Eu realmente temo que poucas pessoas tenham percepção da profundidade de dois dos problemas que rondam o país e que passam despercebidos em nossos noticiários graças à delinquência de Jair Bolsonaro. O gigantismo institucional e a corrosão do poder de compra dos brasileiros.
O descontrole institucional que vive esse país e a concentração de poderes, que sem instrumentos adequados de controle virou uma corda no pescoço dos objetivos balizados em 88.
Embora ocorrido em 2018, um caso a que tive acesso esta semana, dá o tom do descalabro em que vivemos.
Uma Operação policial no sertão da Paraíba. E os dois sujeitos sorridentes no meio da foto acima? Quem são? O juiz e o promotor da comarca de Conceição que expediu os mandados de prisão e busca e apreensão!
Uma relação no mínimo indevida e que afronta o Estado Democrático de Direito. Se não há separação entre quem acusa, quem prende e quem julga, o que resta? Imagine você, que por algum sortilégio é acusado (mesmo que falsamente) de um delito, durante o julgamento descobre que o policial que te prendeu é amigo do promotor que, por sua vez, é amigo do juiz que está lhe julgando. Quais as chances de isso acabar com a sua absolvição?
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Exagero? Recentemente, um agente da Polícia Militar paulista matou um cidadão inocente a tiros homem e justificou: “No boletim, será dado um jeito”.
PublicidadeE por qual motivo o policial afirmou isso com segurança? Pois o Ministério Público que deveria exercer o controle externo da atividade policial simplesmente renunciou ao seu dever constitucional.
Aqui temos duas instituições sem controle, os PMs e aqueles que deveriam controlá-los, o MP.
Infelizmente, boa parte dos procuradores se enxerga mais como uma espécie de policial do que como membro de uma instituição que deveria realizar o controle externo da atividade policial. E isso só ocorre pois não há quem controle o MP.
Em novembro do ano passado eu escrevi o artigo “As chacinas e o abandono do controle da atividade policial pelo MP” e que ilustra bem o descalabro da segurança pública no Brasil.
Um exemplo desse descontrole policial está nos policiais-políticos Daniel Silveira e Gabriel Monteiro. Só chegaram até onde chegaram justamente por conta desse descontrole. A passagem de ambos pelas forças de segurança é coalhada de infrações e problemas.
E isso vai mais além!
Essa semana o jornal O Globo revelou uma verdadeira escaramuça de membros do Ministério Público que buscam disputar as eleições deste ano.
Promotores tentam brecha para disputar eleições sem perder cargos e salários. Uma resolução do CNMP libera quem entrou no MP entre 1988 e 2004 para que se tornem políticos sem perderem as benesses de deus cargos na instituição.
Mas se isso não fosse o suficiente, os MPs estaduais também estão fazendo a festa para quem entrou depois de 2004 e buscando maneiras de liberarem os seus membros.
O que não faltam são instituições atravessando a rua.
Afinal de contas, nossa última “crise” institucional foi deflagrada graças à fala de Roberto Barroso, ministro do Supremo Tribunal federal, que, embora não tenha dito nenhuma mentira, é mais famoso pela busca incessante por atenção e holofotes do que pela atuação jurídica.
É claro que do outro lado tínhamos militares que vestiram a carapuça e, para provarem que não são mandados pelo presidente, fizeram o que o presidente mandou e foram bater boca com uma nota ainda mais desnecessária que a fala de Barroso.
Mais duas instituições sem qualquer controle atravessando a rua para ocuparem o noticiário.
Basta ver os militares e a mamata fardada que os cargos no governo federal se tornaram, ou então generais sejam eles da ativa ou da reserva envolvidos diretamente com a política nacional, sejam de cara limpa, seja em obscuras notas em off para jornalistas que se comportam como verdadeiros assessores de imprensa.
Não, Bolsonaro não é o padrinho desse gigantismo e descontrole institucional, esse é um projeto que começou no dia seguinte à Constituinte.
