Os crescentes ataques de Jair Bolsonaro ao governador de São Paulo, Joao Doria (PSDB), na disputa política criada em torno da vacina contra a covid-19, não foram suficientes para convencer grande parte dos deputados tucanos a romper com o presidente. A comemoração de Bolsonaro com a suspensão – hoje revertida – dos testes da vacina desenvolvida pelo governo paulista gerou repúdio do tucanato paulista e de alguns líderes nacionais. Mas não unificou o partido no Congresso. A divisão interna continua.
Deputados do PSDB ouvidos pelo Congresso em Foco afirmam que, fora a bancada paulista e algumas exceções de outros estados, os bolsonaristas são hoje maioria entre os tucanos na Câmara.
“A metade maior é Bolsonaro, independente de qualquer coisa”, disse um congressista do partido que pediu para não ser identificado. Os paulistas ocupam nove das 35 cadeiras da legenda na Câmara hoje. A ala pró-Bolsonaro, que tem gravitado cada vez mais perto do Centrão, é ligada ao deputado Aécio Neves (PSDB-MG), adversário interno de Doria.
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A declaração de Bolsonaro de que havia ganhado de Doria mais uma vez, com a suspensão dos testes da vacina devido à morte de um paciente, ganhou repúdio do líder da bancada na Câmara, o paulista Carlos Sampaio, e de outros nomes de expressão nacional como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), líder histórico do partido. O ex-deputado Bruno Araújo (PSDB-PE), que preside a legenda, também criticou a politização da vacina por parte de Bolsonaro.
Esta não é a primeira vez que a divisão entre a ala paulista do partido e o restante da bancada fica explícita. Nesta legislatura isso já ocorreu em pelo menos três diferentes ocasiões. A primeira delas foi quando Doria tentou patrocinar a expulsão de Aécio, processo arquivado por ampla maioria, por causa das acusações contra ele na Lava Jato.
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A segunda foi a disputa pela liderança na Câmara este ano, que rachou igualmente o PSDB. Para conter as brigas internas, os deputados decidiram continuar sob a liderança de Carlos Sampaio. Embora seja de São Paulo, Carlos foi um dos principais coordenadores da campanha de Aécio à Presidência em 2014.
O terceiro momento em que essa divisão ficou evidenciada foi quando o deputado Celso Sabino (PSDB-PA) aceitou liderar o bloco majoritário da Casa, identificado com o governo, a chamada Liderança da Maioria, à revelia do partido.
A indicação dele foi apoiada por 11 partidos, mas foi invalidada por não ter sido enviada pelo sistema interno da Câmara, mas sim por e-mail. O caso, no entanto, foi parar na comissão de ética, que ainda analisa se expulsa Sabino ou não. O processo de expulsão do paraense, ligado a Aécio, foi interrompido em agosto.
No Senado, o líder do partido, Roberto Rocha (MA), é um dos vice-líderes da Maioria no Congresso. Ele foi o anfitrião do presidente no Maranhão. No estado, foi chamado por Bolsonaro de “melhor senador do Brasil”.
A posição de Rocha, no entanto, não é a mesma de outros colegas da bancada. Ex-presidente do PSDB, Tasso Jereissati desabafou com os demais senadores pelo grupo de Whatsapp do Senado ao comentar a postura do presidente da República.“Meus amigos! Eu não posso deixar de mostrar minha mais profunda indignação diante das declarações do presidente Bolsonaro ao declarar-se vencedor por uma suposição, que um vacina (salvadora de vidas) fracassou e, uma pessoa supostamente morreu! Sem falar na irresponsável atitude da Anvisa. É absolutamente INACEITÁVEL por parte da presidência da república!!! Nunca esperei ver nada parecido no Brasil! O Senado não pode se omitir”, disse o cearense em mensagem destinada aos demais senadores.
Nessa terça, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso foi ao Twitter cobrar decência de Bolsonaro: “É lamentável o que está acontecendo: politização da vacina que nos livrará do coronavírus. A decência e a saúde pública exigem pratos limpo: dado o que disse o Butantã, que a Anvisa se explique. E logo.” FHC já criticou o partido em outras oportunidades por não engrossar o coro da oposição a Bolsonaro. O presidente também é alvo frequentemente de críticas dos tucanos paulistas José Serra e Geraldo Alckmin.
Já Aécio Neves, que tem ficado longe dos holofotes nos últimos anos, tem adotado uma postura mais aberta a um diálogo com o governo. Em agosto, ele divulgou uma nota no qual cobrou do PSDB que “delibere de forma clara sobre quais são os limites da sua relação com o governo Bolsonaro”. O ex-governador e ex-senador mantém diálogo com líderes do Centrão, que hoje fazem parte da base do governo, como o líder do PP, Arthur Lira (AL).
Desde o início do governo, o PSDB já foi cobrado interna e externamente por não assumir uma posição clara em relação a Bolsonaro. O partido apoia a pauta econômica liberal do ministro da Economia, Paulo Guedes, e teve protagonismo na aprovação da reforma da Previdência.