A exibição de fotos que contradiziam uma declaração do general Augusto Heleno na CPMI dos Atos Golpistas suscitou a hipótese de que o militar fosse preso. Durante a sessão, Heleno disse que não participava de reuniões da cúpula militar junto ao ex-presidente Jair Bolsonaro, o que foi refutado pela fotografia, que data de 2019. Especialistas e parlamentares ouvidos pelo Congresso em Foco, porém, afirmam que “seria uma prisão circense” e que estratégia do governo era “expor a biografia de Heleno, que agora está devidamente manchada.”
Com previsão de entrega do relatório para dia 17 de outubro, outros depoentes da CPMI foram acusados de mentir, como o ex-diretor da Polícia Rodoviária Federal, Silvinei Vasques. Isso provocou uma série de questionamentos sobre a postura vista como branda do presidente Arthur Maia (União-BA) e demais parlamentares membros do colegiado misto da Comissão.
Entretanto, conforme o cientista político e consultor legislativo André César, por mais que a tentativa de Heleno de se descolar de eventos que o complicam em relação ao ex-presidente tenham deixado evidente que ele não está contando toda a verdade, a CPMI se dedica a “expô-lo”.
César explica que Heleno sempre foi um pivô de momentos críticos da vida nacional ligado aos militares. Ele foi ajudante de ordens do general Sylvio Frota, que tentou dar um golpe no governo de Ernesto Geisel, então presidente e favorável ao retorno gradativo do país às mãos da população. Para o cientista político, tanto o percurso do ex-ajudante de ordens Mauro Cid quanto a do general Heleno nos próximos meses serão determinantes para a imagem do Exército, que ficou prejudicada pelo modo como a pandemia foi conduzida.
“A importância e postura de Heleno na caserna torna a situação do Exército constrangedora por ele se meter em golpismo escancarado com uma série de mentiras. Para além do comportamento folclórico de alguns momentos [na sessão da CPMI], se a biografia de Heleno não estava, agora está devidamente manchada”, avaliou César, que acredita que a delação premiada de Cid à Polícia Federal ainda deve piorar a situação do militar.
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Já Ricardo de João Braga, professor de mestrado em Poder Legislativo, diz que seria incorreto avaliar que a CPMI esteja em processo de esvaziamento, porque existe uma separação entre o que prega o estatuto de uma CPI e a prática real dentro da dinâmica política. O objetivo estatutário é de produzir material, esclarecer questões e vocalizar o resultado para a sociedade e, na mão contrária, comunicar aos poderes instituídos, órgãos do governo e do estado que a sociedade por meio de seus representantes está preocupada com o tema.
Braga afirma que a voz de prisão poderia ocorrer, mas isso criaria um espetáculo em torno de uma “prisão circense” que duraria pouco tempo. “Eu desconheço uma voz de prisão que tenha sido dada em uma CPMI que tenha causado algo útil”, analisou.
De acordo com o professor, as forças políticas que buscam combater Bolsonaro e demais personagens ligados a ele dentro da CPMI seguem um calendário em andamento para torná-lo ainda mais debilitado.
Situação X Oposição
O deputado Pastor Henrique Vieira (PSol-RJ) acredita “pessoalmente” que houve “flagrante de contradição” de Heleno durante a audiência. Contudo, há diferença entre o fato e o que é politicamente possível, pois soaria mais “espetaculoso” do que consistente dar voz de prisão ao militar.
“Como estamos em uma casa política, é melhor ficar com o registro [da sessão] porque a PF [Polícia Federal], o STF [Supremo Tribunal Federal] e a imprensa estão vendo e, junto ao relatório da CPMI, mais a frente, ele pode ser indiciado e preso”, disse Vieira.
Para o deputado, o pedido de prisão causaria a impressão de perseguição das Forças Armadas, o que poderia gerar crises dentro da Câmara com chances de escalar até o nível Executivo.
Parte da oposição, o deputado Pastor Marco Feliciano (PL-SP) alega que a CPMI foi cooptada pelo governo desde o início e que há um esforço da base para desfocar o assunto, uma vez que Heleno saiu do Gabinete de Segurança Institucional em 31 de dezembro de 2022 e não teria qualquer relação com a tentativa de golpe de 8 de janeiro de 2023.
“Só o o chamaram ontem porque ele é amigo do Bolsonaro. Fizeram uma acareação violenta contra ele. Os parlamentares cometeram crime ao acusar alguém de um crime que não cometeu. O presidente [Arthur Maia] poderia ter dado voz de prisão aos parlamentares.”