Para a Organização das Nações Unidas (ONU), o governo de Jair Bolsonaro violou os tratados internacionais de combate à tortura ao enfraquecer o Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT) através de um decreto presidencial editado em junho deste ano. A conclusão foi emitida nesta segunda-feira (16) pelo Subcomitê das Nações Unidas para a Prevenção de Tortura, segundo o colunista do UOL Jamil Chade.
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“Trata-se da primeira constatação formal por parte de um organismo da ONU da violação de tratados internacionais pelo Brasil. O Comitê havia recebido a queixa em setembro e, depois de uma avaliação, chegou à conclusão de que as regras precisam ser revistas”, informou Jamil Chade, explicando que a constatação da ONU não implica em sanções práticas, “mas aprofunda a crise de credibilidade do país em termos de cumprimento de acordos internacionais, principalmente no setor de direitos humanos”.
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As constatações da ONU são fruto de uma análise do decreto 9.831, que foi editado em junho pelo presidente Jair Bolsonaro com a intenção de fazer ajustes no funcionamento e na estrutura do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT). Subordinado ao Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, o MNPCT foi criado em 2013 e era composto por 11 especialistas. Bolsonaro, contudo, tornou esses postos em cargos não-remunerados e exonerou os 11 peritos que trabalhavam especificamente no combate à tortura.
O decreto presidencial foi contestado por entidades como o Colégio Nacional de Defensores Públicos-Gerais e até pela então procuradora-geral da República, Raquel Dodge. Mas o Ministério dos Direitos Humanos, que hoje é comandado por Damares Alves, garantiu que, mesmo com as exonerações, o trabalho de combate à tortura continuariam.
O compromisso, contudo, não convenceu o Subcomitê das Nações Unidas para a Prevenção de Tortura. Segundo Jamil Chade, o órgão entende que o decreto enfraqueceu severamente a política de prevenção à tortura no Brasil. “Estas mudanças na abordagem do Estado Parte em relação à prevenção da tortura e ao Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura são difíceis de entender, contrárias ao progresso feito anteriormente para a implementação de suas obrigações o e constituem um retrocesso para o sistema no Brasil”, avaliou a ONU.
PublicidadeO subcomitê das Nações Unidas pediu, então, a revogação do decreto do presidente Jair Bolsonaro para “assegurar que o sistema brasileiro de prevenção da tortura funcione de forma eficiente e independente, com autonomia financeira e estrutural e recursos adequados, de acordo com as obrigações internacionais do Brasil”.
“O Decreto parece indicar uma mudança na política do Estado Parte em relação à prevenção da tortura em geral, bem como, em particular, no modelo para cumprir suas obrigações internacionais nos termos do Protocolo”, disse a ONU, pedindo que as “autoridades brasileiras se comprometam sobre a melhor forma de fortalecer a eficácia de seu sistema de prevenção da tortura, incluindo quaisquer propostas de reforma para reforçar seu Mecanismo Nacional de Prevenção da Tortura (MNP)”.
Tortura em presídios
Em agosto, a representante da ONU Direitos Humanos na América do Sul, Birgit Gerstenberg, já havia manifestado preocupação sobre a situação dos presídios brasileiros. Ela disse que a chacina de presos registrada em uma prisão de Altamira, no Pará, “evidenciou uma realidade chocante de condições subumanas, caos, crime organizado, tortura e morte”. Mas ressaltou que, “na ausência de uma mudança radical, é provável que Altamira não seja a última delas”.
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“O fato de que vários dos casos mais brutais de violência carcerária derivem de confrontos entre internos — relacionados a causas estruturais mais amplas e abrangentes — não dispensa o Estado de sua responsabilidade de proteger a vida e integridade das pessoas presas e, certamente, a de seus agentes penitenciários. O Brasil conhece muito bem suas obrigações com a dignidade humana, não apenas conforme o direito internacional mas à luz de sua Constituição”, ressaltou Brigit à época, dizendo que o Brasil também já havia recebido inúmeras recomendações de especialistas internacionais de direitos humanos sobre a necessidade de acabar com a superlotação no sistema pricional, o crime organizado e a corrupção.
“Mas apesar de todos os diagnósticos, o Brasil tem reagido com lentidão ou mesmo adotado medidas na contramão destas obrigações e recomendações — baseadas no direito doméstico e internacional, bem como na evidência empírica. Por exemplo, ao alterar o funcionamento do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate a Tortura, peça-chave para melhorar qualquer sistema carcerário”, alertou, ainda em agosto, a ONU.
O presidente Bolsonaro, contudo, minimizou as denúncias do Ministério Público Federal de que presidiários estavam sofrendo torturas generalizadas no Pará. Bolsonaro classificou a denúncia como uma “besteira” e o ministro Sergio Moro disse que alguns relatos eram falsos.
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