Juliana Oliveira *
O governo federal publicou, no início de fevereiro, os projetos que são prioritários no Congresso para o ano de 2022.
São 45 prioridades e eu não farei qualquer avaliação político-ideológica sobre elas. Um governo é eleito com um programa e as prioridades elencadas me parecem aderentes ao programa para o qual o atual governo foi eleito.
Mas não posso deixar de chamar atenção para a violência contra mulheres e crianças que esconde um dos pontos: o fim do auxílio-reclusão.
O auxílio-reclusão é pago aos dependentes do preso em regime fechado que realizou, pagou, ao menos, 24 contribuições para o Regime Geral de Previdência Social, quando da prisão.
Sim, não é o dependente de todo preso que tem direito ao auxílio-reclusão. É preciso que o preso tenha trabalhado com carteira assinada – ou contribuído individualmente ou em outra forma prevista – por 24 meses.
A população carcerária brasileira é de 682.100 presos. Em dezembro de 2021 foram pagos auxílio-reclusão para 23 mil famílias. É pequeno o número de famílias beneficiadas.
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Mas são 23 mil famílias que, se biparental, deixarão a mulher e filhos desamparados. Se monoparental, deixarão crianças desemparadas.
O artigo quinto, inciso décimo quarto, da Constituição Federal, e o item 3 do artigo quinto da Convenção Americana Sobre Direitos Humanos, são claros em vedar a transferência da pena para outra pessoa. Ao impedir que mulher e filhos dos apenados recebam o auxílio-reclusão, é como se a pena do delinquente fosse compartilhada com seus dependentes.
Os beneficiários do auxílio são, na sua maioria, mulheres e crianças, população que hoje já está entre as mais vulneráveis. Deixar essas pessoas sem uma condição mínima de sobrevivência é, em última análise, empurrá-las para a criminalidade, para a prática de crimes famélicos. Como se já não bastasse o amplo desastre social e econômico que atinge sobretudo a população mais pobre do Brasil.
O fim do auxílio-reclusão, ao ampliar para terceiros, a pena, configura-se inconstitucional, aumenta a vulnerabilidade de mulheres e crianças e sobrecarrega o número de dependentes da assistência social, condenando-os mais ainda à marginalidade.
* Juliana Oliveira é jornalista e profissional de Advocacy.
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