Mais uma tragédia se abateu sobre Minas. Não há palavras que consolem as famílias dos prováveis quase 400 mortos e daqueles que tudo perderam. A linda região dos distritos de Brumadinho, que tão bem conheço, se travestiu em verdadeiro mar de lama. Nosso poeta maior já tantas vezes descreveu a alma mineira impregnada de ferro: “Minas não é palavra montanhosa. É palavra abissal. Minas é dentro e fundo. As montanhas escondem o que é Minas. No alto mais celeste, subterrânea, é galeria vertical varando ferro para chegar ninguém sabe onde. Ninguém sabe Minas…”. Mas as palavras e rimas de nosso ilustre itabirano não eram só pra exaltar as riquezas e a essência do único estado da federação que carrega a vocação minerária no próprio nome. Marca inconfundível de nossa história desde o ouro de Vila Rica e os garimpos de Diamantina. Ao contrário, muitas eram palavras tristes e angustiadas.
Nesses dias, após a nova tragédia ocorrida em terras mineiras, outro poema drummondiano, publicado no Cometa Itabirano em 1984, viralizou nas redes sociais: “O Rio? É doce. A Vale? Amarga. Aí, antes fosse mais leve a carga… Quantas toneladas exportamos de ferro? Quantas lágrimas disfarçamos sem berro?”.
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A tensão e as contradições entre crescimento e proteção ao meio ambiente numa perspectiva de desenvolvimento sustentável não é assunto novo. Desde a Revolução Industrial, a paisagem rural e bucólica do mundo feudal cedeu lugar à velocidade do mundo moderno, urbano e fabril. As cidades se tornaram imensas concentrações populacionais e a produção polo gerador de soluções novas e novos problemas.
O novo modo de vida e produção gerou naturalmente seus opositores e críticos. O movimento sindical e socialista clamando por melhores condições de trabalho e equidade social. Mas a atitude predatória em relação à natureza não era central na agenda do mundo moderno, nem à direita, nem à esquerda. A guerra fria, liderada por EUA e URSS, focava o crescimento econômico e a geração de riquezas numa perspectiva comum produtivista.
Só muito tempo depois, no ambiente da revolução comportamental dos idos de 1968, começou-se a colocar o dedo nas feridas do modo de vida contemporâneo. Mas advogando uma sociedade paralela alternativa e não mudanças nos padrões de desenvolvimento. Em 1972, em Estocolmo, foi realizada a 1ª Conferência Mundial sobre Meio Ambiente. Em 1992, tivemos a RIO-92, a Conferência da ONU sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável. A questão ambiental ganhou espaço, inundando a agenda de governos, empresas e organizações da sociedade civil.
Como secretário executivo do Meio Ambiente, em 2002, aprendi muito com o ministro José Carlos Carvalho e sua equipe e presenciei o esforço para a modernização da legislação e do processo de licenciamento ambiental. Como relator da Medida Provisória que alterava a cobrança da Compensação Financeira Pela Exploração Mineral (CFEM) aumentei a alíquota de 2% para 3,5% e alterei a base de cálculo da receita líquida para a receita bruta. Não só aumentei e muito os recursos para municípios e estados mineradores e impactados financiarem seu desenvolvimento sustentável, com destinei 7% para a nova Agência Brasileira de Mineração, 2,8% para a pesquisa científica e tecnológica no setor e 0,2% para o IBAMA, o que é suficiente para financiar todo o setor de controle e licenciamento ambiental do órgão para o segmento.
A estrutura herdada do antigo DNPM é ridícula. É bom que alguns liberais, que defendem radicalmente o “Estado mínimo”, aprendam com a vida sobre a necessidade de um Estado forte e ágil, ainda que enxuto e eficiente, para regular com sabedoria e eficiência as lacunas deixadas pelo mercado. Em Minas Gerais, por exemplo, para 220 barragens e 140 mil processos, temos apenas 35 técnicos, dos quais quatro para fiscalização das barragens, além de quatro caminhonetes e dois veículos pequenos velhos. Só diante de desastres ambientais, como os de Mariana e Brumadinho, é que a sociedade e os governos acordam e choram o leite derramado.
Esperamos todos uma rigorosa apuração, a implacável punição dos culpados e a correção de rumos para o futuro.
Esperamos que a trágica e dramática experiência de Brumadinho seja um degrau de aprendizado para que ferro seja sinônimo de Minas, emprego, renda e desenvolvimento sustentável. E não de lágrimas, como disse o poeta.
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