A ideia em um segundo Há uma percepção de que as condições da economia afetam negativamente o mandatário atual, em processos eleitorais, seja diretamente, seja indiretamente, pela via da sua popularidade. As variáveis econômicas para 2022 apontam cenário negativo para Bolsonaro. O mercado interpreta Lula e Bolsonaro praticamente como iguais, em termos de resultados econômicos. |
O fato já entrou para os memes perpétuos de processos eleitorais: nas eleições em que Bill Clinton disputava com George H. W. Bush (incumbente), em 1992, o estrategista do primeiro, James Carville, afirmou: “It’s the economy, stupid!”. Os Estados Unidos atravessavam então uma recessão. Bush, que chegou a ter 90% de aprovação após a invasão do Iraque, viu seu apoio reduzir-se drasticamente e perdeu aquela eleição.
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Perguntados, na rodada do Painel do Poder de março de 2022, sobre qual será o principal tema nas eleições presidenciais deste ano, os parlamentares não tiveram dúvidas em responder: será a economia. O quadro a seguir apresenta os resultados:
Item | n | % |
Defesa da família e dos valores cristãos | 6 | 7,23 |
Corrupção | 1 | 1,2 |
Economia | 62 | 74,7 |
Saúde e pandemia | 11 | 13,25 |
Outro | 2 | 2,42 |
Educação | 1 | 1,2 |
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O que esperar da economia no presente ano?
O conjunto de expectativas dos agentes econômicos, capturado pelo Boletim Focus, do Banco Central, aponta para uma tímida melhora nas expectativas de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB): de +0,3% para +0,5%. Crescimento nessa proporção, ainda mais diante do impacto negativo da pandemia nos anos recentes, é absolutamente insuficiente para alterar a condição geral do país.
Em termos da renda média real do trabalhador, por exemplo, verificou-se, ao final de 2021, o menor valor da série histórica do IBGE (iniciada em 2012): R$ 2.449,00 mensais. Esse indicador é uma proxy para o que passam as famílias brasileiras, que sobrevivem de salários. Estão ganhando menos em uma conjuntura em que as coisas estão custando mais. Equação que todos precisam resolver todos os dias, cuja solução arrisca ser um conjunto vazio.
Entra-se aqui em outra variável econômica cujo comportamento tem se deteriorado nos últimos tempos, a inflação. Ainda considerando o Boletim Focus, as projeções para o IPCA em 2022 passaram de 5,76% para 6,45%. Essa piora nas expectativas inflacionárias reflete a inércia do processo (a inflação não cede mesmo ante os movimentos de aumento da taxa de juros), bem como a incorporação dos efeitos da guerra da Ucrânia (com o aumento dos preços de commodities, por exemplo). O próprio presidente do Banco Central, em declarações recentes, afirmou vislumbrar muita incerteza ainda nos cenários. Em termos populares, inflação é imposto que se cobra de todos, mas os pobres não recebem nada de volta, enquanto os mais ricos acabam protegidos pelo aumento da taxa de juros e seu impacto positivo nas aplicações financeiras. Em outras palavras: em cenários inflacionários, os pobres são os perdedores.
De um ponto de vista do emprego, o pífio crescimento do PIB não será suficiente para reverter, de modo substancial, o alto índice atual de desemprego e emprego precarizado. Portanto, de um ponto de vista da economia, o cenário eleitoral deve se desenrolar em uma conjuntura muito negativa, com desvantagem para o incumbente, segundo a lógica dos modelos de voto econômico.
Existe voto econômico?
O conceito de voto econômico é intuitivo, o que facilita sua aceitação quase irrefletida. O proverbial Se há governo sou contra torna-se ainda mais forte quando se trata de encontrar culpados por uma situação ruim. Não há, entretanto, consenso na literatura acadêmica sobre o tema. Alguns autores descobriram que a avaliação da economia tende a ser muito instável ao longo do tempo, exercendo impacto na escolha eleitoral apenas entre eleitores mais politicamente sofisticados. Já Pipa Norris, da Universidade Harvard, encontrou indícios de que o perfil social é mais complexo do que os estereótipos populares sugerem, e que muitas vezes outros fatores, como a sensação de segurança no emprego, por exemplo, pesam mais na escolha do eleitor do que os indicadores macroeconômicos. Outro estudo apontou que um critério mais decisivo é o da popularidade do presidente (o qual acaba abrangendo o desempenho da gestão presidencial em termos econômicos). Lembrando o próprio caso Bush vs. Clinton, a popularidade de Bush teve uma queda drástica.
