Acompanhe a íntegra da conversa do presidente com os jornalistas na quinta-feira, 12 de janeiro de 2023:
O presidente Lula disse nesta quinta-feira (12) que o ministro da Defesa, José Múcio, continuará no cargo, a despeito das críticas dirigidas a ele após os ataques golpistas do último domingo em Brasília. O petista afirmou que não pode demitir um ministro com quem tem “relação histórica” e de “profundo respeito” por qualquer erro cometido.
“Quem coloca ministro e tira ministro é o presidente da República. O José Múcio fui eu que o trouxe pra cá. Ele vai continuar sendo meu ministro, porque confio nele. É um companheiro de minha relação histórica. Tenho o mais profundo respeito por ele e ele vai continuar. Se eu tiver de demitir cada ministro na hora que ele cometer um erro, vai ser a maior rotatividade de mão-de-obra da história do Brasil, porque toda hora nós cometemos erros”, afirmou o presidente durante café da manhã com jornalistas que cobrem o Palácio do Planalto, do qual o Congresso em Foco participou.
Lula chamou de “especulação” rumores sobre a eventual demissão do ministro por causa das falhas na segurança durante a invasão aos prédios do Palácio do Planalto, do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal (STF). “Na minha cabeça, o José Múcio é o meu ministro”, reforçou. É grande a cobrança de aliados, sobretudo do PT, pela saída de Múcio. A avaliação entre os críticos é de que o ministro foi condescendente com os golpistas ao qualificar os acampamentos em frente aos quartéis-generais do Exército em várias cidades brasileiras como “manifestações democráticas” e não determinar o seu desmantelamento.
Durante uma hora e meia de conversa, o presidente voltou a condenar os atos golpistas. Para Lula, houve conivência dentro da Polícia Militar do Distrito Federal e das Forças Armadas. O episódio, segundo ele, deve servir de “alerta” para todo país. “Daqui para frente vamos ser muito mais duros e muito mais cautelosos, porque não pode acontecer o que aconteceu”, advertiu.
Desmilitarização do Planalto
O presidente admitiu desconfiar que militares tenham aberto as portas do Planalto para a entrada dos invasores golpistas.
“Eu estou esperando a poeira baixar. Eu quero ver todas as fitas gravadas dentro da Suprema Corte, dentro do palácio. Teve muito agente conivente. Teve muita gente da PM conivente. Muita gente das Forças Armadas aqui de dentro conivente. Eu estou convencido que a porta do Palácio do Planalto foi aberta para essa gente entrar porque não tem porta quebrada. Ou seja, alguém facilitou a entrada deles aqui”, afirmou.
De acordo com Lula, o momento exige uma “triagem profunda” no Planalto, com a entrada de servidores civis e a desmilitarização do palácio. “A verdade é que o Palácio estava repleto de bolsonaristas, de militares e estamos vendo se a gente conseguir corrigir para colocar funcionários de carreira – de preferência funcionários civis que estavam aqui e foram afastados, transferidos de departamento – para que isso se transforme num gabinete civil.”
Ele ressaltou que sempre teve boa relação com os militares durante seus oito anos de governo, entre 2003 e 2010, e que espera retomar esse diálogo. Mas, para isso, pontuou, deseja que as Forças Armadas compreendam o papel que têm no Estado brasileiro.
“As Forças Armadas não são o poder moderador como pensam que são. As Forças Armadas têm um papel na Constituição, que é a defesa do povo brasileiro e da nossa soberania contra possíveis inimigos externos. É isso o papel das Forças Armadas e está definido na nossa Constituição. É isso que quero que seja bem feito”, defendeu.
GLO
Lula disse, sem citar nomes, que chegaram a lhe sugerir, no próprio domingo, que decretasse uma operação de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) para conter os atos golpistas, mas que descartou prontamente a ideia porque isso representaria renunciar à sua responsabilidade e abrir caminho para o “golpe”.
