O presidente Jair Bolsonaro defendeu neste sábado (12) a aprovação de um projeto de lei em tramitação no Senado que endurece a lei antiterrorismo sancionada com vetos pela ex-presidente Dilma Rousseff em 2016. A proposta enfrenta a oposição de partidos de esquerda e de movimentos sociais, que alegam que as mudanças coíbem o direito à livre manifestação.
Bolsonaro retomou ao assunto, que já havia abordado durante a campanha eleitoral, ao comentar a onda de ataques criminosos que apavora o Ceará desde o início do ano. “Ao criminoso não interessa o partido desse ou daquele governador. Hoje ele age no Ceará, amanhã em SP, RS ou GO. Suas ações, como incendiar, explodir… bens públicos ou privados, devem ser tipificados como TERRORISMO. O PLS 272/2016 do Sen Lasier Martins é louvável”, escreveu o presidente no Twitter.
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A proposta classifica como terrorismo o ato de incendiar, depredar, saquear, destruir ou explodir meios de transporte ou qualquer bem público ou privado, além de de interferir, sabotar ou danificar sistemas de informática ou bancos de dados. A pena estipulada para essas condutas vai de 12 a 30 anos de reclusão.
Leque ampliado
A lei em vigor classifica como terrorismo a prática de atos individuais ou coletivos “por razões de xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia e religião”, com a finalidade de provocar terror social ou generalizado. O projeto de Lasier, relatado pelo senador Magno Malta (PR-ES) na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), inclui entre os atos terroristas aqueles praticados por “motivações políticas, ideológicas, sociais” e enquadra quem “coagir autoridade do poder público a adotar determinada conduta.”
Pressionada pelo PT e por movimentos sociais e sindicais, Dilma vetou esses itens da lei antiterrorismo aprovada pelo Congresso em 2016 em meio à organização dos Jogos Olímpicos no Rio de Janeiro. Naquele ano, a Polícia Federal prendeu um grupo de brasileiros suspeitos de planejar atentado durante a Olimpíada.
MST e MTST
Os opositores alegam que o projeto defendido por Bolsonaro tem a finalidade política de criminalizar organizações como o Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST), o Movimento dos Trabalhadores sem Teto (MTST) e entidades que reúnem quilombolas e indígenas, entre outras.
Lasier diz que os movimentos sociais continuarão a ter o direito à livre manifestação. O alvo, segundo ele, é outro. “Que seja admitido como conduta terrorista incendiar, depredar, saquear, destruir ou explodir meios de transporte ou qualquer bem público ou privado”, defende o autor do projeto.
Na avaliação do senador, ao vetar esses itens quando sancionou a Lei 13.260/16, Dilma tornou a legislação “parcialmente inócua”. Entre outros pontos, a ex-presidente vetou o trecho que tratava da “apologia ao terrorismo” porque, segundo ela, não trazia “parâmetros precisos capazes de garantir o exercício do direito à liberdade de expressão”.
Censura
Para os críticos da proposta, protestos como os de junho de 2013, que tiveram episódios de depredação de patrimônio público e privado, poderiam ser classificados como terroristas se a mudança proposta por Lasier e Bolsonaro estivesse em vigor.
Os opositores do projeto afirmam, ainda, que até manifestações nas redes sociais poderão ser enquadradas nesse tipo de crime, pois há previsão de punição para quem “recompensa ou louva pessoa, grupo, organização ou associação pela prática de terrorismo.”
“É um ato de censura, de combate ao direito de ir e vir e à liberdade de manifestação, conceituado na Constituição”, classifica o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), autor de um relatório paralelo (chamado de voto em separado) que propõe a rejeição do projeto na CCJ. “Em cima desse texto, podem prender militantes de movimentos estudantis, movimentos sindicais, estamos criminalizando o MST”, acrescenta o senador Lindbergh Farias (PT-RJ).
Genérico
Em audiência na Comissão de Constituição e Justiça em dezembro, o juiz Marcelo Semer, da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD), considerou a proposta desproporcional na definição das penalidades. No caso do crime de “apologia ao terrorismo”, por exemplo, o período previsto para reclusão salta de três meses para quatro anos. O jurista também considera vaga a conceituação das condutas enquadradas.
“É uma coisa muito genérica. Veja, apologia é louvar um terrorista. Eu não sei o que seria ‘louvar’. De repente, se [alguém] faz uma manifestação favorável a uma reivindicação, será que está ‘louvando’ um terrorista? Imagina isso nas redes sociais, com compartilhamentos e curtições [de posts]”, criticou. “O que essa alteração pretende fazer não é combater o terrorismo. É criar o terrorista. É tentar criar um problema que a gente não tem. É completamente sem sentido isso”, completou.
Facções contrariadas
Balanço divulgado pela Secretaria de Segurança Pública e Defesa do Ceará informa que 319 pessoas foram presas até as 17h dessa sexta-feira por suspeita ou flagrante em participação nos ataques registrados no estado desde o último dia 2, promovidos por facções criminosas.
Nessa madrugada, criminosos derrubaram uma torre de transmissão de energia e explodiram uma concessionária de veículos na região metropolitana de Fortaleza. Em seu 11º dia consecutivo, a onda de violência no Ceará já registrou 194 ataques em 43 municípios. Até o momento, segundo o Ministério da Justiça, 35 integrantes de facções criminosas foram transferidos para presídios federais.
As ações começaram depois de o governador reeleito Camilo Santana (PT) criar a Secretaria de Administração Penitenciária e iniciar uma série de ações para combater o crime dentro dos presídios. Foram apreendidos celulares, drogas e armas em celas. O governo anunciou que não dividirá mais os presos conforme a facção criminosa.
O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, atendeu a pedido do governador e autorizou o envio de 406 agentes da Força Nacional para reforçar a segurança no estado. A violência afastou turistas do estado e compromete a vida da população com o clima de pânico, interrupções no transporte público e fechamento do comércio.
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