A senadora Simone Tebet (MDB-MS) é filha do senador Ramez Tebet, que presidiu o Senado entre 2001 e 2003. No início do ano, ela parecia ter uma chance concreta de chegar ao cargo que já foi do seu pai. Mas, numa disputa dentro do MDB com Renan Calheiros (AL), preferiu abrir mão de sua candidatura para apoiar Davi Alcolumbre (DEM-AP), a quem reserva críticas.
Quanto à legenda, a senadora também mantém algumas ressalvas e não descarta um possível desligamento. “[O MDB] fugiu dos seus ideais, rasgou a sua história e acabou sendo fiador deste descalabro que virou a política no Brasil, no que se refere à corrupção e à má gestão”, disse Simone.
Ela foi escolhida pelo júri do Prêmio Congresso em Foco, pelo segundo ano consecutivo, como a melhor senadora. Foi nesse contexto, no dia 19 de setembro, que ela concedeu entrevista exclusiva para a nova edição da Revista Congresso em Foco, já disponível para compra (compre aqui). Mantivemos a versão original, sem ouvir novos posicionamentos da senadora.
À frente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), Simone Tebet (MDB-MS) assiste ao debate acalorado e extremista que tem marcado a era Jair Bolsonaro em seu primeiro ano. Simone não tem dúvidas. Para ela, o país precisa encontrar uma saída que fuja desses extremos e caminhe para o centro. Para uma convergência democrática que possibilite a volta do diálogo.
A senadora concedeu entrevista exclusiva para a nova edição da Revista Congresso em Foco, que já disponível para compra (compre aqui).
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A senhora foi candidata a presidente do Senado, enfrentando o próprio partido, que defendia a candidatura de Renan Calheiros. Ao final, durante o processo, abriu mão para apoiar Davi Alcolumbre. Qual seria a principal diferença entre a sua gestão e a que está sendo feita por Alcolumbre?
Quando eu enfrentei Renan Calheiros, na verdade eu enfrentei um sistema que eu entendia que não era saudável para a democracia brasileira. Não era só o enfrentamento ao partido. Mas a um Senado que estava muito a mercê do toma-lá-dá-cá, do fisiologismo, de um presidencialismo de coalizão que se mostrou nocivo ao país. Quando eu abri mão da minha candidatura para o Davi para impedir um segundo turno, foi por uma convicção de que a minha candidatura não era um fim em si mesmo. Eu não queria necessariamente a presidência do Senado, eu queria mudar o Senado. Na esperança de que ele pudesse fazer diferente.
E ele está fazendo diferente?
Em muitas coisa, ele está fazendo diferente. Ele tem a humildade – e isso é louvável – de ouvir os colegas. Ele divide a responsabilidade da pauta do plenário, do que vai ser votado. Uma coisa que hoje está me incomodando é que ele tem que lembrar que seu papel é de bombeiro, e não de incendiário. Ele precisa antes de tudo de moderação e imparcialidade. Isso é fundamental para que o Senado tenha um papel decisivo nesse momento de crise numa conjuntura extremada como a que estamos passando.
Em que momento a senhora acha que Davi Alcolumbre está mais para incendiário que para bombeiro?
Nós temos que entender que, dos dois terços dos senadores eleitos, houve uma renovação de 85%. Veio muito senador que nunca teve antes mandato eletivo. Que virou senador por uma conjuntura, pela rede social, pelo seu trabalho dentro da sua comunidade, dentro do seu estado. Esses senadores vêm, sim, com ideias de querer transformar o Brasil muito rapidamente. Mas muitas vezes não entendem que um processo político numa democracia se faz a passos lentos. É nesse papel junto a esse grupo que acho que, mais do que nunca, o presidente tem que ter esse papel de bombeiro, de diálogo.
A CPI da Lava Toga, na sua opinião, é inconstitucional?
Não acho que seja inconstitucional. Não acho que seja por aí. Se o presidente do Senado acha que não é o momento de fazer essa CPI, esse é o momento de dialogar. Para a gente não ter uma CPI que a gente sabe como começa, mas não sabe como termina. Eu não tenho medo de CPI. Mas eu entendo que não é o momento hoje. Poderia ser em fevereiro do ano que vem? Pode ser. A realidade pode ser outra e entendo o adiamento por uma razão.
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Qual?
Nós temos na casa duas grandes demandas que precisam ser entregues à sociedade com a maior rapidez possível, sob pena de não termos Brasil para governar. A reforma da Previdência, para resolver um grave problema de déficit fiscal. E a reforma tributária, ainda que seja uma minirreforma que desburocratize e unifique impostos federais para dar um fôlego para o setor produtivo e para que se volte a empregar no Brasil. Assim, conhecendo o trabalho de uma CPI, que paralisa tudo, ainda mais uma CPI contra um poder, este ao meu ver não é o momento.
Aprovadas essas reformas, ela poderia acontecer? Mas não segue o risco de crise entre os poderes?
É bom lembrar que a CPI é um instrumento das minorias, mas ela é gerida pela maioria. Por isso, é que eu não tenho medo dela. Quem indica integrantes são membros dos grandes e dos pequenos partidos.
