Pode ser votado a qualquer momento no Congresso Nacional a Medida Provisória (MP) 884/2019, que faz alterações no Código Florestal. A medida vem sendo criticada por ambientalistas que veem nela uma anistia para o equivalente a 19 milhões de campos de futebol desmatados ilegalmente.
> MP abre brechas para regularizar propriedades sem compensação por desmatamentos
Segundo Nota Técnica publicada pelo Observatório do Código Florestal (OCF), se aprovada como está, a MP deverá sofrer judicialização. “É inconstitucional por derivar de medida provisória reeditada na mesma sessão legislativa em que ocorreu a perda de sua eficácia por decurso de prazo, ainda que a sua edição tenha se dado em sessão legislativa anterior”, diz OCF na nota. “Novas alterações têm ainda o potencial de gerar novas judicializações, perpetuando-se o cenário de insegurança jurídica”, completa.
Leia também
Outro ponto observado pelos ambientalistas é a regularização automática para áreas desmatadas ilegalmente. “Apuramos que, como está escrito, permite a regularização automática de áreas desmatadas, caso o governo não convoque em até 3 dias (72 horas) quem desmatou ilegalmente”.
Para a secretária-executiva do Observatório do Clima Florestal, Roberta del Giudice, se for aprovado como está, o texto poderá agravar os incêndios que estão acontecendo no Brasil. A falta de definição de um prazo para cadastramento representa, na prática, uma anistia a desmatadores.
“Um dos motivos para os incêndios que estamos vendo é a grilagem de terra e é nesse momento que se vai incentivar isso?”, afirmou a ambientalista na última terça-feira (3) ao Congresso em Foco. “Ao abrir o prazo por tempo indeterminado para a inscrição no PRA [Programa de Regularização Ambiental], estará se incentivando essa atividade criminosa [grilagem]”, completou.
A grilagem em áreas públicas é uma das principais causas do desmatamento na Amazônia. Ela geralmente começa com grupos contratados para desmatar uma região substituindo a floresta por pasto. Queimadas são comuns nessa etapa. A ideia é simular uma propriedade privada dedicada à pecuária.
Com a área aberta, o grileiro forja títulos de posse para poder especular, por meio do pagamento de propina e corrupção em cartórios e outros órgãos de governo. Com títulos de posse falsos, essas áreas públicas são vendidas por milhões de reais.
O medo dos ambientalistas é que se aprovada como está, esta MP incentive este tipo de ação criminosa uma vez que o proprietário poderá ter suas terras regularizadas automaticamente.
> Entenda o que é grilagem. Campanha pede combate à ação criminosa
Confira trecho da Nota Técnica do OCF
Após 4 adiamentos do prazo para a inscrição no CAR, 7 anos da edição da Lei, estamos diante de uma nova tentativa de alteração da norma de proteção da vegetação natural, que vai além da prorrogação do prazo para início da adequação, mas de sua completa extinção.
O PLV nº 22, de 2019, é inconstitucional por derivar de medida provisória reeditada na mesma sessão legislativa em que ocorreu a perda de sua eficácia por decurso de prazo, ainda que a sua edição tenha se dado em sessão legislativa anterior.
A proposta de alteração da Lei de Registros Públicos, matéria alheia à tratada na MP é inconstitucional, configurando-se como “jabutis”. Acima de tudo, a alteração proposta impede o início da adequação à Lei nº 12.651, de 2012, levando à anistia de 19 milhões de hectares de Áreas de Preservação Permanente e Reserva Legal desmatados ilegalmente e que deveriam ser recuperados.
O Código Florestal foi discutido por vários anos no Congresso Nacional e teve sua constitucionalidade confirmada pelo STF. Novas alterações têm ainda o potencial de gerar novas judicializações, perpetuando-se o cenário de insegurança jurídica.
Já foram inscritos no CAR mais de 6 milhões de hectares de imóveis rurais, a interrupção do processo de adequação levará à descrença na implantação das legislações ambientais, dando um sinal negativo para os mercados internacionais mais exigentes.
Também ressaltamos que a NDC brasileira (nossa parte com o Acordo de Paris) prevê a restauração de 12 milhões de ha de vegetação nativa, o que poderia ser alcançado com a recomposição ou regeneração natural de vegetação em APPs e RLs e a consequente legalização do setor. Portanto, o PLV nº 22, de 2019, atende ao interesse de poucos e desconsidera o esforço da maior parte dos proprietários de imóveis rurais e produtores agrícolas brasileiros.
Também desestimula o cumprimento da NDC brasileira e compromete a imagem e a reputação do país na geopolítica global, os compromissos internacionais estabelecidos pelo setor agropecuário e a possibilidade de atrairmos recursos para a proteção das florestas brasileiras. O Observatório do Código Florestal repudia as alterações propostas PLV nº 22, de 2019.
> Base de Alcântara: Urgência para votar acordo com os Estados Unidos é aprovada