Estamos em plena celebração do Rosh Hashaná, o ano novo judaico e às vésperas de celebrar o Yom Kippur, o dia da expiação ou do perdão, a data mais sagrada dos judeus. Contudo, o espírito de paz e reconciliação que deveria pairar sobre Israel está ausente, exterminado que foi tanto pelas agressões de grupos terroristas e, agora, da república islâmica do Irã, como pela reação desproporcional do atual governo israelense dirigido por um grupo de sociopatas que envergonham os fundadores do estado de Israel.
Israel proclama ser uma democracia. O problema é que é a única na região onde se encontra e, paulatinamente, vai ficando contagiada pela violência dos regimes vizinhos, ditaduras de diversas roupagens (teocráticas, militares, monárquicas, familiares), mas ditaduras, com exceção do Líbano que, dilacerado por sucessivas guerras civis, existe apenas nominalmente como entidade estatal.
Com efeito, uma democracia não pratica nem se orgulha de eliminar fisicamente os seus inimigos, antes os captura e os submete a julgamento, como se deve em um estado democrático de direito. Foi o que fez o Israel de antanho quando capturou, em Buenos Aires, Eichmann, o carrasco nazista, e o julgou com audiências televisadas. Acabou na forca, merecidamente. Mas foi democraticamente julgado, inclusive com direito a ampla defesa.
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Tudo isso ficou para atrás com a “brutalização” progressiva da política israelense que afastou o partido trabalhista do poder (que personificava os ideais dos “pais fundadores”), assassinou seu principal expoente, Yitzhak Rabin, em 1995, e enterrou toda possibilidade de paz e de convivência com os palestinos. Os sucessivos governos israelenses se tornaram cada vez mais radicais, ignorando todas as resoluções da ONU, apelos da comunidade internacional e múltiplas iniciativas bilaterais. Hoje, é evidente que a solução de 2 estados, um israelense e um palestino, convivendo em paz e segurança é inviável pelas próximas gerações.
Defender, em 2024, uma saída negociada para o conflito do Oriente Médio é ser ingênuo ou ignorante. De onde o título deste artigo, calcado de um histórico faroeste de 1969, dirigido por Sam Peckinpah que introduziu a ultraviolência no gênero. O ódio atual dos israelenses, dos palestinos, dos libaneses, dos árabes, dos iranianos está garantido pelas próximas gerações. Milhares de famílias perderam (e tristemente ainda perderão) seres queridos sem terem nenhuma responsabilidade pelo terrorismo de Hamas e Hezbollah, nem pelos ataques “cirúrgicos” das Forças de Defesa de Israel.
Netanyahu, criminoso de guerra que ignora as dezenas de reféns israelenses nas mãos do Hamas, optou pela guerra total, seguro do apoio, incondicional ou, quando muito, de cenho franzido, dos Estados Unidos. Parece ignorar que Israel é quem mais teria a ganhar com um entorno pacífico. Basta olhar para o mapa e perceber que o estado judeu não pode perder nenhuma guerra, mais até, nenhuma batalha, pois isso significaria o seu fim dado o seu exíguo território e sua reduzida população comparada ao entorno.
PublicidadePretender estar em “guerra” com o Hamas, o Hezbollah, os Houtis, é uma falácia. São organizações terroristas não estatais. Assim, não podem ser derrotadas no campo de batalha. Não há “rendição” de organização terrorista, quando muito eliminação de seus líderes e degradação de seu potencial militar. E, a cada líder “neutralizado” pelas Forças de Defesa de Israel (FDI) surge outro pior. Basta ver as fotos do líder do Hamas Ismail Haniyeh (que estava negociando o cessar fogo em Gaza, quando o Mossad explodiu uma bomba embaixo de sua cama em pleno quartel da guarda revolucionária em Teerã) com as de Yahya Sinwhar, seu sucessor. O primeiro parecia um professor universitário, o outro lembra um psicopata lombrosiano.
