No próximo dia 7, completa-se um ano que o partido do presidente Jair Bolsonaro saiu das urnas na condição de segunda maior bancada eleita na Câmara, deixando para trás um passado de mais de duas décadas de inexpressividade política. Façanha coroada três semanas depois com a histórica eleição de Bolsonaro para o cargo máximo da República. Mas, ao contrário do que se poderia pensar, o PSL não está para comemorações.
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Brigas internas por espaço político, articulações para derrubar seu presidente, contrariedade com os rumos das eleições municipais, cobrança de cargos, racha entre calouros e veteranos e até ameaça de debandada. Esse é o clima no partido do presidente no Congresso. “Ninguém está satisfeito”, resumiu ao Congresso em Foco um deputado que corre atrás de assinaturas para tentar antecipar a convenção nacional e discutir o futuro do partido. “Outras listas estão circulando”, ressaltou, pedindo para não ter o nome revelado.
Com a antecipação, um grupo tenta tirar do comando partidário o deputado Luciano Bivar (PE), que fundou e preside o PSL desde 1998. Bivar, porém, tem o apoio dos líderes na Câmara, Delegado Waldir (GO), e no Senado, Major Olimpio (SP), que criticam a falta de experiência política e o açodamento dos novatos. Procurado pela reportagem, o pernambucano informou por meio de sua assessoria que não se manifestaria.
Uma ala do partido defende que um aliado mais próximo do presidente assuma o controle do PSL, a exemplo do que ocorreu durante a eleição do ano passado, quando o advogado Gustavo Bebbiano, até então homem de confiança de Bolsonaro, comandou o partido. Mas há também quem apoie a ideia de que o presidente deixe a legenda: mudando-se para outra nanica, como era o PSL, ou criando uma nova.
Até o momento, porém, essas divergências não tiraram votos do governo nos plenários da Câmara e do Senado. A bancada de deputados, por exemplo, é a mais fiel ao presidente, com quase 100% de apoio nas votações. Embora as críticas não sejam dirigidas hoje a Bolsonaro, ninguém sabe até onde essa instabilidade pode levar. O auge do confronto até agora foi a expulsão de Alexandre Frota (SP), hoje no PSDB, que ocupou a tribuna da Câmara dezenas de vezes em nome do partido para atacar o presidente.
Para onde?
Um dos nomes mais cotados para deixar o PSL, Major Olimpio descarta a possibilidade de Bolsonaro mudar de sigla. “Seria o mesmo que uma pessoa que mora sozinha fugir de casa. Vai para onde? Ele é o ícone do partido”, diz o parlamentar paulista.Olimpio flerta com o Podemos em meio a desavenças públicas, por motivos diferentes, com dois filhos do presidente, o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) e o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ). No caso de Flávio – a quem sugeriu que deixasse a sigla – a grita é pela pressão feita pelo parlamentar fluminense contra a criação da CPI da Lava Toga, para investigar ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Em relação a Eduardo, os desentendimentos decorrem da atuação do deputado paulista à frente do diretório estadual.
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O senador, no entanto, ataca colegas novatos na política que acusam Luciano Bivar de dirigir o partido com mão de ferro. “Esquecem-se que quem abriu espaço para o Bolsonaro no PSL foi o Bivar. Quem é o líder que o PSL vai colocar no lugar? Não há um nome sequer. Esses que reclamam, se estivessem em um partido diferente, nem teriam sido eleitos. Muitos estão em voo de galinha. Não terão um segundo mandato”, criticou.
Olimpio sugere aos incomodados que deixem o PSL. “Digo a quem quer sair do partido: não passe vontade. Vai já, que o Deus o leve. Não vai fazer falta”, provocou. “Nunca leram o estatuto do partido, não sabem o que é disciplina partidária. O palco é pequeno para muito artista. Crescemos muito rápido. Falam besteira pelo que não sabem.”
Excluído do WhatsApp
Intitulando-se como “o mais rebelde do PSL”, o deputado Bibo Nunes (RS) está em guerra declarada contra o presidente do partido, a quem acusa de perseguição política. Com esse argumento, o apresentador de TV que faz sua estreia na política prepara sua filiação ao Patriotas. Depois de questionar Bivar sobre denúncias de que teria responsabilidade pelo lançamento de candidaturas laranjas, o gaúcho foi excluído da vice-liderança, de comissões e até do grupo de WhatsApp da bancada.
“Ele é um coronel. Acha que é dono do partido. Podia ser coronel quando o partido só tinha um deputado, não agora que tem mais de 50”, disse Bibo ao Congresso em Foco. “Se alguém é dono do partido, é o Bolsonaro”, acrescentou. No início da semana a comissão de ética do PSL arquivou um processo movido pelo deputado contra Bivar.
O parlamentar gaúcho diz que tem audiência marcada com Bolsonaro na próxima semana. Durante o encontro, pretende sugerir ao presidente que deixe o PSL. “De 0 a 10, é mais de 5 a chance de Bolsonaro sair do PSL. Dos 53 deputados, acredito que 40 no máximo sejam 100% Bolsonaro. O presidente detecta na hora quem é falso. Ele não tem um sexto, mas um sétimo sentido”, declarou.
