Samanta Dias, especial para o Congresso em Foco
O Ministério da Defesa divulgou, nesta quinta-feira (28), uma “ordem do dia” sobre o dia 31 de março de 1964 – marco do início do regime militar no Brasil. O documento deverá ser lido em formaturas e eventos regulares das organizações militares nesta quinta (28) e sexta-feira (29).
No texto, as Forças Armadas defendem que a data deve ser entendida no contexto da Guerra Fria, travada “entre as democracias e o bloco comunista”, e que a tomada do poder pelos militares interrompeu “a escalada em direção ao totalitarismo”.
O documento começa com a narrativa dos fatos do ponto de vista dos militares: “As Forças Armadas participam da história da nossa gente, sempre alinhadas com as suas legítimas aspirações. O 31 de Março de 1964 foi um episódio simbólico dessa identificação, dando ensejo ao cumprimento da Constituição Federal de 1946, quando o Congresso Nacional, em 2 de abril, declarou a vacância do cargo de Presidente da República e realizou, no dia 11, a eleição indireta do Presidente Castello Branco, que tomou posse no dia 15”, diz a carta.
Em seguida, o texto faz alusão ao contexto histórico do século 20 e cita as duas guerras mundiais, o surgimento de governos autoritários pelo mundo e o evento conhecido como Intentona Comunista no Brasil, em 1935, para argumentar que o 31 de março de 1964 estava inserido na polarização internacional que se refletia na sociedade brasileira.
“As famílias no Brasil estavam alarmadas e colocaram-se em marcha. Diante de um cenário de graves convulsões, foi interrompida a escalada em direção ao totalitarismo. As Forças Armadas, atendendo ao clamor da ampla maioria da população e da imprensa brasileira, assumiram o papel de estabilização daquele processo”, completa o documento.
Ação do MPF
Na última quarta-feira (27), representações do Ministério Público Federal (MPF) de pelo menos 19 estados brasileiros se organizaram em ação conjunta para impedir que comandos militares realizem comemorações sobre a data.
Segundo o MPF, documentos com recomendações foram enviados para brigadas, grupamentos, comandos especiais, academias militares das forças armadas e outras unidades que integram Comandos Militares em todo o país.
A mensagem afirma que os servidores civis e militares que, no exercício de suas funções, homenagearem o período histórico no qual houve supressão de direitos e da democracia, estarão violando a Constituição Federal, que repudia o crime de tortura e prevê como crime inafiançável a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático.
O MPF pede também que os comandantes identifiquem e tomem medidas disciplinares contra seus subordinados que eventualmente participem de atos em comemoração ao golpe de 1964. E coloca o prazo de 48 para que as medidas adotadas sejam comunicadas ao Ministério Público.
Procurado pelo Congresso em Foco para se posicionar sobre a recomendação do MPF, o Ministério da Defesa respondeu por meio de nota que “a leitura da Ordem do Dia não configura uma ‘comemoração’. A pasta afirma, ainda, que “conforme determinação do Presidente da República, este Ministério, junto ao Comando das Forças Armadas, publicou, na data de ontem (27) a Ordem do Dia que será lida, até 29 de março, em formaturas e atividades regulares das Organizações Militares”.
Ao menos um procedimento de investigação sobre o caso já foi aberto, pelo Ministério Público da Paraíba, com a intenção de apurar possíveis alusões positivas por parte de comando militares ao regime e se essas alusões seriam incompatíveis com atos de um Estado democrático de direito e com a vedação de manifestos políticos em âmbito militar.
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