Presidentes de onze partidos se reuniram virtualmente durante o fim de semana e fecharam posição a favor do sistema atual de votação, pela urna eletrônica, contra a proposta do voto impresso (PEC 135/19) que tramita na Câmara dos Deputados. Parte dos líderes que estavam na reunião são do Centrão na Câmara, bloco que apoia o presidente Jair Bolsonaro.
Participaram do encontro ACM Neto (DEM), Baleia Rossi (MDB – SP), Bruno Araújo (PSDB), Ciro Nogueira (PP), Gilberto Kassab (PSD), Luciano Bivar (PSL), Luis Tibé (Avante), Marcos Pereira (Republicanos), Paulo Pereira da Silva (Solidariedade), Roberto Freire (Cidadania) e Valdemar Costa Neto (PL). As siglas representam ao todo 326 deputados, o equivalente a 63,5% das cadeiras na Câmara. O número indica que o governo Jair Bolsonaro deve enfrentar dificuldades para aprovar a adoção do voto impresso.
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Os líderes partidários defendem que o sistema eleitoral é confiável e que mudar as regras do jogo, a essa altura, poderia gerar incertezas no processo. Nos últimos meses, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) também vem defendendo a integridade do sistema.
Ao portal G1, ACM Neto disse que o movimento criado pelos congressistas vai dificultar qualquer mudança na legislação. “Nós, esses onze partidos, entendemos que era preciso um movimento coletivo para trazer um sinal claro de confiança no sistema eleitoral atual. Nós temos total confiança, que o Brasil tem um dos sistemas eleitorais mais modernos no mundo. Uma coisa que está dando tão certo, para que mexer?”, disse o ex-prefeito de Salvador.
O presidente do TSE, ministro Luís Roberto Barroso, tem feito diversas campanhas a favor do voto eletrônico. Ele viu com bons olhos a movimentação dos líderes na Câmara. Em comissão especial para analisar o projeto, Barroso comentou sobre o perigo da quebra de sigilo que o voto acarreta, risco de fraudes e a chance de judicialização do resultado das eleições. A digitalização do processo eleitoral, defende, retira o risco de manipulação humana nas etapas e diminui, tanto a possibilidade de burlas ao sistema, quanto de erros.
A PEC já foi aprovada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, que não analisa o mérito do texto, e sim a adequação formal da proposta. Em 13 de maio, a Câmara instalou uma comissão especial para analisar o projeto que pode tornar obrigatório o voto impresso no país. Esta é uma bandeira levantada pela base do governo e a autora do projeto é a deputada bolsonarista Bia Kicis (PSL-DF). Mesmo sem apresentar qualquer indício de fraude no sistema atual, o presidente Jair Bolsonaro já ameaçou não reconhecer o resultado da eleição caso não haja voto impresso em 2022.
PublicidadeO Congresso em Foco perguntou ao TSE sobre os desafios para a implementação do voto impresso. Confira a entrevista e entenda melhor as consequências do projeto:
Congresso em Foco: Quantas impressoras são necessárias para a implementação do voto impresso?
TSE: Isso vai depender da proposta que for eventualmente aprovada pelo Congresso Nacional. Informamos, para conhecimento, que o quantitativo de urnas para as Eleições de 2022, é de cerca de 577.125, a serem usadas para as seções eleitorais, urnas de contingência (preparadas para substituir urnas de seção em caso de pane na votação) e reserva técnica nacional.
Qual o custo desse equipamento para os cofres públicos?
A estimativa de custo de R$ 2 bilhões considera a implementação do voto impresso em 100% das urnas eletrônicas. Ele leva em consideração estimativas de 2018. Este valor inclui não apenas a aquisição do módulo impressor (avaliado, com base nos valores de 2018, em cerca de R$ 1,6 bilhão), mas outros custos agregados, essenciais para sua utilização nas eleições, como aquisição da urna plástica descartável para armazenamento dos votos impressos, bobinas de papel, lacres de segurança, além de transporte e armazenamento.
Cabe ressaltar, porém, que é muito provável que, em novo procedimento licitatório, esses valores sejam ainda mais elevados, tendo em vista a variação cambial, a crise mundial de abastecimento de componentes eletrônicos e as dificuldades logísticas impostas pela pandemia da covid-19.
De onde sairia o recurso para implementação do voto impresso?
Esses recursos são disponibilizados pela União e deverão estar previstos na Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2022 da Justiça Eleitoral.
