O presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, determinou nesta quinta-feira (21) o fechamento da fronteira do país vizinho com o Brasil a partir das 20h. Além da medida extrema, o venezuelano anunciou a realização de um “grande show” musical no perímetro de fronteira com a Colômbia, que também pode sofrer a obstrução de divisa com a Venezuela. Na área, a cidade de Cúcuta recebe e centraliza doações de outros países para a população venezuelana.
“A partir das 20h de hoje [horário da capital Caracas], a fronteira terrestre com o Brasil será fechada”, avisou Maduro em reunião com o Estado Maior das Forças Armadas Nacionais Bolivarianas (FANB), por videoconferência operada pelo Comando Estratégico Operacional de Caracas.
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“Decidi que está totalmente fechado [o perímetro de fronteira]. Até novo aviso sobre a fronteira terrestre com o Brasil, melhor prevenir do que remediar. Quero que seja uma fronteira dinâmica e aberta com a Colômbia, mas sem provocações”, argumentou o presidente da Venezuela.
O Congresso em Foco procurou o Ministério das Relações Exteriores (MRE) para comentar o anúncio de Maduro. Pouco depois da publicação desta reportagem, por volta da 17h, a assessoria de comunicação do MRE comunicou que “está em elaboração nota sobre o assunto, que será divulgada assim que aprovada por todos os órgãos envolvidos”.
Veja o anuncio em vídeo:
O presidente tem ordenado retaliações e demais medidas diplomáticas contra vizinhos como Brasil e Colômbia desde que ambos, além de Argentina e outras nações sul-americanas, alinharam-se aos Estados Unidos na disposição de contestar a legitimidade de Maduro como presidente. Os países contra o regime bolivariano de Maduro pretendem concretizar a expulsão da Venezuela do Mercosul, bloco de países que reúne .
Com a eleição de Jair Bolsonaro e, consequentemente, a redefinição da geopolítica regional, a relação bilateral Brasil-Venezuela tem deteriorado, com desdobramentos diplomáticos relevantes – no lance mais recente, em 11 de fevereiro, o governo Bolsonaro reconheceu com representante diplomática da Venezuela no Brasil a advogada e professora Maria Teresa Belandria. A venezuelana foi indicada para a função pelo autoproclamado presidente da Venezuela, Juan Guaidó, o líder da oposição a Maduro, presidente de fato.
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A embaixada da Venezuela em Brasilia estava sem comando desde dezembro de 2017, quando Maduro determinou a expulsão do então embaixador brasileiro naquele país, Ruy Pereira, declarado “persona non grata” pela Assembleia Nacional Constituinte venezuelana. Maria Teresa estava acompanhada pelo coordenador de ajuda humanitária designado por Guaidó, Lester Toledo, na solenidade que marcou o reconhecimento oficial no Palácio do Itamaraty, na capital federal.
O Ministro @ernestofaraujo reuniu-se hoje no @ItamaratyGovBr c/ María Teresa Belandria, representante para o Brasil designada pelo presidente encarregado da Venezuela, @jguaido, para discutir a ajuda humanitária para a população venezuelana. pic.twitter.com/zaGGyYHGu0
— Itamaraty Brasil🇧🇷 (@ItamaratyGovBr) 11 de fevereiro de 2019
Em grave crise política que se desenrola há meses, a Venezuela enfrenta embargos norte-americanos e vê sua economia enfraquecer sem solução à vista. Confrontos entre oposicionistas e apoiadores de Maduro, que conta com o apoio das forças armadas venezuelanas, passaram a ser constantes, de modo que a situação se desdobrou em êxodo. Nos últimos meses, centenas de milhares de cidadãos venezuelanos migraram para países vizinhos – no Brasil, Roraima é a principal porta de entrada.
Dizendo-se alvo de ofensiva internacional para desestabilizar seu governo, Maduro já disse que responsabilizará o presidente da Colômbia, Iván Duque, por eventual problema na região de fronteira com a Venezuela. “A Venezuela está passando por uma grande provocação, por isso estamos atualizando o conceito para reagir. O governo que presido está na vanguarda da proteção das pessoas”, discursou.
Dispondo do apoio majoritário dos militares, Maduro fez o anúncio sobre as fronteiras ao visitar o maior quartel do exército venezuelano, localizado em Fuerte Tiuna. Na ocasião, ele protagonizou videoconferência retransmitida por emissoras de TV e, simultaneamente, veiculada em sua conta no Twitter. “Vamos ao combate pela pátria. Nosso destino é a vitória sempre. Chávez vive”, disse.
Ofensiva militar
Para piorar ainda mais a relação com o país vizinho, o Brasil tomou uma decisão inédita relacionada à ofensiva militar norte-americana – por mais de uma vez o presidente dos EUA, Donald Trump, sugeriu uma intervenção militar na Venezuela, ao que Maduro responde com ameaça de reação à altura. Pela primeira vez na história, o governo Bolsonaro vai mandar um militar brasileiro para integrar o Comando Sul das forças armadas norte-americanas.
A novidade, uma vez que há militares brasileiros em missões mundo afora, é que o general destacado será o subcomandante do exército de uma outra nação, algo inédito. E, nesse caso, de um país que prepara uma ação militar em regiões de fronteira do Brasil. E sem a prévia comunicação ao Congresso brasileiro.
“Essa adesão brasileira só foi conhecida porque um almirante americano que foi prestar contas do Comando Sul ao Senado dos Estados Unidos disse, muito satisfeito, ter conseguido que o Brasil aceitasse o convite. É isso mesmo. Foi o Congresso americano, e não o brasileiro, que foi informado pela primeira vez que haverá um general brasileiro na cadeia de comando do exército americano. É uma decisão estratégica que os parlamentares brasileiros deveriam ter aprovado, mas não foram nem mesmo consultados”, explica a jornalista Maria Cristina Fernandes, do jornal Valor Econômico, responsável pela publicação da notícia em primeira mão.
Veja o comentário no vídeo:
Além do governo brasileiro e dos demais supracitados, Guaidó conta com o apoio de países como Argentina, Canadá, Alemanha e a maioria dos países europeus (são mais de 40 países apoiando o líder oposicionista). Mas, por outro lado, ele não é reconhecido por duas das mais poderosas nações, China e Rússia, que se alinham estratégica e ideologicamente a Maduro. Países como México, Cuba e Irã também apoiam o sucessor do líder bolivariano Hugo Chávez (1954-2013), em um grupo que reúne cerca de 15 países.
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