*Otto Alencar
O óleo que atingiu a foz do São Francisco, em Piaçabuçu (AL), é mais um triste capítulo na história do rio da integração nacional já sufocado e soterrado por milhões de toneladas de sedimentos. O Velho Chico completou 518 anos, no último dia 4. Em mais um aniversário não recebeu o presente necessário: a sonhada revitalização. Ao contrário, ganhou petróleo cru em sua foz, em Alagoas, prejudicial à saúde humana, as suas águas abençoadas e uma ameaça ao abastecimento humano e animal.
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A bacia do Velho Chico é a mais vulnerável entre todas as brasileiras. Ela é fundamental ao País e por obrigação deveria ser protegida. O óleo entrou no rio e nas praias do litoral do Nordeste porque falta uma fiscalização eficiente de Guarda Costeira no Brasil para salvaguardar as nossas fronteiras. O governo federal também demorou a agir para resolver o grave problema do óleo derramado.
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Degradação e agora o óleo, ameaçam o rio, o abastecimento de água, provoca prejuízos aos ribeirinhos, as cidades por ele banhadas, a milhares de nordestinos e brasileiros e impede o desenvolvimento econômico, social, sustentável e humano de uma parte considerável do Brasil.
Ao me deparar diariamente, com a degradação acelerada me pergunto: o que será dos trabalhadores da fruticultura, dos pescadores, das comunidades que têm em sua alimentação o peixe como um dos pratos possíveis do cardápio, se o rio morrer? O que acontecerá ao País se ficar sem a energia gerada para imensas regiões se o Velho Chico não levar mais água as usinas hidroelétricas construídas ao longo do seu percurso – Três Maria, Xingó, Moxotó, Paulo Afonso, Itaparica e Sobradinho?
É importante que o governo federal, os brasileiros entendam que o São Francisco tem a vocação de transformar a região do semiárido. O rio responde por 70% da disponibilidade de água na região Nordeste. Nasci e cresci vendo o rio caudaloso e fundo. Hoje, o nível está tão baixo que me permite ver os bancos de areia, andar a pé em determinados trechos e assistir indignado sua morte e os prejuízos já causados e os que virão.
Estudo elaborado pelo Corpo de Engenheiros do Exército dos Estados Unidos e pela Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), em 2017, revelou que o assoreamento não mata apenas o leito do rio. Berçários, como o de Januária, no Norte de Minas Gerais, o pântano do Rio Pandeiros, conhecido também como “Pantanal Mineiro” e responsável pela maior reprodução de peixes, estão ameaçados pelo assoreamento.
Com a falência do Velho Chico, o ecossistema está sendo altamente degradado pelo mesmo processo de soterramento que atinge a sua bacia. O leito do Velho Chico é castigado com 23 milhões de toneladas por ano de sedimentos, boa parte transportada por afluentes. A perda de profundidade não é a única preocupação.
Todos os dias, milhares de litros de esgoto são despejados. Belo horizonte, por exemplo, joga 30% do seu esgoto in natura, no Rio das Velhas, o afluente mais caudaloso da margem direita do São Francisco.
Há também perda da vegetação da mata ciliar, gerando erosão e desmoronamento de barreiras. Os problemas são agravados ainda pela falta de gestão sustentável dos recursos hídricos na bacia.
É estratégico revitalizar o Velho Chico. O governo federal deveria decretar estado de emergência, iniciar de imediato a recuperação. Se não houver a revitalização, em 2035, pode não chegar mais água na barragem de Sobradinho e os investimentos na transposição serão jogados no lixo.
A prioridade deve ser a proteção das nascentes, das matas nas margens do rio e das veredas, como forma de elevar o volume de água e controlar a erosão. O São Francisco grita por socorro. Ouçamos o lamento desesperado e salvemos o rio para garantir a sobrevivência das atuais e futuras gerações. Revitalização já!
*Otto Alencar é senador da Bahia pelo PSD.