O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) disse ao Congresso em Foco que não vê mais nenhuma chance de aprovação da medida provisória que reduziu de 29 para 22 o número de ministérios e fez outras alterações significativas na estrutura administrativa federal. A MP 870/2019 foi assinada pelo presidente Jair Bolsonaro em seu primeiro dia de governo e perderá a validade em 3 de junho, uma segunda-feira, se não for aprovada antes tanto na Câmara quanto no Senado.
Na prática, portanto, a medida provisória deve ser votada pelo plenário de ambas as casas até a próxima semana. Durante o lançamento oficial da 12ª edição do Prêmio Congresso em Foco, Randolfe afirmou que “nem por um milagre” haverá tempo para que ela seja aprovada. Em outras palavras, o parlamentar, que tem bom trânsito com praticamente todas as bancadas partidárias, antevê a completa anulação da reforma administrativa de Bolsonaro e a volta do estrutura ministerial do ex-presidente Michel Temer.
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Randolfe resume a situação: “Nesta semana os presidentes da Câmara e do Senado não estão em Brasília e o governo tem dificuldades de coordenação de sua própria base, que está em um dilema de esfinge: se fica ou abandona o velho Centrão. A MP 870 não será votada nesta semana pelo Plenário da Câmara. Como há duas outras medidas provisórias que precisam ser votadas na frente, mesmo que seja aprovada pela Câmara, não dará tempo de ser analisada pelos senadores e cairá”.
Embora o discurso oficial seja outro, e os responsáveis pela articulação política do governo continuem a fazer de tudo para demonstrar confiança na aprovação da MP 870, a burocracia do Executivo já começa a trabalhar com o cenário de perda de validade da medida provisória. Nessa hipótese, o governo estaria impedido de enviar uma medida provisória com igual conteúdo e deveria encaminhar um projeto de lei regulando o assunto. E, até que ele se transformasse em lei, prevaleceria o status administrativo anterior. Ou seja, entre outras mudanças, os ministérios da Cultura e do Trabalho ressuscitariam e o Ministério da Economia seria desmembrado, voltando a ganhar vida os ministérios da Fazenda e do Planejamento.
Nesse novo organograma, obviamente, haveria mais cargos para nomeações políticas, o que sempre soará tentador para a maioria fisiológica do Congresso e inconveniente para um presidente que desde a campanha mantém o discurso de não fazer concessões à “velha política”. Essa maioria, vale lembrar, é personificada hoje no Centrão. Integrado por PP, DEM, PR, PRB e SD, ele costuma levar de roldão, nas principais votações, boa parte das bancadas de outros partidos, como PSD, PTB e MDB.
Confirmado o cenário no qual Randolfe aposta, estaríamos ainda diante de um oceano de dúvidas jurídicas. A maior delas: valem os atos baixados por ministros cujos ministérios não tiveram a criação chancelada pelo Legislativo? O bom senso indica que sim. Mas, como a sensatez não é sempre companheira das decisões nacionais, a única resposta certeira é que o assunto seria definido em última análise pelo Judiciário.
Também é certo que ninguém, na base governista ou na oposição, imaginava que o Palácio do Planalto enfrentaria tantas dificuldades para aprovar a reforma administrativa. O tema foi objeto daquela que foi, provavelmente, a mais importante deliberação do Congresso na atual legislatura: a sucessão de derrotas sofridas pelo governo na comissão especial, composta paritariamente por deputados federais e por senadores, que examinou a MP
“Me senti no 7 a 1”
Quem melhor traduziu o que se passou na comissão especial na última quinta-feira (9) foi o senador governista Major Olímpio (PSL-SP). “Estou me sentindo o goleiro do Brasil no 7×1 contra a Alemanha”, disse ele.
A derrota mais vistosa afetou menos Jair Bolsonaro do que o ministro da Justiça, Sergio Moro. Foi a retirada do Conselho de Controle das Atividades Financeiras (Coaf) do Ministério da Justiça, para integrar a estrutura do Ministério da Economia. Na tentativa de reduzir os danos na comissão especial, o Planalto já tinha desistido de brigar por isso, entregando os anéis para preservar os dedos.
A intenção do governo era votar a MP 870 naquela mesma quinta-feira no Plenário da Câmara, o que não ocorreu porque Moro se movimentou nos bastidores para tentar reverter a decisão da comissão. A ideia ganhou o apoio do Centrão e do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), sendo avalizada pelo próprio ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, que em sucessivas ligações a parlamentares pediu: “Deixa passar”.
Irritado com a pressão pró-Moro, Maia voltou atrás e disse que, antes da MP 870, votaria não apenas as duas MPs citadas por Randolfe (a 863 e a 866), mas todas as cinco medidas provisórias que estão na frente da MP 870: MPs 863, 866, 867, 868 e 869. Não há acordo sobre nenhuma delas. Em reunião de líderes realizada ontem (terça, 14) à tarde na Câmara, decidiu-se que nenhuma delas irá ao plenário nesta semana em que Rodrigo Maia está ausente do país. Ele foi a Nova York participar de encontros com investidores em razão da decisão de Bolsonaro de cancelar a viagem àquela cidade. Maia viaja junto com o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP). “Alguém teria que dar alguma satisfação a esses investidores, interessados em nosso país. Não dá para culpar o Maia e o Davi por isso”, comenta Randolfe.
Moro saiu no prejuízo com outra mudança feita pela comissão: a retirada da sua alçada do poder de registrar entidades sindicais. A comissão também decidiu devolver à Fundação Nacional do Índio (Funai) a competência para demarcar terras indígenas, atribuição que a reforma administrativa havia transferido para o Ministério da Agricultura. E aprovou a volta da Funai – que estava no Ministério da Mulher, da Familia e dos Direitos Humanos – ao Ministério da Justiça.
O goleiro mencionado pelo Major Olímpio tomou outros gols: a recriação do Conselho Nacional de Segurança Alimentar (Consea); a exclusão de artigos que aumentavam o controle governamental sobre ONGs e organismos internacionais; e a inclusão no texto de restrições à atuação dos auditores fiscais da Receita Federal em investigações criminais.
O “jabuti”, revelado pelo Congresso em Foco, foi incorporado à matéria pelo próprio relator, ninguém menos do que o líder do governo no Senado, senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PB).
De quebra, mais um anel ficou no caminho. Por sugestão da sua base de apoio no Congresso, o governo concordou em recriar os ministérios da Integração Nacional e das Cidades.
Resta ao governo torcer por “milagres” e salvar a MP 870. “Está difícil, mas não dá para dizer que é caso perdido. Quando há diálogo, sempre há chance de aprovação”, disse ao Congresso em Foco o deputado Fábio Ramalho (MDB-MG). Para que isso aconteça, afirmou ele, Bolsonaro precisa montar uma bancada própria na Câmara. “Hoje ele não tem”.
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