A medida provisória (MP) 910 deve ser votada na sessão plenária desta terça-feira (12), sob protesto de ambientalistas e do Ministério Público Federal (MPF), que avaliam que a medida permite retrocessos com impactos negativos ao meio ambiente. Os ruralistas, por sua vez, defendem a inclusão do texto na pauta e a sua aprovação. O Congresso em Foco conseguiu em primeira mão o relatório da MP 910 (Leia a íntegra).
Diante da iminência da votação, ambientalistas de todo país fizeram uma campanha no Twitter contra a apreciação da MP, com a #MP910Não. A campanha conta com adesão até o MPF e procuradores de diversas regiões do país produziram um vídeo contra a medida.
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No material audiovisual, os procuradores da República explicam aquilo que eles chamam de “graves problemas que serão causados, principalmente na Amazônia, se o Congresso Nacional aprovar a Medida Provisória 910, que dispõe sobre a regularização de ocupações em terras públicas federais”. Para o MPF, a norma deve beneficiar organizações criminosas responsáveis por grilagem de terras, desmatamento ilegal, pistolagem e lavagem de dinheiro.
Negociação
Fruto de intensa negociação, o relatório apresentado pelo líder do Solidariedade na Câmara, Zé Silva (MG), tem avanços importantes em relação a original, segundo deputados ambientalistas. Para o grupo, entretanto, o texto ainda está longe de ser o ideal.”Não vamos deixar votar”, afirmou reservadamente ao site um dos deputados da Frente Ambientalista na Câmara.
Dentre os avanços contidos no texto, está a exclusão da criação de um novo marco temporal para definir que poderia aderir ao programa de regularização fundiária. Conforme o relator havia adiantado em primeira mão ao Congresso em Foco, ele manteve o marco temporal de 2008. Ou seja, só poderão ser regularizadas, terras que “exerçam ocupação e exploração direta, mansa e pacífica, por si ou por seus antecessores, anteriormente a 22 de julho de 2008”.
“Quanto ao marco temporal da ocupação, de que trata o inciso IV do art. 5º da Lei nº 11.952, de 2009, foi proposto pela MPV mudar a data de ocupação de julho de 2008, incluída pela Lei N. 13.465/2017, para 5 de maio de 2014. O parecer do Senador Irajá, por sua vez propôs uma posição intermediária levando a data de corte para 25 de maio de 2012, argumentando que se trata da data de publicação do novo Código Florestal. Entretanto, consideramos que alterar o marco para 2012 irá premiar, com a titulação, mais áreas griladas e desmatadas ilegalmente. Assim, optamos pela manutenção do marco temporal incluído pela Lei 13.465/2017”, explicou o relator em seu texto.
Porém, alguns pontos seguem gerando descontentamento dos defensores do meio ambiente. Um deles é a autodeclaração do ocupante da terra. “Os requisitos para a regularização fundiária de imóveis de até seis módulos serão averiguados por meio de declaração do ocupante, sujeita à responsabilização penal, civil e administrativa”, diz o texto.
“O Incra dispensará a realização da vistoria prévia de imóveis de até seis módulos fiscais, sem prejuízo do poder fiscalizatório, após análise técnica dos documentos referidos”, diz o relatório. Ou seja, quando o Incra receber o documento preenchido pelo proprietário da terra, não enviará um fiscal para conferir a veracidade das informações prestadas.
“A liberação de uma grande quantidade de áreas, principalmente na Amazônia, para uma pequena quantidade de pessoas, pessoas geralmente ricas, pessoas abastadas é prejudicial para todos os brasileiros. Primeiro porque incentiva a degradação ambiental, incentiva o desmatamento da Amazônia e também, principalmente, porque afeta de maneira cruel as populações indígenas, quilombolas, ribeirinhas e pequenos agricultores”, afirmou o procurador da República Felipe Moura Palha no vídeo produzido pela MP.
Para o coordenador do Grupo de Trabalho sobre Reforma Agrária do MPF, Julio Araujo, é preciso lembrar que os milhões de hectares de terras públicas que a MP 910 pode repassar para as mãos de particulares compõem o patrimônio público, patrimônio do povo brasileiro. “Ao deixar de atuar e renunciar a essas receitas, o Estado se omite gravemente e não aponta qualquer sinalização para a proteção de bens jurídicos importantes, como o meio ambiente, as populações tradicionais e os próprios recursos que são de todos”, diz.
“Em síntese, a MP 910/2019 introduz na política de regularização fundiária normas que, por seu conteúdo, promovem o acirramento de conflitos no campo, incentivam a prática de ilícitos ambientais e solucionam o problema da destinação de terras públicas sem dialogar com importantes parâmetros constitucionais, tais como o princípio da função social da propriedade, os princípios da isonomia e da impessoalidade administrativa, o princípio da razoabilidade, as políticas agrícola e de reforma agrária, o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e os direitos conexos à vida, à saúde, à segurança e ao lazer”, afirma nota técnica do MP.
Em seu relatório, Zé Silva afirma que a MP trará avanços importantes para o país. “No nosso modo de ver, os instrumentos legislativos advindos com a MPV em análise significam um verdadeiro avanço na regularização fundiária, devendo ser destacada a ampliação da área, por ocupante, a ser regularizada, respeitando o limite máximo previsto na Constituição Federal para a regularização de terras públicas sem prévia lei específica e individualizada de 2.500 hectares”, diz o relator.