Não se trata, todavia, de considerar o assunto irrelevante. Para citarmos mais uma pesquisa, que analisou as variáveis taxa de crescimento do PIB, taxa de desemprego, taxa de inflação, despesa governamental e déficit público, houve mostra de que há fortes evidências de manipulação oportunista pré-eleitoral, com recurso a aumento do gasto público e do déficit governamental. Ou seja, os incumbentes tendem a usar a máquina a seu favor de fato, com expansão do gasto e consequente aumento da dívida. Não é à toa, portanto, que estamos assistindo a uma série de medidas de desoneração fiscal, transferência direta de renda, liberação de recursos do FGTS, propostas de aumento salarial para servidores públicos. É o botão do gasto sendo pressionado enquanto é tempo.
Esse fato é muito preocupante, sobretudo quando se considera que os incumbentes têm uma massacrante vantagem em processos eleitorais. O cientista político Adam Przeworski compilou impressionantes 2.949 eleições, no período de 1788 a 2008, verificando que os candidatos que concorriam à reeleição venceram 2.315 deles, ou seja, 79%, ou, ainda, 4:1 em chances de vitória.
E o mercado?
Essa entidade abstrata, chamada de mercado, a resultante de miríades de atores individuais tomando decisões econômico-alocativas todo o tempo, acaba sendo adotado como termômetro do sentimento econômico de quem importa para o mercado: quem tem recursos e toma decisões sobre esses. Por isso, o índice da Bolsa de Valores, embora em seus fundamentos técnicos não tenha nada a ver com processos políticos, acaba se tornando referencial para o êxito ou não de decisões governamentais.
Pesquisa realizada pela XP com investidores institucionais apresentou resultado interessante, expresso no Gráfico a seguir (que foi compartilhado em rede social):
A pergunta foi: valor do Ibovespa ou do dólar no caso da eleição dos respectivos candidatos. Curiosamente, os atuais líderes nas pesquisas apresentam resultados muito semelhantes – caso Lula sagre-se vencedor, estima-se o dólar valendo R$ 5,61 e o Ibovespa a 118.091; no caso de Bolsonaro, dólar a R$ 5,59 e Ibovespa a 118.534. Ambos muito próximos do cenário adotado como base – Ibovespa a 120 mil pontos e dólar a R$ 5,50.
A expectativa mais negativa do “mercado” concentra-se em Ciro Gomes – vislumbra-se um dólar a R$ 6,09 e o Ibovespa a 103.670. Ciro destaca-se, talvez, como o candidato que mais entende de economia, o que pode soar paradoxal. Contudo, pode-se compreender bem essa percepção, uma vez que o candidato dá declarações incisivas e apresenta-se um tanto quanto temperamental, o que pode fazer com que o mercado sinta uma maior incerteza no caso de sua eleição. Além disso, Ciro defende uma proposta mais nacionalista de desenvolvimento, à qual os mercados são a priori avessos.
A expectativa mais positiva reúne-se em torno de Dória: Ibovespa a 136.568 e dólar a R$ 4,94. Trata-se do PSDB, que carrega consigo, até hoje, a imagem do Plano Real e da estabilização das contas públicas. Trata-se também de Henrique Meirelles, homem do mercado e já testado e retestado nas esferas governamentais. Sérgio Moro também apresenta uma expectativa mais positiva do que Lula e Bolsonaro, no seu caso refletindo, talvez, uma percepção de que seria um “Bolsonaro mais comportado” e efetivamente mais liberal de fato.
As apostas estão feitas. Resta saber como será a combinação de sabores que sairá desse caldeirão político-econômico nas eleições.
Termômetro
CHAPA QUENTE | GELADEIRA |
A pesquisa Genial/Quaest divulgada na quinta-feira (7), a mais recente da nova rodada de levantamentos até o fechamento desta edição do Farol, apresenta números paradoxais. Por um lado, ela confirma a melhora de desempenho do presidente Jair Bolsonaro que outras pesquisas já mostravam. No cenário em que o ex-juiz Sergio Moro foi retirado da disputa, Bolsonaro pulou de 29% para 31%, com relação ao cenário em que Moro aparece. Um salto de dois pontos, no limite da margem de erro da pesquisa. Há outros indicadores de melhora de Bolsonaro na mesma pesquisa, com relação à avaliação do seu governo. Um significativo é o seu crescimento entre os que recebem o Auxilio Brasil: a avaliação positiva do governo nesse segmento aumentou de 19% para 24%. | Mas, paradoxalmente, esse mesmo cenário sem Moro acende um sinal amarelo na campanha do presidente. Embora Bolsonaro seja o mais beneficiado, os 6% que Moro tem no cenário em que ele aparece espalham-se também pelos demais candidatos. Lula, por exemplo, cresce um ponto percentual. E o resultado é que, apesar da melhora de Bolsonaro nesse cenário sem Moro, nessa simulação ele acaba correndo o risco de perder a eleição no primeiro turno. Nesse cenário, Lula tem 45% das intenções de voto. E os demais candidatos, incluindo Bolsonaro, somam apenas 43%. Como as regras eleitorais contam apenas os votos válidos (dispensam os votos nulos e em branco), vence no primeiro turno um candidato que obtiver mais votos que a soma dos adversários. |