A denúncia, que é anônima, relata que “frequentemente um carro oficial da Câmara dos Deputados, Voyage preto placa PAN 3805 com motorista e a servidora Madalena, entre 9h e 10h, param (sic) na 708 norte (quadra residencial), em frente ao bloco P, onde a servidora mora e traz material de construção para a obra que está acontecendo na casa da servidora”.
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“Ou seja, abuso da máquina do governo (sic) servidor usar carro oficial em empregados do governo para benefício próprio: trazer material de construção para sua casa”, completa o relato, registrado em ofício ao qual o site teve acesso (foto).
A diretora afirmou ao Congresso em Foco que isso ocorreu apenas uma vez e que não cometeu qualquer irregularidade. Ela contou que, na ocasião, conduzia em seu automóvel particular material a ser usado em obra de sua casa quando um pneu furou. A servidora disse que foi socorrida por sua filha, mas que precisou chamar o motorista a que tem direito na Câmara para auxiliá-las com o transporte dos produtos. Madalena afirmou, ainda, que tinha reunião de trabalho marcada para o mesmo horário. E, por isso, recorreu ao veículo oficial.
O carro usado por Maria Madalena, de acordo com a denúncia, é destinado ao serviço de passaportes da Câmara. Segundo levantamentos iniciais à disposição da Comissão de Disciplina, ela o utilizou no trajeto entre o Setor de Indústrias e Abastecimento (SIA) – região da capital federal onde há a maior concentração de lojas de material de construção de Brasília e que fica distante, aproximadamente, 10 quilômetros do Congresso Nacional.
A legislação prevê desde advertência até suspensão em caso de uso de carro oficial para fins pessoais. O procedimento ainda está em fase inicial na comissão disciplinar.
Banco de horas
Embora não esteja no foco da denúncia à Ouvidoria, outra questão funcional envolve Maria Madalena e regras que ela mesma deve proteger em razão do cargo que ocupa. A servidora possuía, até o fechamento desta reportagem, cerca de 348 horas extras acumuladas no chamado “banco de horas” da Câmara.
Por competência legal, cabe a ela cuidar para que os servidores não acumulem mais de 48 horas de saldo por trabalho extra, como estabelece a legislação interna da Câmara. Se decidisse trocar as horas que tem de saldo no sistema de banco de horas por expediente, Maria Madalena deixaria de trabalhar por 43 dias – além das férias e recessos oficiais. A servidora diz que o acúmulo é resultado de longas jornadas de trabalho, justamente devido à função que exerce (leia mais abaixo).
Em nota enviada ao Congresso em Foco, Madalena afirma que o banco de horas acumulado desde maio de 2015, quando foi instalado o sistema eletrônico de registro de ponto, “diz respeito, especialmente, aos casos em que foi necessária a permanência na Casa, recomendada a todos os diretores, durante as sessões plenárias que, como de costume, avançaram até o fim da noite e, muitas vezes, até a madrugada”.
Ela afirma que o cargo de diretora exige a alta carga de trabalho. “A normatização do controle eletrônico de frequência dos servidores da Câmara dos Deputados prevê, em casos excepcionais, o acúmulo de horas extras trabalhadas superior ao limite de 48 horas, mediante autorização, desde que haja necessidade comprovada de trabalho”, explicou. Vale ressaltar que é a própria diretoria de recursos humanos quem autoriza as horas extras aos servidores.
Nomeação
A servidora foi nomeada por Eduardo Cunha para a Direção de Recursos Humanos na cota destinada aos evangélicos, conforme o Congresso em Foco publicou com exclusividade em março do ano passado. À época ainda poderoso e livre do processo de cassação que ora enfrenta, o peemedebista havia atendido a vários pedidos da bancada evangélica, entre eles a nomeação de Maria Madalena e do deputado Cleber Verde (PRB-MA) para o cargo de secretário de Comunicação Social – até então exclusivo de servidores de carreira.
Evangélica, a advogada e teóloga de formação chefia o setor da Câmara responsável pela maior dotação orçamentária da instituição: só no ano passado, foram mais de R$ 4 bilhões, segundo o descritivo “despesa com pessoal”. Ou seja, mais de 80% do orçamento da Câmara para 2015. Ao ser nomeada para o cargo no início do ano passado, a servidora negou que sua indicação tivesse caráter religioso e classificou o hoje deputado afastado como “instrumento de Deus” para sua ascensão à diretoria.
Servidora efetiva há 32 anos na Câmara, Maria Madalena também leciona Ética no UniCeub, uma universidade privada de Brasília, localizada a poucos quilômetros do Congresso.
Leia a íntegra da nota enviada por Maria Madalena:
“Informo que não há, nem nunca houve, processo administrativo disciplinar instalado contra mim em comissão desta Casa, tampouco qualquer denúncia formalizada envolvendo o meu nome.
Quanto ao banco de horas, esclareço que a normatização do controle eletrônico de frequência dos servidores da Câmara dos Deputados prevê, em casos excepcionais, o acúmulo de horas extrastrabalhadas superior ao limite de 48 horas, mediante autorização, desde que haja necessidade comprovada de trabalho.
Em relação ao banco de horas por mim acumulado desde maio de 2015, quando foi instalado o sistema eletrônico de registro de ponto, esclareço que as horas trabalhadas além da jornada regular de 40 horas semanais dizem respeito, especialmente, aos casos em que foi necessária a permanência na Casa, recomendada a todos os diretores, durante as sessões plenárias que, como de costume, avançaram até o fim da noite e, muitas vezes, até a madrugada. Trata-se, portanto, de atendimento estrito à necessidade do serviço e às responsabilidades do cargo que ocupo.
Quanto ao Programa de Visitação Institucional ao Congresso Nacional, esclareço que integro, desde 2013, a equipe de profissionais responsáveis pelas visitas guiadas, após ser aprovada em processo seletivo interno aberto a todos os servidores, seguido de treinamento e capacitação.”