Ela contamina?
Sim. Não assinei a CPI porque, repito, não acho que seja o momento. Mas se cria. Pode gerar uma instabilidade entre os poderes? Sim. Mas, muitas vezes, precisamos ter coragem também para desconstruir algo para construir algo novo. A minha preocupação não é a instabilidade entre os poderes, a minha preocupação é a instabilidade econômica. Acho que precisamos sair desse radicalismo, esse extremismo de ideias, eu diria até irracional.
No caso, a senhora está se referindo à forma como vem se dando a discussão política no país?
É um país que sempre foi de centro. Um país que não tolera discursos de ódio, de discriminação. Diante desse radicalismo de ideias, não podemos deixar que esse ambiente de fora contamine o Senado Federal.
Como sair dessa polarização que está tomando conta da política brasileira?
Primeiro, eu sou uma ativa militante de que a convergência política é o melhor caminho sempre. Sei que numa democracia a convergência política só se dá por um caminho, que é o caminho do centro. E, hoje, nós não temos mais um centro democrático porque nós não temos mais um grande partido de centro. Não existe democracia forte sem um grande partido de centro.
O MDB já cumpriu esse papel?
Nós só conseguimos passar pela ruptura traumática de um regime de exceção para a redemocratização porque um grande partido de centro foi chamado. Agora, acho que nós estamos chegando no momento desse chamamento de centro. Inclusive um centro que vá dialogar com a esquerda e com a direita. Para colocarmos premissas verdadeiras e absolutas de consenso e dizer: aqui nós vamos caminhar nesses propósitos de colocar a democracia como valor absoluto, garantir o fortalecimento da política, uma imprensa livre e vigilante e investigativa que permita somar. Para que se possa vencer o radicalismo, vencer algo que está contaminando a sociedade e que é muito pernicioso.
Por que tais posicionamentos enfraquecem a sociedade?
Porque tais posicionamentos estão vindo adicionados de mentiras. A propagação da mentira acho que é a forma hoje de você matar a democracia. A mais poderosa arma contra a democracia é a palavra mal usada e mal intencionada, especialmente se ela sair da boca de autoridades máximas. Porque ela é destrutiva. Você tem fake news. Você tem redes sociais comandadas por robôs. Você tem comandos de ódio sendo disseminados não pela sociedade, mas muitas vezes por autoridades. Você tem uma retórica insistente, persistente e inverídica que, de tanto ser dita e não ser combatida com uma sociedade mal informada, transforma mentira em verdade. O errado em certo. Isso é o que mais me assusta, e é contra isso que eu quero lutar fortemente. Eu quero de volta aquele povo brasileiro, não pacífico, mas sem esse ódio. Eu quero as redes sociais tendo um papel decisivo para a democracia. Eu quero o povo nas ruas gritando com faixas, mas eu quero um povo esclarecido que saiba o que está fazendo, que não seja massa de manobra.
Por que o MDB não cumpre mais esse papel? Onde a senhora acha que o MDB começou a se perder?
Muito lá atrás. O MDB foi fundamental para a abertura da democracia. Lutou pela lei de anistia ampla e irrestrita. Por uma Assembleia Nacional Constituinte, por uma Constituição cidadã. Mas, com o tempo, o MDB passou a ser um partido de parlamentares e não um partido de presidenciáveis. Passou a estar sempre no governo independentemente de que governo fosse. Estar sempre na janela. Tendo como base um presidencialismo de coalizão muito distorcido. Se perdeu. Fugiu dos seus ideais, rasgou a sua história e acabou sendo fiador deste descalabro que virou a política no Brasil, no que se refere à corrupção e à má gestão.
Há retorno possível?
O MDB precisa se rediscutir e fazer mudanças. Se não, eu não tenho dúvidas de que vai acabar se transformando num partido pequeno. Vai se apequenar nessas eleições municipais e vai deixar de ser o maior partido do Brasil.
Vendo essa possibilidade de o partido definhar, a senhor trocaria de legenda?
As pessoas me perguntam muito em relação a isso. Eu não quero sair do MDB. Mas, infelizmente, o MDB tem saído de mim. Eu não posso ver os ideais do partido serem destruídos, o partido comandado por um grupo que se serve da legenda, que se serve das benesses, que é democrático apenas no nome.
Estamos encerrando a entrevista com a futura presidente do Senado?
Eu abri mão da presidência do Senado, quando eu tinha chance de ser candidata. A presidência para mim não é um fim em si mesmo. Eu não preciso da presidência para ser ouvida. Creio que meu papel hoje na presidência da Comissão de Constituição e Justiça é mais importante do que seria na presidência do Senado, pelo meu perfil técnico. O futuro pertence a Deus. Obviamente, todo mundo que está no poder e fala que não quer poder, está mentindo. Mas não é uma coisa da minha essência querer galgar a qualquer custo. Eu quero espaços para dar o meu melhor. Se o meu melhor for na planície, estou satisfeita. E terá o meu apoio o futuro ou a futura candidata a presidente do Senado que se identificar com as pautas e com aquilo que eu acredito.
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