetro. Em março de 1979, Maluf assumiu o governo paulista, acalentando o sonho de chegar ao Planalto. Decidiu, então, fundar uma empresa estadual de petróleo, a Paulipetro. Investiu US$ 250 milhões na aventura.Perfurou 69 postos na Bacia do Rio Paraná e só encontrou água. A decisão do STF, no entanto, não significa que 30 anos depois o ex-governador seja efetivamente punido.
Página atualizada às 12h05