O cargo de embaixador do Brasil nos Estados Unidos está vago há exatos quatro meses, completados nesta sexta-feira (4), à espera da indicação do deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente Jair Bolsonaro. Esse será, a partir da próxima quarta-feira (9), o período de maior vacância na embaixada mais cobiçada pelos diplomatas desde 1976, quando o Brasil vivia em plena ditadura militar. A única vez em que o posto ficou vago por quatro meses foi entre 31 de dezembro de 2014 e 7 de maio de 2015, no governo Michel Temer. Foram 127 dias, tempo que será ultrapassado com sobras, já que o processo de indicação nem começou de maneira oficial e tem um longo caminho pela frente.
Especialistas ouvidos pelo Congresso em Foco consideram que a situação não é a mais adequada. Mas pode ser compensada pela boa relação entre os governos Bolsonaro e Donald Trump. Além disso, os Estados Unidos estão desde novembro de 2018, ou seja, há 11 meses, sem embaixador no Brasil. Situação que deve mudar em breve com a indicação do diplomata de carreira Todd Chapman, feita nos últimos dias, para o posto em Brasília.
“A partir do momento que o Senado norte-americano decidir um nome, se não houver uma indicação de um nome brasileiro, isso pode gerar um desconforto”, considera o professor de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB) Virgílio Caixeta.
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Ele acredita que “a aproximação estreita” entre os dois governos diminui a pressão pelos quatro meses de vacância da chefia da diplomacia brasileira em Washington. Do contrário, segundo Caixeta, poderia parecer uma “desatenção”, o que poderia gerar um atrito.
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O professor de Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Oliver Stuenkel concorda com essa análise. “O fato de nenhum ter, gera uma sensação de equilíbrio, mas agora a indicação de um embaixador para o Brasil aumenta a pressão, sem dúvida”, diz.
Para Stunkel, mesmo sem um “impacto estratégico relevante até o momento, a demora de Bolsonaro para indicar o novo embaixador faz o Brasil perder uma”janela de oportunidade”.
“A ausência cria um problema porque você tem uma janela de oportunidade. Você tem um alinhamento dos presidentes, mas os presidentes não operam essa máquina para que essa aproximação se concretize”, afirma.
Segundo o pesquisador, o “pilar da política externa” do governo Bolsonaro é a intensificação da relação com os Estados Unidos, mas essa aproximação não pode ocorrer apenas em atos executivos. “Para que isso seja algo sustentável, é preciso que essa intensificação ocorra em outros níveis também”, explica.
Ele diz que os norte-americanos estão começando a desconfiar de que as promessas feitas por Bolsonaro a Trump são mais retóricas do que concretas. “A gente já vê uma percepção nos Estados Unidos que muito do que o Brasil está prometendo é ar quente”, diz.
De acordo com Stunkel, a ausência de uma resposta mais firme na crise da Venezuela e a aproximação do Brasil comercialmente com a China são dois exemplos de posições brasileiras que não atendem ao interesse norte-americano.
“Por exemplo, na parte da Venezuela: a ação do Brasil decepcionou. Outro pedido dos Estados Unidos é que o Brasil faça mais para conter a influência chinesa na região: não está acontecendo”, conta.
Congresso reage
Diplomata de carreira, o deputado Marcelo Calero (Cidadania-RJ) afirma que a ausência de um representante do Brasil nos Estados Unidos “prejudica” a interlocução entre os dois países. Para ele, a forma com que o presidente tem conduzido a indicação do novo embaixador em Washington, fazendo todos os esforços para emplacar o filho, demonstra a “visão totalmente deturpada” que Bolsonaro tem sobre o Estado brasileiro. Calero considera a indicação de Eduardo Bolsonaro “ilegal” e “imoral.
Para ele, o fato de não haver um embaixador dos Estados Unidos no Brasil não torna a situação menos desconfortável. “Nós não termos um embaixador é uma mensagem política, como se a gente não desse atenção ao posto”, afirma.
Timing certo
O último brasileiro a ocupar o cargo em Washington foi o diplomata Sérgio Silva do Amaral. Ele deixou a posição no dia 3 de junho deste ano. Mais de um mês depois, o presidente Jair Bolsonaro anunciou que pretendia indicar seu filho para substituí-lo. A data escolhida para o anúncio, um dia após o aniversário de 35 anos de Eduardo, não foi por acaso. Para assumir o cargo de embaixador é necessário ter, no mínimo, 35 anos.
Bolsonaro diz que seu filho tem as credenciais para o cargo: fala inglês, já morou nos Estados Unidos, onde trabalhou em uma lanchonete, foi elogiado publicamente por Donald Trump e preside a Comissão de Defesa e Relações Exteriores da Câmara. Parlamentares da oposição e até simpáticos ao governo discordam da escolha do presidente. Além da relação de pai e filho, contestam a falta de experiência e conhecimento diplomático do deputado.
Veja entrevista exclusiva dada por Eduardo ao Congresso em Foco em 10 de setembro, em São Paulo, em que ele diz ter votos para virar embaixador:
Previdência
Agora, Bolsonaro espera o fim da tramitação da reforma da Previdência no Congresso para oficializar o nome do filho, mas isso pode demorar mais que o planejado. O presidente só quer indicar Eduardo quando tiver convicção de que ele tem os votos necessários para ser aprovado. O deputado disse ao Congresso em Foco que acredita ter apoio suficiente para a aprovação de seu nome, mas líderes experientes avaliam que ainda é desconfortável a situação do filho de Bolsonaro.
No começo da semana, o líder do governo no Senado, Fernando Bezerra (MDB-PE), afirmou que a indicação deveria sair depois do dia 10 deste mês, quando seria votado o segundo turno da reforma no Senado. Esse calendário, no entanto, está comprometido. Insatisfeito com o governo, um grupo de senadores ameaça segurar a votação em segundo turno até que o Executivo atenda as suas reivindicações.
Questionado sobre a demora na indicação, o Itamaraty afirmou que, pela relevância da posição, a nomeação de um embaixador precisa da aprovação do Senado e do país que receberá o representante estrangeiro.
“O governo brasileiro sempre teve e continua tendo, aliás, como todo e qualquer governo, interesse em reduzir ao máximo os períodos em que suas Embaixadas permaneçam sem chefe devidamente acreditado, mas ressaltamos que as várias etapas necessárias para a indicação podem tornar incontornável essa situação”, disse a pasta em nota.
Caso a indicação se confirme, Eduardo Bolsonaro terá de passar por uma sabatina na Comissão de Relações Exteriores antes de ter seu nome submetido ao plenário. O filho do presidente tem feito visitas constantes a senadores em busca de apoio.
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