Tudo bem: Trumpfoi “demitido”. Vai continuar esperneando como menino emburrado. Mas a vaca dele já foi pro brejo, embora ninguém possa afirmar que o “trumpismo” esteja morto, haja vista o caminhão lotado com 70 milhões de votos de papel que os americados deram a ele. Criticado até pelos colegas de partido, Trump virou uma dessas figuras com lugar cativo no museu das ridicularias da política mundial.
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Sim, tudo bem. Mas a derrota do magnata misógino, homofóbico, racista e negacionista, entre outros rótulos que o aproximam da figura sinistra e truculenta que ocupa o Palácio do Planalto, deveria acender um sinal vermelho por aqui. E fazer disparar milhares de sirenes simultaneamente até que as oposições brasileiras, das moderadas às radicais, acordem para a necessidade de se começar a construir um Joe Biden tupiniquim. Um candidato com musculatura suficiente para disputar e vencer o Trumpinho brasileiro que atende pelo nome de Jair Bolsonaro. Se o Trump real conseguiu arrancar 70 milhões de votos de apoio por lá, não há de se duvidar da capacidade de o Trump brazuca disputar com chances de vitória a reeleição. Só pra lembrar: Bolsonaro conseguiu quase 58 milhões de votos contra 45 milhões do petista Fernando Haddad. Convenhamos, não é pouco. Pesquisas recentes indicam que teria condições de vencer num segundo turno.
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Se Biden conseguiu lá, por que não sonhar aqui?
A definição e a escolha desse Biden tupiniquim não será tarefa fácil. Até porque as diferenças entre Trump e Bolsonaro, entre os Estados Unidos e o Brasil, entre a cabeça do eleitor brasileiro e do eleitor norte-americano, são enormes. O pleito que ejetou Donald Trump da Casa Branca tem apenas um ensinamento fundamental a nos passar: pode ser difícil, mas não é impossível. E a vitória de Biden é a confirmação disso.
Já se falou à exaustão que Bolsonaro não foi eleito com votos dele, mas de eleitores que terminaram despejando seu descontentamento com o PT do mensalão e do petrolão. Como não havia sequer uma opção de centro-esquerda confiável, a vaca foi pro brejo e se afunda na lama a cada dia que passa.
PublicidadeClaro que, desde a eleição de Bolsonaro aos dias de hoje, muita coisa mudou no cenário político brasileiro. Muitos dos que votaram nele se arrependeram e buscam de uma alternativa. Existe a possibilidade real de Lula ser candidato em 2022, a depender de uma decisão do STF que reveja as condenações aplicadas por Sérgio Moro ao petista sem clareza de objeto e com claros objetivos políticos. Não à toa, e de uma forma vergonhosa, Moro aceitou ser ministro da Justiça do maior beneficiário das punições aplicadas ao líder metalúrgico.
Mas a pavimentação de uma candidatura de Lula, se no passado enfrentou resistências que forçaram o eleitor não-ideológico a se ver forçado a votar em Bolsonaro, como indica uma profusão de pesquisas neste sentido, a situação de hoje não se alterou substancialmente. Aquele eleitor continua com um pé atrás porque a arrogância dos principais líderes petistas continua exatamente a mesma. E o interesse do país continua subjugado ao interesse político pessoal de algumas lideranças oposicionistas.
Encontro Lula e Ciro: seria o começo?
O encontro entre Lula e Ciro Gomes uns três meses atrás foi a primeira sinalização concreta da possibilidade da formação de uma frente oposicionista – não de um “nome” da oposição – para um enfrentamento a Bolsonaro em 2022. Lula recebeu Ciro Gomes no Instituto Lula, mesmo tendo sido xingado no passado pelo pedetista com epítetos delicados como “líder de falcatruas” e “defunto eleitoral”. Tudo bem que em política é muito mais fácil acreditar no futuro do que no passado. “Política é como a nuvem”, dizia o mineiro velho Magalhães Pinto. Muda a toda hora. Mas, como frisado anteriormente, as ambições pessoais continuam acima de um projeto nacional. Haja vista que, para estas eleições municipais, chegou a ser esboçada uma aliança de partidos de esquerda nas capitais mais importantes. Partidos como PT, PSB e PDT se uniriam para derrotar a tropa bolsonarista. Pergunta se rendeu alguma coisa? Coisa alguma. Segundo Carlos Siqueira, presidente do PSB, o segundo maior partido de oposição do Brasil, o veto à composição de partidos esquerdistas que poderia ser a primeira sinalização de uma frente oposicionista para enfrentar a extrema-direita em 2022 teria sido vetada… por Lula.
Um vôo rasante sobre as opções
Não se lhe nega o direito de pleitear a presidência da república. Mas, neste momento, com a forte rejeição que o PT ainda sofre e o próprio Lula ainda amarga, será que o metalúrgico reuniria aquela musculatura a que nos referimos lá em cima? Sim, são perguntas incômodas, mas que precisam ser feitas na hora de se escolher um candidato com pinta de Biden Tupiniquim. Se não for Lula, talvez nem seja Ciro, por causa daqueles rompantes de pitbull do agreste. Moro, que agora acena para um acordo com Luciano Hulk, é odiado pelo PT de Lula, não tem bom trânsito na centro-esquerda e nem de longe tem jeito de Biden Tupiniquim. Como o próprio Hulk, o do Caldeirão, que mais se parece com o Trump do show “O Aprendiz”. Boulos, do PSOL, é cristão-novo. E faz parte de um partido minúsculo embora coerente e consequente, mas que não conseguiu até hoje sair da condição de satélite do PT. O governador do Maranhão, Flávio Dino, do PC do B, seria outro nome bom para ir à mesa de negociações. Mas apesar do protagonismo e das posições corajosas que vem assumindo, enfrenta o estigma histórico de carregar o nome “comunista”, ainda considerado maldito por muita gente, na sigla de seu PC do B.
Alguém mais no radar? Parece que não. Só por esse vôo rasante sobre o panorama de opções já deu pra perceber que a composição para enfrentar e vencer Bolsonaro não é tarefa fácil. Mas precisa começar. E logo. Ontem, se possível.
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