Os incêndios na floresta amazônica assustaram o mundo. Afinal, tanta destruição direta e indireta de vidas é sintoma de barbárie. Há quem diga que não há nada de novo, pois sempre ocorreram incêndios na floresta. Os dados mostram que sim, houve aumento expressivo na taxa de desmatamento e de fogos propositais.
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Com o aumento da destruição da floresta, em todo o mundo surgiram vozes clamando por uma pausa, uma vez que tal degradação representa risco elevadíssimo à vida de todos nós, pois compromete a relativa estabilidade climática que permitiu, nos últimos dez mil anos, a evolução das nossas sociedades. O Brasil, mestre em perder oportunidades históricas, até o momento está perdendo mais uma, mas poderia voltar a assumir o papel de liderança na questão ambiental e assim obter expressivo soft power na agenda internacional, além de possibilitar melhorias na qualidade de vida da sua população. Para tal, é preciso não brigar com os dados e colocá-los em sua devida perspectiva e abrangência.
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É verdade que (quase) todo o mundo tem interesse na Amazônia e em sua preservação? Sim, é fato. É verdade que alguns querem a internacionalização da região? Sim, seja pelos minérios lá existentes, seja para evitar a sua destruição. É verdade também que todos querem – e têm necessidade de – preservar a qualidade do ar, da água e dos solos do planeta? Sim, é verdade. É verdade ainda que, mantidas as tendências atuais, a qualidade do ar, da água e dos solos estará cada dia mais comprometida, em nível planetário? Sim, também é verdade. Então, como poderia o Brasil aproveitar a oportunidade histórica que decorre dessas constatações e reassumir papel de liderança na questão essencial da preservação ambiental para promover a qualidade de vida da sua população?
Em termos de sustentabilidade, não há diferença real – exceto talvez pelo ritmo – entre destruir a Amazônia e destruir – isto é, poluir cada vez mais – a “respirabilidade” do ar, a potabilidade água, ou a fertilidade do solo, tudo isso também em nível planetário.
E, além dos brasileiros, quem mais está poluindo tanto, de diversas maneiras, a ponto de comprometer esses bens comuns, o ar, a água e o solo, e fazendo isso muito mais que os brasileiros? Não são os norte-americanos, os chineses, os europeus, japoneses, australianos e outros?
Que tal o Brasil apontar a semelhança existente entre os danos ao ar, à água e ao solo e a prática de destruir florestas, e conclamar todos a cessar essa destruição dos bens comuns e essenciais? Não se trata, jamais, de argumentar que se outros poluem nós podemos desmatar; trata-se, ao contrário, de fazer o necessário para não desmatar nem poluir, inclusive mediante cooperação internacional.
Embora não saibamos todas as respostas aos desafios de acabar com a degradação e promover a recuperação da qualidade do ar, da água, do solo e das florestas, sabemos que isso é essencial, urgente e que será cada vez mais estratégico neste século 21. Esforços nesse sentido definirão os setores dinâmicos das sociedades nas próximas décadas, a menos que optemos por intensificar a barbárie. Encontrar as respostas exige pesquisa, dedicação, abertura mental e respeito aos dados científicos. Continuar no caminho que temos trilhado – não só nós brasileiros –, ao invés de alterar a rota e conter essa degradação, é deixar irem os dedos (e outras partes do corpo) na ilusão de preservar os anéis.
Embora pareça pouco provável que algumas lideranças do Brasil atual consigam perceber essa necessidade e oportunidade, e muito menos brandir essa bandeira, a oportunidade e a necessidade existem.
O grande desafio a superar é, construir, detalhar e divulgar propostas que possam granjear apoios suficientes para tornar realidade a tarefa de combinar a rápida melhoria da qualidade de vida da população com o urgente fim das práticas poluidoras em geral, de forma a evitar o comprometimento da vida, a humana inclusive. Esse é, muitos já o disseram, o grande desafio do século 21. Reconhecer esse fato e assumir protagonismo na busca cooperativa de soluções abrirá para os brasileiros e para a humanidade perspectivas bem mais favoráveis que a manutenção do business as usual e a perseguição do crescimento continuado num espaço finito.
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