Para “eliminar” uma organização terrorista é inútil dizimar os seus membros. A solução passa por atacar as causas que levaram ao surgimento da opção do terrorismo, resposta de fracos e oprimidos. Israel, a força dominante na região, militar e economicamente, vitorioso em todas as guerras, tem de se reorientar politicamente e ceder terras e fundos para construir um estado palestino viável, única saída para eliminar o sentimento de injustiça e revolta hoje existente e caldo de cultivo para organizações cada vez mais radicais e violentas. Hoje, isso não tem espaço, mas temos de acreditar que gerações vindouras sejam mais esclarecidas e menos traumatizadas.
Para piorar o objetivo de Israel, parece ser agora a república Islâmica do Irã. Ocorre que, diferentemente de muitos países da região que eram colônias do império otomano e foram “fabricados” pelo Reino Unido e a França após a Primeira Guerra Mundial, o Irã é um país milenário, com uns 80 milhões de habitantes, cultura arraigada e, mesmo o regime teocrático não gozando da popularidade de antanho, qualquer ataque terá por resposta um fortalecimento do nacionalismo e não a queda do regime. Se tudo der errado, como querem Israel e os Estados Unidos, o Irã será muito castigado, mas revidará, e o regime endurecerá ainda mais. Ao invés de aproveitar a mão estendida do novo presidente do Irã, Masoud Pezeshkian, um reformista, parte-se para a guerra. O Irã não é o Iraque, mais sofrimento à vista.
Ademais, a abissal superioridade militar de hoje das FDI pode acabar um dia e, semeando ódio, não vai se colher amor. Vamos continuar assistindo ao massacre cotidiano de milhares de civis no Líbano, na Palestina, na Síria, no Iraque, no Irã. Como contrapartida teremos ataques de índole variada (suicidas, drones, mísseis, bombas) que causarão dezenas de vítimas em Israel.
Por outro lado, outro feito notável na biografia de “Bibi” Netanyahu é ter revivido o antissemitismo, que andava como que envergonhado após o holocausto. Na Europa, berço das perseguições aos judeus desde séculos, certos políticos em ascensão não se acanham mais em condenar Israel e culpar os judeus (sempre eles) pelos problemas do mundo. Nos Estados Unidos até as melhores universidades foram tomadas por uma maré em favor de uma Palestina “do rio até o mar”, ou seja, do rio Jordão até o Mediterrâneo, que oblitera o estado de Israel e aviva um antissemitismo crescente.
No Brasil, inclusive, terra miscigenada, crisol das mais variadas culturas, terra que foi de acolhimento de imigrantes dos quatro cantos do mundo, surge um antissemitismo que pretende criticar o estado de Israel, o movimento sionista, sem ousar, ainda, dizer que é contra os judeus. Mas é! E a comunidade judaica tem de tomar precauções contra atentados em escolas, sinagogas e instituições.
No conflito do Oriente Médio há mais uma vítima: O multilateralismo. As instituições multilaterais, que representaram a esperança de um mundo sem conflitos armados, onde as nações e os povos dirimiriam suas diferenças ao redor de uma mesa de negociações em Nova Iorque ou noutro local atrativo, morreram. Só respiram agora por aparelhos a própria ONU, OEA, OMC e outras tantas. Apenas abnegados diplomatas, mercadores de ilusões, proclamam que continuam sendo relevantes, só se for para eles.
Quer gostemos, quer não, o mundo, hoje, é bilateral. E, no bilateralismo, a força militar é fator preponderante. Hobbes e o seu Leviatã estão na ordem do dia, é o Estado Natural que predomina, o Pacto Social foi escanteado. Prova disso é a nova corrida armamentista que tomou conta do mundo, convém não esperar que disso saia uma nova ordem mundial eivada de boa fé e amor pelo próximo.
Para o Brasil, resta atentar para o velho proverbio romano: Si vis pacem, para bellum (se desejas a paz, prepara-te para e guerra).
Salaam Aleikum!
Shalom!
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