Prevista na Constituição, a GLO pode ser realizada apenas por solicitação do presidente da República em casos de urgência na segurança pública no caso em que as forças tradicionais não conseguem conter totalmente uma situação. Nesse caso, as Forças Armadas são chamadas a comandar o processo até que se retome a normalidade.
“Se eu tivesse feito GLO, eu teria assumido a responsabilidade de abandonar a minha responsabilidade. Aí sim estaria acontecendo o golpe que as pessoas queriam. O Lula deixa de ser governo para que algum general assuma. Quem quiser assumir o governo que dispute uma eleição e ganhe”, afirmou.
O primeiro café da manhã de Lula com jornalistas foi organizado pelo ministro Paulo Pimenta, da Secretaria Especial de Comunicação Social, e reuniu cerca de 50 profissionais de imprensa. Além de Pimenta, que fez uma explanação inicial, prometendo empenho no combate à violência contra jornalistas, também acompanhou o presidente na entrevista a primeira-dama, Janja da Silva.
O genocida e o sem casa
Além de demonstrar desconfiança e desconforto em relação aos militares, Lula também se queixou de seu antecessor, a quem chamou de “genocida” e “cidadão com desequilíbrio mental”. “Nós ganhamos as eleições. Até hoje, o cidadão não reconheceu a derrota. Até hoje, ele ainda coloca em dúvida as urnas eletrônicas, quando, no mundo inteiro, a urna eletrônica é invejada”, disse. “Eu vi uma declaração do Bolsonaro, acho que foi ontem, de que ele ainda não acredita no sistema eleitoral. De que ele continua duvidando da urna eletrônica. Ou seja, é um cidadão que tem um problema de desequilíbrio mental. Um cidadão que foi eleito durante tantos anos pelo voto eletrônico e nunca questionou. Ele, agora que perdeu, resolve questionar?”
O presidente lamentou ainda estar morando, com a primeira-dama, Janja da Silva, em um hotel. Ele criticou as condições com que herdou de Bolsonaro o Palácio da Alvorada e a Granja do Torto, residências oficiais da Presidência. Segundo ele, não há previsão para a mudança. “Nós vamos levar um tempo. Estou preocupado porque, se for fazer uma licitação para comprar um sofá, uma cama, vamos levar 90 dias. Eu, sinceramente, estou cansado de ficar no hotel, porque não é o local apropriado para se governar um país”, disse. O petista afirmou que está consultando o Tribunal de Contas da União (TCU) para acelerar a reforma e a compra dos móveis.
“Tem pessoas que me ofereceram casa para morar, mas eu não quero morar como se fosse um clandestino. Se tem lugar para o presidente morar, eu quero entrar lá decentemente. Estamos tentando fazer a reforma, eu não sei quanto tempo vai demorar ainda, vai depender de fazer um acerto com o TCU, se é possível comprar as coisas em caráter emergencial sem passar por um processo de esperar os 90 dias de uma licitação.” O Congresso em Foco foi representado no café da manhã pelo autor deste texto, Edson Sardinha, diretor de redação do site.
Participaram do café da manhã com o presidente representantes de 38 veículos de comunicação: Anadolu (agência turca de notícias); Bandnews FM; Bandnews TV; Bloomberg; Brasil 247; Carta Capital; CBN; CNN Brasil; Congresso em Foco; Correio Braziliense; EBC; EFE; Estadão; Folha de S.Paulo; Fórum; GloboNews; Jota; Metrópoles; Poder360; O Globo; O Tempo; R7; Rádio Itatiaia; Rádio Jornal do Commercio; Rádio Nacional; RBS; Rede TV; Rede Vida; Reuters; SBT Notícias; SBT TV; The Guardian; TV Bandeirantes; TV Globo; TV Meio Norte; TV Record; UOL, e Valor Econômico. Apenas seis jornalistas conseguiram fazer perguntas ao presidente.