O técnico do Ministério da Saúde,William Amorim Santana afirmou, à CPI da Covid que as três invoices relacionadas à compra da vacina Covaxin pelo governo brasileiro apresentavam irregularidades. O contrato é alvo de investigações da comissão por suspeita de superfaturamento e, de acordo com William, havia inconsistências que iam desde os preços e números de doses até a existência de uma intermediária sediada em paraíso fiscal e o pedido de pagamento antecipado. Ele depôs nesta sexta (9).
A fala de William contradiz a defesa do governo feita pelo ministro Onyx Lorenzoni, quando a denúncia veio à público no mês passado. Onyx afirmou que as invoices citadas por outro servidor da pasta, Luis Ricardo Miranda, em depoimento ao Ministério Público, eram falsas e apresentou outra com data distinta. O relator da comissão, senador Renan Calheiros (MDB-AL) decidiu pedir, então, a convocação do ministro.
“Como consequência, peço a imediata convocação do ministro Onyx Lorenzoni para esta comissão para que ele venha depor sobre o crime de falsidade ao exibir, para confundir a investigação dessa comissão um documento que sequer existe, falso”, disse Renan.
Leia também
As datas dessas invoices foram, então, questionadas pelos governistas.
De acordo com Willian, a primeira nota foi acessada por ele, via Dropbox (sistema de arquivamento em nuvens), no dia 18 de março. O senador Marcos Rogério e, posteriormente, o senador Flávio Bolsonaro disseram que não constavam arquivos baixados naquele dia, mas o técnico foi categórico em dizer que viu o documento. Ele, porém, não baixou o arquivo e, apenas, reencaminhou ao supervisor.
400 milhões de doses
PublicidadeO contrato em questão envolvia a compra de imunizantes Covaxin pelo governo brasileiro junto à Bharat Biotech, representada da Precisa Medicamentos no Brasil. O contrato de 1,6 bilhões está, atualmente, suspenso pela Controladoria-Geral da União (CGU).
William atua como consultor técnico da divisão de importação do departamento de Logística do Ministério da Saúde. O nome dele foi citado no depoimento de Luis Ricardo Miranda, servidor do Ministério da Saúde e do irmão do deputado Luís Miranda (DEM-DF), à CPI da Covid. “A gente está habituado a ter esse tipo de pressão para que faça a vacina chegar o quanto antes. Mas nesse caso em específico ela foi totalmente atípica e excessiva” disse Luis Ricardo na ocasião. Também na CPI, o deputado Ricardo Barros (PP-PR), líder do governo na Câmara dos Deputados, foi acusado pelos irmãos Miranda de ter participação de um esquema envolvendo a Precisa Medicamentos.
Nessa semana, a servidora da pasta Regina Célia Oliveira também implicou William Santana como o responsável pela liberação do contrato.
Erros nas notas fiscais da Covaxin
Wiliam começou o seu depoimento explicando que é consultor técnico da saúde. De acordo com ele, a sua função é analisar invoices. Ele informou à CPI que recebeu o primeiro e-mail da Precisa no dia 16 de março, nenhum depoente mencionou esta data antes.
No dia 18/03, o servidor também recebeu documentos da Precisa por e-mail com a invoice e o contrato da empresa. No mesmo dia, enviou os documentos para a fiscalização de contrato do Ministério da Sáude, departamento chefiado por Regina Célia. No dia 22/03, ele avisou ao setor que a entrega das vacinas Covaxin estava atrasada.
Na data do dia 22 março, Wiliam Amorim percebeu que o documento recebido da Precisa estava com erros de grafia. “Até o nome do Ministério estava errado”, disse.
De acordo com o servidor, nos documentos da Precisa, não havia nem o nome do aeroporto que as doses iam chegar. Ele observou “divergências” na primeira invoice na compra da Covaxin. Havia menor quantidade de vacinas, a empresa vendedora era diferente do contrato, não havia licença de importação, nem o peso ou os lotes, mas indicava o pagamento adiantado.
O senador Renan Calheiro (MDB-AL), afirmou que a revelação de William Amorim é um “golpe” que o governo estava tentando fazer.
Ministério da Saúde sem fornecer dados da Covaxin
Os senadores da CPI reclamaram durante a reunião que o Ministério da Saúde ainda não forneceu os dados do contrato da Covaxin para o colegiado. O senador Renan ressaltou que o atraso na entrega do documento pela pasta está atrapalhando as investigações da CPI da Covid.
Relação com Élcio Franco
Apesar de outros depoentes terem afirmado na CPI que o ex-secretário executivo, Elcio Franco, mediava em outros departamentos do Ministério, William Amorim disse que nunca teve contato com ele.
“Pressão anormal”
William negou à CPI ter sofrido ou exercido “pressão anormal” durante a tramitação do contrato da Covaxin no Ministério da Saúde. Segundo ele, por não ocupar um cargo de chefia isso nunca aconteceu. “Em respeito a escala hierárquica é normal preocupação com os processos”, disse.
Coletiva reforça pretensão de convocar Onyx
Em coletiva de imprensa concedida nesta sexta-feira (9), senadores falaram sobre as imprecisões de datas e as possíveis provas de prevaricação contra o governo federal após análise da documentação apresentada pela empresa Precisa Medicamentos. A senadora Simone Tebet (MDB-MS), voltou a colocar em xeque a defesa do governo federal feita pelo ministro Onyx Lorenzoni.
“No afã de defender o presidente da República e o governo federal, ele apresentou um documento, da primeira invoice, mandou vocês ampliarem, dizendo que aquela primeira invoice era falsa. Saiu nos sites, eu ampliei, e batia com a primeira invoice que chegou para nós pelos funcionários e agora confirmada”, disse Tebet.
O nome do coronel Élcio Franco, ex-secretário-executivo do Ministério da Saúde e braço direito do então ministro Eduardo Pazuello, voltou a protagonizar os depoimentos desta sexta. Segundo o senador Randolfe Rodrigues (REDE-AP), ele é um personagem central nos supostos esquemas de propinas analisados pela CPI. Um dos email enviados pela empresa Precisa ao Ministério da Saúde, como apresentado por Willian Santana, estavam nominalmente destinados ao ex-secretário.
“ Ao meu ver tem um personagem que é central nos esquemas de corrupção que a CPI está investigando e na omissão para a imunização dos brasileiros. Esse personagem é o coronel, Élcio Franco. A gestão era Élcio Franco-Pazuello, o braço operacional era sempre Élcio Franco”, disse o senador.
Na próxima semana, a CPI da Covid continua suas investigações e prevê o depoimento de representantes da empresa Precisa Medicamentos, além do reverendo Amilton Gomes de Paula, ligado à Igreja Batista, acusado de abrir as portas do Ministério da Saúde para a Davati Medical Supply.
> Em carta, CPI pede que Bolsonaro se manifeste sobre falas de Luís Miranda
> Franciele Fontinato diz ter deixado o Ministério da Saúde por “politização”