Acontece que a delinquência que tomou conta do Palácio do Planalto, as falas indevidas de militares que não se limitam ao seu espaço na República e os acintes do presidente criaram a falsa impressão de que nossas instituições são fracas, minúsculas e inoperantes. Acontece é que o problema não está na “fraqueza” das nossas instituições, o problema é o extremo oposto!
Quando você parar de acreditar em um golpe que nunca virá, perceberá que Jair é minúsculo e faz o que quer justamente porque sabe que as instituições não dão a mínima para ele. E para elas isso é bom!
Dois episódios recentes mostram a “força” do tal golpe que Bolsonaro usa para desviar a atenção do país.
O primeiro ocorreu no mês passado, durante um evento no Rio de Janeiro. Lula deu uma carraspana daquelas nos militares que agora amam fazer política.
Nenhuma nota, chilique ou alvoroço na caserna. O motivo? Morrem de medo de perderem a mamata, sabem que a posse de Lula é uma possibilidade palpável.
A volta do protagonismo militar foi um erro dos governos petistas. Deveriam ter seguido FHC que estava eliminando a ameaça fardada por inanição.
Lula abasteceu as Forças Armadas e eles esperam que isso ocorra novamente. Por isso, diante da fala do Lula, muito mais pesada e firme do que a fala de Roberto Barroso, permaneceram em silêncio.
O segundo episódio aconteceu esta semana, durante um evento na USP. O Ministro do STF Alexandre de Moraes também deu uma bronca daquelas em quem busca tumultuar o processo eleitoral desse ano.
Bolsonaro sequer rebateu a fala do ministro. Seus assessores recomendaram fortemente que o presidente não vá nos atos antidemocráticos deste final de semana.
A diferença entre Alexandre e Barroso: o primeiro fala e faz, o segundo apenas fala demais.
Dois casos em que tanto os militares quanto Jair ficaram calados. E ainda há quem fale de golpe.
Não deixa de ser horrível o fato de mais uma vez um ministro do STF falando sobre casos que estão na Corte durante uma palestra, ou seja, fora dos autos.
Reafirmo! Para o bem da institucionalidade brasileira: já passou da hora de os ministros do STF pararem de participar de articulações políticas e, principalmente, acabarem com as palestras e entrevistas em que comentam casos da Corte ou fazem análise de conjuntura. Isso é absurdo!
Mas voltando ao tema principal do artigo…
O palhaço no Alvorada toma conta dos noticiários enquanto o descontrole segue.
Com uma inflação cáustica obliterando a renda de milhões de brasileiros, Jair consegue desviar a atenção do país com a destreza de um Harry Houdini enquanto mantém a sua rotina de passeios, campanhas eleitorais antecipadas e intensa vagabundagem.
Oras! É mais interessante ao mandrião presidencial responder a perguntas sobre se haverá golpe ou não, se respeitará as eleições ou não e manter a sua militância engajada contra um comunismo que não existe do que responder por que o consumo de frutas e legumes caiu 37% entre desempregados na pandemia ou então por que a renda dos brasileiros caiu quase 10%.
Policiais indisciplinados, militares verborrágicos, um Ministério Público que brinca de tutelar o país, alguns ministros do STF que não fogem de um bom microfone e um Congresso Nacional que vive uma relação de morde e assopra com o presidente. São estes os beneficiários indiretos do golpe que nunca virá do Jair Bolsonaro.
O beneficiário direto é ninguém menos que Bolsonaro. O motivo? Segue abaixo:
Uma pesquisa da CNI divulgada na semana passada aponta que 95% da população sentiu o impacto da inflação. Ou seja, Bolsonaro fará de tudo para evitar o debate sobre a sua própria incompetência.
O golpe que Bolsonaro professa com ares messiânicos jamais chegará, mas as contas do mês, os boletos e a fome, esses sim, chegarão.
Encerro com essa música sensacional do podcast Medo e Delírio em Brasília:
Pronto, @cristianobotafo fiz um corte kkk
Melhor jingle!! pic.twitter.com/BNN8CbbRLJ
— Cleber Lourenço (@ocolunista_) April 28, 2022