É possível instalar esse sistema para as eleições de 2022?
Ainda não temos um estudo sobre essa viabilidade. Contudo, vale ressaltar que qualquer procedimento de aquisição no serviço público envolve a realização de licitação, pautada por rígidos trâmites administrativos e burocráticos. Não é possível estimar um prazo de duração do processo licitatório, tendo em vista o tempo necessário para as especificações técnicas e a margem de imprevisibilidade decorrente dos procedimentos de qualificação e dos eventuais recursos administrativos e judiciais. Além disso, é necessário que o mercado tenha condições de atender uma demanda desta magnitude, tendo em vista que são mais de 500 mil urnas em todo o país.
Após o procedimento licitatório, ainda há um longo processo de produção e testes. Há também etapas de desenvolvimento do software, e processos de armazenamento e custódia, transporte e treinamento. Portanto, a implantação do voto impresso envolve um procedimento demorado, embora não seja possível, neste momento, estimar sua duração.
Quais são as principais desvantagens de se implementar um sistema de voto eletrônico?
A impressão do voto dá uma sensação falsa de segurança no processo. Isso porque o voto, uma vez impresso, pode sofrer fraudes com facilidade muito maior do que o voto eletrônico, vistos os casos documentados de fraudes em cédulas de papel antes da adoção do processo eletrônico de votação.
Além da fragilidade da impressão do voto como mecanismo de auditoria, há de se considerar os problemas decorrentes de sua implantação. É bom que se lembre que em duas ocasiões os votos já foram impressos: em 1996 e em 2002. Em 2002, por exemplo, houve muitas filas, votações que entraram pela madrugada, eleitores que saíram das cabines de votação sem confirmar seus votos, problemas mecânicos nas impressoras e necessidade de muitas seções de terem que ir para a votação em cédula.
A decisão por substituir a impressão do voto por outros mecanismos de auditabilidade, como o Teste de Integridade e o Registro Digital de Voto, não só resolveu os problemas identificados na impressão do voto, como assegurou a verificação de todo o processo, com mecanismos mais confiáveis que os votos em papel.
Nosso sistema eleitoral é facilmente raqueado por criminosos? Qual a probabilidade disso acontecer?
O sistema foi construído para tornar a fraude inviável. Também há vários pontos de auditoria e verificação de integridade, inclusive a apresentação de códigos-fonte durante os 180 dias que antecedem as eleições. Ao final dessa disponibilização, tudo é compilado e lacrado em cerimônia pública. Infelizmente, os partidos políticos pouco ou nada comparecem a tais eventos de auditoria e verificação, inclusive no teste da urna (antiga votação paralela) e o Teste Público de Segurança.
Assim, há vários mecanismos para verificar e auditar o sistema eletrônico de votação. Dessa forma, o sistema é totalmente transparente e auditável, do primeiro ao último momento. Ou seja, qualquer pessoa pode conferir tudo o que foi feito.
Desde a mudança do processo eleitoral convencional para o paradigma digital, que ocorreu com o advento da urna eletrônica nas eleições municipais de 1996, não há qualquer evidência de fraude no processo eleitoral. O fato é que nesses 25 anos de existência da urna eletrônica, não houve qualquer registro de fraude. Portanto a história do processo eleitoral informatizado, juntamente com todos os mecanismos de auditoria disponíveis, são a maior evidência de que as urnas eletrônicas brasileiras são seguras.
O TSE tem um sistema de monitoramento dessas invasões no sistema? Como ele funciona?
O TSE monitora continuamente os serviços disponibilizados à população de forma a assegurar a estabilidade e o acesso aos serviços, de acordo com normas e boas práticas internacionais de segurança.
A população mais carente, que não tem acesso à leitura, educação etc, pode ficar mais vulnerável à coerção no momento do voto se as cédulas físicas forem implementadas?
A população brasileira tem um longo histórico de abusos dos direitos eleitorais, como o voto de cabresto. Nesse sentido, para a população mais carente, a introdução de novos elementos no processo de votação pode ser fonte de desinformação.
Para assegurar o direito ao exercício do voto por todos o eleitorado brasileiro, o TSE promove diversas ações educativas e informativas que vão desde o alistamento eleitoral, o incentivo de novas lideranças, e mesmo a segurança e transparência do processo eleitoral.
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Thaís Rodrigues é repórter do Programa de Diversidade nas Redações realizado pela Énois – Laboratório de Jornalismo, com o apoio do Google News Initiative.
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