Na noite de terça-feira de Carnaval (25), após vir a público a informação de que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) havia compartilhado mensagens via WhatsApp endossando uma manifestação contra o Congresso e o Supremo Tribunal Federal, as primeiras reações prenunciavam uma condenação veemente do ato por parte dos líderes do Congresso Nacional. Na quarta-feira de cinzas, entretanto, as primeiras manifestações vindas do parlamento demoraram a chegar e vieram em um tom abaixo do esperado.
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O pronunciamento do presidente Rodrigo Maia (DEM), por exemplo, veio só no começo da tarde de quarta-feira (26). Em dois tuítes, o presidente da Câmara comentou as ações do presidente.
“Criar tensão institucional não ajuda o País a evoluir. Somos nós, autoridades, que temos de dar o exemplo de respeito às instituições e à ordem constitucional. O Brasil precisa de paz e responsabilidade para progredir. Só a democracia é capaz de absorver sem violência as diferenças da sociedade e unir a Nação pelo diálogo. Acima de tudo e de todos está o respeito às instituições democráticas”, escreveu.
Poucos dias antes, quando o ministro general Heleno disse que o governo não poderia mais aceitar chantagens do Congresso o – fala que acabou ensejando as convocações para o ato de 15 de março – Maia reagiu de modo mais veemente.
O presidente da Câmara afirmou que o ministro se tornara um “radical ideológico” e ainda o provocou com a seguinte declaração: “não o vi por parte dele, nenhum tipo de ataque ao Parlamento quando a gente estava votando o aumento de salário dele, como militar na reserva. Quero saber se ele acha se o Parlamento foi chantageado para votar o projeto de lei das Forças Armadas”.
No Senado, o presidente Davi Alcolumbre (DEM-AP) não reagiu, até a manhã desta sexta-feira (28), ao endosso de Bolsonaro às manifestações.
Reação dos líderes
Entre os líderes partidários as manifestações seguiram o mesmo tom. Arthur Lira (PP-AL), que lidera um bloco que hoje aglutina quase 68% da Câmara, avalia que não cabe ao congresso insuflar a opinião pública contra Bolsonaro.
“Houve o vazamento de uma notícia por uma jornalista muito respeitada [Vera Magalhães], que recebeu um print de compartilhamento de vídeo. O compartilhamento é ruim, mas ele gravou um vídeo chamando para o ato? Fez fala? Não. A ponderação nas declarações é para dar uma oportunidade de o governo dizer que não é por aí. Ele no final, do jeito dele, deu recomendação para os ministros não participarem dos atos”, disse. “É um assunto que não é bom, mas a gente não ganha nada em insuflar. Ninguém”, afirmou.
Rubens Bueno, do Cidadania, vai pelo mesmo caminho. Para ele, esse não é o momento de apostar no quanto pior melhor. Ele também destacou o fato de o presidente Bolsonaro ter voltado atrás, quando disse para os ministros não comentarem o vídeo, e que “não cabe avançar mais” em medidas contra o Bolsonaro. “Acho que já botaram água fria na fervura”, avaliou.
Líder do MDB no Senado, Eduardo Braga afirmou que há que se repudiar as ações do presidente, mas com parcimônia. “O Congresso tem que responder às questões nacionais. Há repúdio, o repúdio não precisa ser feito com gasolina, ele pode ser feito de outras maneiras, é claro que o Congresso está repudiando isso.”
Os motivos dos panos quentes
O que subjaz a fala das lideranças fica mais evidente no comentário de Toninho Wandscheer (Pros-PR), vice-líder do governo do Congresso.
“Se nós do Congresso não agirmos de forma coerente e pensando no Brasil e formos retrucar tudo o que o presidente diz, vamos criar um clima impossível de conviver. O Congresso está maduro o suficiente para entender que esse problema não vai parar. O Bolsonaro vai assim até o fim, e nós vamos continuar tocando as pautas que interessam ao Brasil: aprovamos a reforma da Previdência e vamos discutir a tributária e a administrativa”.
Esse “foco nos assuntos que interessam ao país”, segundo Wandscheer, é reflexo da liderança de Rodrigo Maia. “O presidente tem sido muito tolerante porque sabe que o Brasil não pode perder mais quatro anos. O que o país precisa é emprego e renda”, afirmou.
Novo cenário: mais lenha na fogueira
As avaliações parcimoniosas dos parlamentares aconteceram antes da transmissão ao vivo que o presidente fez de suas redes sociais na quinta-feira (27). O presidente voltou a se queixar do Congresso, do Judiciário e atacou, mais uma vez, a imprensa. O tom bélico do presidente pode ter esticado um pouco mais a corda com os parlamentares e dissipado esse clima de tentativa de jogar panos quentes sobre a crise.
A real disposição dos líderes em manter certo clima de normalidade poderá ser medido na semana que vem, quando os os parlamentares voltam a Brasília e os líderes se reunirão para tomar decisões.
A postura da oposição
A oposição não teve, em seus pronunciamentos, a mesma moderação dos presidentes e das lideranças de partidos ao centro e à direita.
“É muito grave o que aconteceu. Não é primeira vez. O comportamento reiterado de ataque às instituições democráticas, se comprovado, é crime de responsabilidade. É preciso que o Congresso se reúna, por meio de seus líderes, e decida quais medidas tomar. É uma questão que não se limita à oposição, mas afeta todas as forças democráticas do país, quem tem compromisso com a democracia”, disse Alessandro Molon (PSB-RJ), líder da oposição na Câmara, ao Congresso em Foco.
Apesar do repúdio mais veemente, o deputado afirmou que para definir a ação do bloco é necessário avaliar o cenário “com prudência e cautela”.
Para o deputado, um eventual pedido de impeachment – como chegou a ser aventado por alguns oposicionistas – precisa ter respaldo das forças democráticas da sociedade civil. “Ainda é cedo. Não pode ser fruto de um ato voluntarista, de iniciativa isolada ou campo político da oposição. É uma conclusão das forças democráticas do país, da sociedade, do Congresso. É cedo para falar qual medida deve ser tomada. Seria precipitado anunciar qualquer medida. É preciso reunir forças do Congresso, comprovar a veracidade dessa denúncia”, declarou.