A Piauí de agosto vale pelo artigo do economista Marcos Lisboa (“Outra história: resposta a Fernando Haddad”).
O texto foi provocado por artigo do ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad no número anterior da revista. Nele, ao mesmo tempo em que procura se distanciar dos equívocos da ex-presidente Dilma Rousseff, Haddad canoniza o governo Lula, como marco da ruptura de uma herança elitista.
Lisboa recorda o óbvio: o despertar das políticas públicas para o combate à miséria e à desigualdade remonta, no mínimo, à Constituição de 1988. O governo Fernando Henrique Cardoso lançou vários programas sociais – Bolsa Escola, Vale-Gás e Bolsa Alimentação – que seriam unificados no primeiro mandato de Lula. Os famosos aumentos reais (acima da inflação) sistemáticos do salário mínimo também começaram no governo FHC. Durante os dois mandatos do ex-presidente tucano, o ganho real acumulado foi de 46%. Nos dois mandatos de Lula, numa conjuntura externa mais favorável e após as políticas de estabilização aplicadas com sucesso por FHC, a elevação real acumulada pelo salário mínimo somou 59%.
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Marcos Lisboa foi secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda de Palocci, tendo saído de lá em 2005. A débâcle econômica do governo petista começou não com Dilma, mas já no segundo mandato do ex-presidente Lula.
A estabilidade macroeconômica conquistada graças à política ortodoxa do primeiro mandato petista, os ganhos de produtividade decorrentes da adoção de uma agenda de reformas microeconômicas, a bonança do mercado internacional de produtos primários puxado pela decolagem da China e da Índia, o advento da Grande Recessão Mundial em 2008/9, a embriaguez com a descoberta do pré-sal e, por último, mas não em último, a queda de Palocci, decerto o figurão petista mais identificado com o liberalismo econômico, tudo isso reacendeu as inclinações mais retrógradas, estatizantes e nacionalistas dos economistas puro-sangue do lulopetismo. PublicidadeDaí em diante, a inundação do caixa dos grandes grupos empresariais amigos do rei com créditos baratos do BNDES e outros bancos oficiais, a ineficiência industrial protegida pela política de conteúdo local, renúncias de receita em benefício de numerosos segmentos (todos atrás de uma vantagem governamental para chamar de sua) reduziram progressivamente a arrecadação e turbinaram a escalada do endividamento público.
Foi uma pororoca de erros que iria afinal explodir nas mãos sujas e incompetentes de Dilma. Só para ter uma ideia de grandeza: nos governos Lula e Dilma, o BNDES emprestou o equivalente a US$ 100 bilhões. No pós-Segunda Guerra Mundial, via Plano Marshall, os Estados Unidos injetaram na reconstrução europeia US$ 150 bi, ao câmbio atual. Só que ali esses investimentos impulsionaram ganhos de produtividade e competitividade que a progressiva unificação econômica da Europa viria a consolidar e expandir; aqui, os capitalistas companheiros preferiram embolsar e jogar a dinheirama na especulação financeira.
Durante a última década e meia, a produtividade da maioria dos ramos industriais praticamente ficou parada. E, claro, relações tão aconchegantes entre a cúpula do governo, o tubaronato empresarial e os seus “despachantes” políticos e burocráticos só poderiam mesmo resultar na apoteose de corrupção que o Brasil agora está descobrindo.
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