Foram dois anos de trabalho na Comissão Especial. Durante todo o tempo, nos debates internos, nas audiências públicas, nas polêmicas de bastidor, ficaram claros os grandes obstáculos que teriam que ser superados. Há um sentimento conservador, que sempre se opõe a tudo que cheira a inovação, e um instinto de sobrevivência natural presente em todo o Congresso, já que a representação política atual é fruto das regras vigentes.
O presidente da Câmara, deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), resolveu pautar aquilo que seria o último suspiro da reforma política. Confesso uma enorme frustração. Tudo indica que, se a montanha parir, irá parir um rato. O conjunto de quatro ajustes que está sendo proposto sequer merece o nome de reforma política.
O Brasil tem um sistema político-eleitoral único, sem igual na experiência das democracias avançadas. Não temos o distrital puro (Estados Unidos, França e Inglaterra), não temos a lista fechada (Espanha e Portugal) nem a combinação dos dois no distrital misto (Alemanha). Portanto, o voto não tem raízes sólidas no programa ou na regionalização da representação. Resultado: baixa identificação da sociedade com a representação, vínculos tênues entre eleitor e eleito, frágil controle social sobre mandatos, campanhas caríssimas, relações incestuosas entre financiador e financiado, fragilização dos partidos, péssimo ambiente para a governabilidade. Não se faz reforma por modismos, mas porque é necessário mudar.
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As mudanças propostas são tímidas e contraditórias. O voto continuaria como é hoje: individual, caro, despolitizado, sem referência territorial ou ideológica, mudando apenas a fórmula de cálculo posterior, ao introduzir o chamado sistema belga. Para o eleitor, não muda nada.
Somar-se-ia o financiamento público exclusivo de campanha. Diagnóstico certo, remédio errado. É preciso fechar as portas para o predomínio do poder econômico nas eleições e para a corrupção potencial que nasce. Mas o financiamento público só seria viável se barateássemos as campanhas com a mudança radical do sistema eleitoral. A fórmula proposta é absolutamente inviável e contraditória: campanhas caras e dinheiro escasso. Resultado provável: mais caixa dois, judicialização e criminalização da atividade política. Podemos ficar tranquilos: não há a menor chance de dar certo.
O terceiro item seria o fim das coligações proporcionais. Medida correta para evitar que o eleitor vote em A e eleja Z. Dar visibilidade e transparência às afinidades e diferenças. Mas, infelizmente, o jeitinho brasileiro já está engatilhado: serão permitidas as federações de partidos em escala regional.
Por último, a coincidência de mandatos em um único ano. Há traços positivos, mas, talvez, não na mesma data. Não dá para misturar a discussão do buraco da rua com macroeconomia e política externa.
Diante do fracasso em se construir um consenso mais ousado, talvez seja melhor deixar como está. Por incrível que pareça, sempre é possível piorar.
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