À espera da janela
Outros três deputados do partido ouvidos pela reportagem estimam que mais da metade da bancada deixaria o partido se o Congresso aprovasse uma janela partidária. Pela legislação eleitoral, o mandato pertence à legenda. Quem trocar de sigla sem justa causa está sujeito à perda da vaga. Há duas semanas a presidente do Podemos, Renata Abreu (SP), incluiu em uma emenda da chamada reforma partidária, a abertura de um período de 30 dias para os parlamentares trocarem de legenda. Mas a manobra foi barrada pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).
Com isso, os deputados só poderão migrar em 2023 sem correr o risco de perder a cadeira. O Podemos recebeu semana passada a senadora Selma Arruda (MT), que deixou o PSL após bater de frente com Flávio Bolsonaro, também por causa da CPI da Lava Toga. Renata admite que são pequenas as chances de o assunto voltar à pauta e uma nova janela partidária ser aberta. No Senado, onde o mandato pertence ao partido e não ao senador, o Podemos caminha para destronar o MDB do posto de maior bancada.
Líder na Câmara, Delegado Waldir atribui as divergências internas ao desconhecimento e à falta de maturidade dos colegas que estreiam na política. “Alguns parlamentares são extremamente imaturos. Não entendem nada de política. Quem quiser sair que aguarde a janela partidária. Tem de aprender a conviver com os diferentes. O mandato é do partido, tem de saber cumprir as regras. Eles precisam saber que existe hierarquia partidária”, afirmou.
Para ele, é “zero” a chance de Bolsonaro deixar o PSL. “É muita conversa fiada. Vai para onde? Para o PSDB, o DEM, o PT? Vai criar partido para quê? Ele tem de governar o Brasil, se preocupar com a recuperação da economia, com as reformas, o desemprego. Essa questão partidária é insignificante”, disse. O deputado entende que não faz sentido buscar uma figura mais próxima de Bolsonaro para presidir o PSL. “Os filhos dele já comandam o partido no Rio de Janeiro e em São Paulo. Está bom, não?”, disse o parlamentar, para quem, não há nada que desabone a conduta de Bivar.
Próximos capítulos
Uma das figuras do partido mais próximas do presidente, Carla Zambelli (SP) considera remotas as chances de Bolsonaro deixar o PSL. Segundo ela, nem mesmo as denúncias de uso de candidaturas laranjas que respingam sobre o presidente do partido incomodam Bolsonaro. “Temos de esperar as investigações antes de acusar”, contou.
Carla admite que há um grupo dentro da bancada que pressiona Bivar a ceder a presidência a um aliado mais identificado com Bolsonaro para “reforçar mais a identidade governista”. “Esses parlamentares reconhecem que foram eleitos na onda de Bolsonaro”, acrescentou. “Mas não vejo essa vontade de tirarem Bivar a todo custo. Acho que o clima no partido até melhorou nos últimos dois meses”.
Projetada para a política pelas manifestações de 2013 e pelo impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, a criadora do movimento Nas Ruas rivaliza dentro do partido com a líder do governo no Congresso, Joice Hasselmann (SP). Ex-amigas, as duas já trocaram ofensas publicamente pelas redes sociais.
A líder sinalizou nesta semana que está disposta a deixar o partido se não for escolhida como a candidata da legenda para a prefeitura de São Paulo. “Não acho que o PSL será injusto com quem tem mais de um milhão de votos, 700 mil na cidade de São Paulo. Mas, se for, outros partidos não perderão a chance de vencer a eleição comigo”, disse a deputada ao Globo. “Os convites se acumulam. Saio candidata de qualquer jeito”, ressaltou.
As declarações foram provocadas por uma manobra de Eduardo Bolsonaro para esvaziar a candidatura da deputada, criando e entregando um diretório municipal a um grupo que faz oposição interna a ela. A decisão foi revertida nessa sexta-feira (27) por Luciano Bivar, que alegou não ter sido consultado sobre a medida. O episódio resultou na saída do deputado Luiz Philippe de Orleans e Bragança (PSL-SP) da executiva estadual. Descendente da família imperial, ele teve dura discussão com Bivar, segundo interlocutores.
Voz de general
Em seu primeiro mandato político, o deputado General Girão (RN) avalia que o partido enfrenta um problema de liderança. “O princípio básico da chefia é ouvir os liderados. A audição não está funcionando. O problema não está só na presidência, mas nos estados também onde a estrutura não existia”, afirmou o deputado, que prepara o PSL para a disputa no Rio Grande do Norte.
Amigo de Jair Bolsonaro desde os tempos de Exército no Rio, Girão explica que não tem a intenção de trocar de partido ainda que não esteja plenamente satisfeito. “Não sou um deputado do Bolsonaro. Sou um deputado do PSL. Se ele fizer algo errado, direi que não concordo”, disse. Para o deputado, os parlamentares do partido precisam ter mais paciência. “Houve uma aglomeração no partido. Há gente de todos os matizes. Chegamos agora. Ainda estamos nos conhecendo enquanto outros estão no sexto mandato”, emendou.
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