Outrora, num país distante, bem distante, o jovem Adamastor de Oliveira Neto ingressou no serviço público, depois de concorrido concurso, ocupando o cargo de Analista do Tesouro Nacional. Naquela ocasião, uma das maiores preocupações de Adamastor envolvia sua velhice e a aposentadoria.
O indigitado servidor público ouviu, no órgão de pessoal de sua repartição, uma longa preleção acerca do regime previdenciário aplicável aos servidores públicos. Por cautela, Adamastor pesquisou cuidadosamente a legislação de regência das aposentadorias e constatou que as informações prestadas estavam corretas.
Ele ouviu e leu basicamente o seguinte: a) não teria fundo de garantia pelo tempo de serviço (como ocorria com os trabalhadores do setor privado); b) contribuiria mensalmente para a previdência dos servidores públicos com 11% do total de sua remuneração e c) quando da aposentadoria, depois de 35 anos de contribuição, receberia como proventos o valor integral de sua remuneração.
Na primeira década como servidor, Adamastor recebeu mensalmente a remuneração de 10 mil réis. Nesse período, sua contribuição previdenciária foi de 1.100 réis mensais. Na segunda década de serviço, a remuneração passou a ser de 12 mil réis e a contribuição previdenciária mensal de 1.320 réis. Em treze dos últimos quinze anos de trabalho, a remuneração foi de 15 mil réis e a contribuição previdenciária mensal de 1.650 réis. Adamastor, durante 33 anos, nunca se preocupou com previdência privada ou formação de um “pé de meia” (uma reserva financeira para a aposentadoria). Afinal, por conta das características de seu regime de aposentadoria, essas preocupações não faziam o menor sentido.
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Quando restavam dois anos para a aposentadoria, depois de 33 anos de serviço e de contribuições sobre o total de sua remuneração, foi implementada uma nova reforma previdenciária. O governo de então, a grande mídia e os mais vistosos integrantes do “mercado” conseguiram fazer vingar a ideia da igualdade total e imediata, para todos, dos regimes previdenciários. Assim, todos os trabalhadores (do setor privado e do setor público) passariam a receber o teto do regime geral de previdência. No caso de Adamastor, embora sua última remuneração fosse de 15 mil réis e sua contribuição previdenciária de 1.650 réis por mês, a aposentaria seria paga no valor de 5.530 réis.
PublicidadeOs protestos de Adamastor foram ignorados. Os argumentos de irrazoabilidade e injustiça não foram considerados. O velho servidor tentou o apelo extremo num requerimento administrativo que chegou as mãos do então todo-poderoso Ministro das Finanças. Afirmou Adamastor: “Lá atrás, quando da minha posse, deveria ter sido dito que receberia como aposentado o limite de pagamento do regime geral dos trabalhadores do setor privado. Assim, sem direito ao fundo de garantia por tempo de serviço e sem receber de volta as contribuições ‘excedentes’, teria adotado cautelas de formar uma reserva para esse momento, poupando ou recorrendo à previdência privada. Agora, depois de 33 anos de serviço e contribuições pelo valor integral de minha remuneração ao longo do tempo, não tenho como ‘correr atrás do prejuízo’ ”.
O apelo de Adamastor foi solenemente ignorado, até mesmo pelo pomposo Ministro das Finanças (um banqueiro com aposentadoria farta e fundos milionários em alguns paraísos fiscais). Afinal, o velho servidor público tentava ser, ou continuar sendo, o que de pior podia existir naquela estranha quadra: um maldito privilegiado.
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