A Procuradoria-Geral da República emitiu um ofício circular para as procuradorias dos estados para que mantivessem o órgão informado sobre notícias de ilícitos envolvendo governadores durante a crise do novo coronavírus.
Segundo documento obtido pelo Congresso em Foco, em abril, a subprocuradora-geral, Lindôra Araujo, solicitou a remessa de “todas as notícias de fato/procedimentos/documentos envolvendo governadores” à PGR.
Uma fonte ouvida sob condição de sigilo pelo Congresso em Foco afirma que o objetivo é centralizar na PGR qualquer informação sobre investigações de desvios relacionado à covid-19 que envolvem governadores. Em tese, esse envio é natural por prerrogativa de foro, mas ação ativa da procuradoria de solicitar esse envio é incomum. “O que aconteceu é que estava proativamente colhendo informações para uma ação específica, algo intencional, planejado, fora do padrão”, diz a fonte.
Pelo pedido da PGR, devem ser enviados à Brasília as mínimas suspeições que cheguem aos promotores locais ainda que não haja provas sobre o envolvimento de governadores. Esse é o caso das “notícias de fato”.
Apesar da negativa do procurador-geral da República, Augusto Aras, de estar organizando uma investigação contra os governadores, a deflagração da operação Placebo, da Polícia Federal, contra o governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC-RJ), na manhã desta terça-feira (26) reacendeu o alerta para a legitimidade do pedido.
De acordo com informações da Folha de S. Paulo há, de fato, uma investigação em curso envolvendo as gestões de João Doria (PSDB-SP), Wilson Miranda Lima (PSC-AM), Helder Barbalho (MDB-PA), João Azevedo (PSB-PB) e Wilson Witzel (PSC-RJ), além de outros três mandatários que não tiveram os nomes revelados.
Outro fato que chamou atenção de parlamentares foi o vazamento de informações privilegiadas feito pela deputada Carla Zambelli (PSL-SP), uma das principais aliadas do presidente Jair Bolsonaro, sobre as operações da PF.
A operação no Rio de Janeiro coincidiu com alterações no comando da PF do estado após o ex-ministro Sergio Moro afirmar que Bolsonaro queria interferir politicamente na corporação. Fato que gerou a publicidade do vídeo da reunião ministerial de 22 de abril.
Por meio de sua assessoria, Aras informou que o ofício não foi para que as Procuradorias “mantivessem a PGR informada”. “O ofício foi para que as Procuradorias remetam à PGR os procedimentos envolvendo governadores de Estados que indiquem a existência de ilícitos. Nos termos do artigo 105 da Constituição, compete somente ao procurador-geral da República processar os governadores perante o Superior Tribunal de Justiça (STJ)”, disse.
“Qualquer expediente (representação, notícia de fato) que aponte ilícitos de governadores deve ser encaminhado à Procuradoria-Geral da República para análise da dra. Lindora Maria Araújo, responsável pelas ações penais no STJ”, complementou Aras.
Segundo o procurador-geral, o envio do ofício se deu após informações de arquivamentos, na primeira instância, de procedimentos que noticiavam crimes envolvendo governadores, sobretudo relacionados à aplicação de verbas para o combate à covid-19.
Proteção
Na avaliação das fontes ouvidas pelo Congresso em Foco, Aras almeja uma vaga no Supremo Tribunal Federal e, com essa nomeação em mente, dizem, tem sido omisso e promovido o aparelhamento do Ministério Público para atender a interesses do governo federal.
Para Carlos Fernando dos Santos Lima, procurador aposentado e antigo membro da Lava Jato em Curitiba, a gestão de Aras desarmou o sistema de investigações de combate à corrupção que havia na procuradoria. “O PGR está entregando aquilo pelo qual ele foi escolhido. Tem cometido uma série de erros na condução”, avalia.
“Se eu não quisesse investigar, não teria pedido abertura de inquérito. Todas as diligências apontadas pelo ex-ministro como sendo necessárias para elucidar os fatos foram prontamente solicitadas ao Supremo Tribunal Federal e estão sendo acompanhadas pela equipe da PGR”, afirmou Aras.