Restando duas semanas para o encerramento da gestão de Jair Bolsonaro, os dados referentes ao desmatamento acumulado em seu governo ultrapassam a escala dos estados brasileiros. Relatórios do Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite (Prodes), vinculado ao Ministério da Ciência e Tecnologia, apontam a devastação de mais de 93,4 mil km² nos principais biomas brasileiros, área maior do que a soma dos estados do Rio de Janeiro e do Espírito Santo.
A estimativa do Prodes ainda é conservadora. Os únicos biomas cujos relatórios já registram os dados de desmatamento referentes a 2022 são a Amazônia e o Cerrado, os dois mais duramente atingidos nos últimos anos (respectivamente 45,5 mil km² e 33,4 mil km² acumulados desde 2019). Relatórios referentes ao Pantanal, Pampa, Mata Atlântica e Caatinga contam somente com registros de até 2021, ano em que a atual gestão acumulou a soma de 14,4 mil km², quase três vezes a área do Distrito Federal.
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Não foi por acaso
Raul do Valle, especialista em políticas públicas da organização não-governamental WWF, afirma que esse elevado índice de devastação não se dá por acaso. “Nos últimos anos, o desmatamento associado a atividades ilegais aumentou exponencialmente por conta da redução de fiscalização e o desmonte dos órgãos ambientais”, apontou. Mariana Napolitano, gerente de ciências do mesmo instituto, teme que a floresta se aproxime do ponto de não-retorno, quando o desmatamento supera a capacidade de regeneração do bioma.
Se a atividade clandestina foi o fator chave no desmatamento da Amazônia, o Cerrado já sofre com o crescente interesse econômico. “A expansão da agropecuária foi responsável pela destruição de mais da metade da cobertura original do Cerrado e as áreas remanescentes encontram-se fortemente degradadas e fragmentadas”, afirma Napolitano.
Na região Centro-Oeste, majoritariamente coberta pelo Cerrado, o cultivo da soja e a produção de gado já são as principais econômicas em três de seus quatro estados. A destruição do bioma, ao mesmo tempo que provocada pela exploração da região, já começou a dar sinais de ameaça à própria agricultura em outros estados. “Aumento das temperaturas e da seca nos últimos anos têm sido responsáveis pela redução da produtividade de mais de 20% de soja e de milho no Matopiba [bioma entre as regiões Norte e Nordeste] ”, alertou a especialista.