Em momentos de impasses institucionais, líderes políticos gostam de recorrer à grandiloquência dos “pactos” para dar uma satisfação à sociedade ou, ao menos, manter uma convivência menos tempestuosa. Pactos só costumam funcionar quando todas as partes têm realmente vontade que aconteçam. Tudo indica que não foi o caso no acordo anunciado entre os três Poderes em torno das emendas parlamentares ao Orçamento.
Arthur Lira e Rodrigo Pacheco subiram o tom, na defesa do que consideram prerrogativas do Parlamento, o controle sobre uma fatia do Orçamento. Ministros do STF tiraram a toga para negociar os efeitos de uma decisão da Corte. O Executivo, que se considera usurpado pelo Congresso, pareceu mais um figurante, torcendo por um desfecho favorável.
Com algumas concessões dos congressistas — e muitas brechas —, anunciou-se um acordo para dar maior transparência às emendas e ao destino do dinheiro público. No dia seguinte, porém, o senador Davi Alcolumbre, hoje favorito para presidir o Senado nos próximos dois anos, já declarava que será preciso mudar os termos do acerto. Não aceitou restringir as emendas de bancada a obras estruturantes, como quer o governo, ávido por recursos para o PAC. Para o senador, pequenos municípios seriam prejudicados.
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Enquanto a cúpula do Congresso posava com os juízes do STF, avançava na Câmara o projeto de emenda constitucional que limita as decisões monocráticas de ministros do Supremo. A proposta está na Comissão de Constituição e Justiça, presidida pela deputada bolsonarista Carol de Toni, do PL. Ela escolheu como relator o colega de partido Filipe Barros, líder da oposição. O projeto já passou pelo Senado, mas Lira vinha segurando a tramitação. Na semana passada, decidiu tirá-la da gaveta. Um recado mais do que explícito à Corte.
No Senado, a Comissão de Constituição e Justiça aprovava um projeto que altera as regras eleitorais e as de inelegibilidade definidas pela Lei da Ficha Limpa. A votação foi simbólica. Foi aprovado ainda requerimento de urgência para que o texto vá diretamente ao plenário. A autora do projeto é a deputada Daniela Cunha, filha do deputado cassado Eduardo Cunha, ex-presidente da Câmara. Se aprovada, a proposta o beneficiaria e, segundo algumas interpretações, poderia favorecer também Jair Bolsonaro.
As mudanças em torno das emendas acertadas nesta semana invocam um dos mais célebres mandamentos da política, tomado do livro “O Leopardo”, do italiano Giuseppe Tomas di Lampedusa: algo deve mudar se quisermos que tudo continue como está. Ou, no popular, tudo decidido, nada feito.
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