Recentemente foi divulgado o ranking do World Hapiness Report (Relatório de Felicidade Mundial) em 2020. No período de 2017 a 2019, o Brasil ocupava a posição 29 de 95 nações. Despencamos para a 41. O relatório sinaliza que os brasileiros nunca foram tão infelizes como no ano passado, desde que o estudo teve início, em 2005.
A análise tem como base a rede de desenvolvimento sustentável (vinculada à ONU) e o centro para o desenvolvimento sustentável da Universidade de Columbia, coordenado pelo prestigiado economista Jeffrey Sachs. Os dados são da Gallup Poll, e com certeza a pandemia impactou decisivamente na queda.
Ouso afirmar que se fosse realizada uma nova edição extraordinária do ranking, colhendo-se percepções e entrevistas nos próximos dias a queda seria ainda maior. Nesta hipótese, a leitura social sobre o julgamento desta terça-feira (23) do Supremo Tribunal Federal contribuiria para este impulsionamento extra.
Depois de vários anos parado, um habeas corpus referente a um dos processos movidos contra o ex-presidente Lula, em que seu advogado aponta a suspeição do juiz Sergio Moro, repentinamente foi pautado e, por 3×2, incluída a reviravolta no voto de um dos julgadores, que inicialmente afastava a suspeição – a Ministra Carmen Lúcia (nomeada por Lula, há quinze anos), mudou seu voto e deu números finais ao julgamento.
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Depois do voto decisivo, o ministro Edson Fachin tentou argumentar que Moro havia sido condenado (como parcial) sem defesa por uma turma do tribunal, sendo caso de submeter a matéria ao plenário, para que fosse revestida de mais segurança jurídica, até porque ele já havia decidido pela incompetência do juízo de Curitiba.
Mas, de nada adiantou. E, ao final a turma decidiu que Moro tinha quebrado seus deveres de imparcialidade na condução do processo. E é sabido que as mensagens trocadas entre Moro e procuradores do MPF, obtidas criminosamente, não periciadas em relação a seu teor, e que poderiam ter sido editadas, cujo conteúdo não foi confirmado pelos interlocutores, foi fator obviamente decisivo neste desfecho.
PublicidadeO caso diz respeito a uma as acusações contra Lula – caso do tríplex do Guarujá. Há outras três acusações e assim, o STF precisará deliberar sobre o alcance da decisão – se atinge ou não os demais casos.
A operação Lava Jato gerou 278 sentenças, gerando a recuperação de R$ 4,3 bilhões, no inédito patamar de recuperação de 1/3, absolutamente singular no plano mundial, sendo que grande parte destes valores foram alcançados em colaborações premiadas – acordos penais voluntários.
Além das consequências relacionadas a Lula, o grande ponto de interrogação que se coloca agora diz respeito a centenas de outros réus e condenados, que, com certeza absoluta, já estão planejando suas estratégias para obter benefícios a partir do precedente, apesar da menção expressa da ministra Carmen Lúcia de que reconhecia a suspeição de Moro de forma personalíssima em relação a Lula, não extensível aos demais acusados.
Eventual suspeição de Moro em outros casos não é efeito automático em decorrência desta decisão, devendo ser demonstrada de forma categórica, meticulosa e individualizada. Além disso, é necessário, via de regra, que o processo em que ela é arguida ainda esteja em andamento. Caso contrário, se já tiver sido julgado em definitivo se torna extremamente difícil desconstituir a condenação através de revisão criminal.
Não se pode desconsiderar o que acontece paralelamente no Brasil, no plano político. A Câmara prepara uma versão suavizante da Lei de Improbidade, que facilitará a vida dos violadores da lei. Detalhe: este hoje é o principal instrumento para combater a corrupção na esfera pública. Duas semanas atrás, se tentou aprovar sem debate uma PEC de blindagem aos parlamentares para não permitir que o Judiciário os afaste dos mandatos em hipótese nenhuma de crime em flagrante, em afronta à Constituição.
O nepotismo é defendido pelo líder do governo como política de Estado e se estuda em Comissão de Juristas também amenizar a Lei de Lavagem de Dinheiro. Na semana passada a OCDE tornou pública a decisão de criar inédito grupo de monitoramento da política anticorrupção brasileira, diante dos retrocessos graves (Lei de Abuso de Autoridade e desativação da Lava Jato).
Neste cenário, a decisão tomada nesta terça pelo STF gera gravíssima consequência moral e social. Moro e a Lava Jato foram condenados perante a nação num dos seus mais importantes casos e isto repercute no sentido de gerar perda de credibilidade em todo o sistema de justiça, já que a sociedade via na Lava Jato uma esperança efetiva de punir a corrupção de grosso calibre. Sente-se humilhada, triste e derrotada. Parece que um caminhão lhe moeu os ossos e que o sistema não consegue ir além de um certo limite.
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