Esgotou-se nesta sexta-feira (6) o prazo para que a minirreforma eleitoral pudesse surtir efeito nas eleições municipais de 2024. Com isso, permanece vigente a atual legislação eleitoral, enterrando as mudanças desejadas pela Câmara dos Deputados. Outra consequência do adiamento da votação, conforme conta o advogado eleitoral Amilton Augusto, é a concentração do poder de decisão sobre lacunas legislativas nas mãos do Judiciário.
A minirreforma eleitoral foi aprovada na segunda quinzena de setembro pela Câmara dos Deputados, com o intuito de preencher, antes das eleições de 2024, espaços que restaram após a reforma política de 2017 e que ainda resultam em disputas judiciais entre os partidos. Esforços conjuntos para enfraquecer mecanismos de controle, como alterações nas normas estabelecidas pela Lei da Ficha Limpa, resultaram em repúdio por parte da sociedade e em resistência por parte do Senado, que segue analisando os dois projetos de lei que compõem a reforma.
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Mudanças na legislação eleitoral, porém, só possuem efeito em pleitos iniciados um ano depois da sanção presidencial ou promulgação. Com isso, a partir de hoje, qualquer norma aprovada pelo Legislativo para fins eleitorais teria efeito apenas em 2026, nas eleições gerais. Com a minirreforma eleitoral, a situação não é diferente. Para 2024, portanto, a pacificação de zonas cinzentas na lei ficará a cargo do Judiciário, cujas decisões não requerem a antecedência de um ano.
Amilton Augusto conta que já existem alguns temas tratados na minirreforma que tendem a ser abordados pela Justiça eleitoral até outubro de 2024. Um deles é o estabelecimento de protocolos para a realização de doações eleitorais por meio de Pix. “Esse é um tema que eu acredito que a Justiça eleitoral acabe regulamentando por meio de resolução. É um ponto que tentaram passar na reforma, mas ficou essa zona nebulosa ao redor de um meio de pagamento que já está inserido na sociedade”, apontou.
O tratamento dado às cotas orçamentárias de gênero e raça dentro das federações partidárias também tende a ser tema de decisões da Justiça eleitoral. “Esse é um ponto que podem regulamentar, principalmente para esclarecer se os partidos devem calcular de forma isolada nas eleições proporcionais ou com base no quantitativo genérico”, antecipou o jurista.
Um dos pontos mais polêmicos da minirreforma eleitoral é a mudança de critérios para o cálculo da inelegibilidade de candidatos condenados em segunda instância. O atual critério prevê que esse prazo começa a ser contado a partir do final do cumprimento da pena, enquanto o texto aprovado na Câmara estabelece o início da contagem no trânsito em julgado da sentença.
PublicidadeEssa questão já é tema de um processo que corre no Supremo Tribunal Federal (STF). Este, porém, não possui indícios de que possa avançar antes de outubro de 2024. “Não creio que o STF tome alguma decisão nesse sentido tão próximo da eleição. É possível, e não ficaria limitado pelo princípio da anualidade. Mas estamos falando de uma eleição municipal. Se fosse federal, as chances até seriam maiores, mas a pressão de uma eleição municipal sobre órgãos federais é muito menor”, avaliou.
Existem também, conforme conta o advogado, diversas outras lacunas na legislação eleitoral que constam do texto da minirreforma mas também não possuem indícios de abordagem no Judiciário antes das eleições, como a regulação das candidaturas coletivas, atualmente aceitas mas sem muitos critérios de funcionamento, e o tratamento dado às sobras eleitorais, cuja reforma tornaria a distribuição mais rigorosa para os partidos e menos para os candidatos.
Alguns temas já ficam fora do alcance do Judiciário. O principal deles era a previsão de aumento no rol de possíveis vítimas de violência política de gênero, cujo texto da minirreforma expande os efeitos para assessoras de candidatas e pré-candidatas. Nesse caso, Amilton Augusto ressalta que mudanças só podem ser feitas por meio de lei.
As normas de elaboração das propagandas eleitorais também tendem a permanecer inalteradas em 2024, e fica também eliminada a chance da transformação da pena por compra de votos em multa, permanecendo assim a atual pena de cassação do mandato ou diploma eleitoral.