Renata Camargo
Parlamentares do PT da bancada da Amazônia são contrários ao nome indicado pelo ministro do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel, para coordenar o processo de regularização fundiária de terras ocupadas na Amazônia Legal. Nos bastidores, deputados e senadores petistas deixam claro o descontentamento em torno do escolhido para comandar o Programa Terra Legal, do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), o economista Carlos Guedes, coordenador geral do Núcleo de Estudos Agrários Desenvolvimento Rural (NEAD).
O Terra Legal, normatizado pela Medida Provisória 458, encaminhada na semana passada ao Congresso pelo governo federal vai simplificar a regularização fundiária na região. A titulação, que era feita em cerca de cinco anos, poderá ser concluída em 60 dias.
Segundo petistas, o desconforto em torno do escolhido por Cassel se dá por causa de sua naturalidade. Guedes nasceu em Porto Alegre (RS) e, de acordo com parlamentares da bancada, não estaria preparado para resolver as questões do território amazônico.
"A opinião da bancada foi externada ao ministro, mas ele tem toda a autonomia para decidir quem serão os gestores. Fizemos apenas a ponderação: como se trata de uma MP que é só da Amazônia Legal, foi levantado que o perfil poderia ser um técnico da Amazônia", justificou ao Congresso em Foco o senador João Pedro (PT-AM). "Mas foi uma conversa tranquila de companheiro do PT", considerou.
Depois do protesto petista, Cassel reiterou o apoio a Guedes e afirmou que ele "tem profunda afinidade com a regularização fundiária e com a região amazônica". O economista foi delegado federal do MDA no Pará, superintendente nacional de Desenvolvimento Agrário do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), secretário de Planejamento Orçamento e Finanças no Pará e assessor especial do ex-ministro do Desenvolvimento Agrário, Miguel Rosseto.
"O trabalho de regularização fundiária na Amazônia Legal é uma tarefa de enorme envergadura. É um trabalho técnico, que precisa ser conduzido por quem tem conhecimento técnico e por quem conhece profundamente a Amazônia", disse Cassel. "O nome que eu escolhi, Carlos de Guedes, é o de um funcionário concursado do Incra, lotado em Belém, ex-diretor do instituto, ex-delegado nacional do MDA no estado do Pará, ex-secretário de planejamento do governo do Pará e atual coordenador do programa Territórios da Cidadania. Portanto, é alguém que tem profunda afinidade com a regularização fundiária e com a região amazônica", completou.
Confronto
Ao ministro, a bancada insinuou outros nomes. Um dos fortes da lista seria de um ex-presidente do Instituto de Terras do Pará ligado à governadora do estado, Ana Júlia. Os parlamentares, no entanto, não quiseram revelar o nome.
A movimentação do PT do Pará surgiu como um contraponto ao nome do ex-secretário de Planejamento. Guedes deixou o governo paraense em meados de 2007, após desentendimentos internos. Segundo versão dos paraenses, o economista se recusou a devolver à Secretaria de Estado da Fazenda as atribuições que tinham sido incorporadas por sua pasta. A atitude foi interpretada como uma afronta à governadora Ana Júlia.
Além do indicado pelos petistas do Pará, surgiu também o nome do ex-senador Sibá Machado (PT-AC), suplente da senadora Marina Silva (PT-AC), quando ela era ministra do Meio Ambiente. Hoje, o ex-senador ocupa o cargo de conselheiro administrativo do consórcio Energia Sustentável do Brasil, que vai construir a hidrelétrica de Jirau, no rio Madeira, em Rondônia. Não há, no entanto, qualquer sinal de que o nome de Sibá tenha sensibilizado o MDA.
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O próprio Sibá diz não ter interesse na função entregue a Guedes, mas também critica a indicação do economista gaúcho. "No entendimento da bancada, o fato de colocar uma MP desse tamanho para uma pessoa que não é da região seria grosseria. Tem que ser uma pessoa que conheça a diversidade dos conflitos da Amazônia para executar essa missão. É preciso alguém que tenha trânsito na região, que venha facilitar o intercâmbio de negociações. O fato de ser uma pessoa da região Sul seria uma provocação", disse Sibá ao site.
Receio
Sibá disse ainda que a bancada petista está receosa porque a regularização de terras ocupadas na Amazônia é um processo "complicado". Segundo o ex-senador, os parlamentares petistas querem estreitar as normas para evitar beneficiar grileiros.
"O medo da bancada é transformar a regularização em grilagem. Como só será possível regularizar terras até 1,5 mil hectares, o proprietário pode dividir a terra em pedaços menores em nome de laranjas no intuito de aglutinar a terra depois. Isso seria reconhecimento de grilagem", conta Sibá. "E tem também o problema de esticamento da área, de marcar área maior do que a que é de propriedade. Acho que terão que ter um cuidado tamanho", disse.
Na reunião com Cassel, representantes da bancada petista da Amazônia esboçaram ainda a preocupação em torno da estrutura do novo departamento que será criado junto ao MDA. A instância utilizará a estrutura física e o corpo técnico do Incra.
"Quem vai fazer efetivamente esse trabalho são técnicos do Incra. Essa é uma preocupação nossa porque ao requisitar os técnicos vai faltar gente para continuar o trabalho de assentamento por lá", ponderou a senadora Fátima Cleide (PT-RO). "Levantamos essa questão da equipe porque o número de servidores de um local não pode esvaziar o outro. Precisamos aprofundar esse debate", disse também João Pedro.
A expectativa é regularizar a situação de 296 mil posses rurais na Amazônia Legal, que engloba nove estados brasileiros – Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima, Tocantins e Maranhão. Segundo a assessoria de imprensa do MDA, espera-se torna legal 67,4 milhões de hectares de terras.