A lei 8.666 tem várias camadas de estudo. Este artigo traz uma reflexão sobre um ponto importante: a correção de valores por meio de decreto. Muitas são as vozes contrárias a esse procedimento pelo medo de um ato administrativo monocrático.
Porém, é necessário explicar como a atualização de valores de forma mais rápida e direta pode revigorar a lei, reduzindo a burocracia, e abrir a possibilidade para novos licitantes, o que amplia a concorrência. Afinal, o Decreto número 9.412, publicado no Diário Oficial da União de 19 de junho de 2018, atualizou os valores das modalidades de licitação previstas nessa lei.
Primeiro, é importante deixar claro que a atualização monetária não é mudança de valor e sim a sua correção para adequá-la ao que estava na própria lei quando de sua aprovação pelo Congresso Nacional. A falta dessa correção desde 1998 tem causado o aumento da burocracia e torna a operacionalidade da máquina administrativa muito lenta. Quando não se corrige esse valor por mais de 20 anos, isso gera uma corrente pesada e medonha de burocracia que transforma a Lei 8.666 em uma gigante vagarosa e de difícil manobra.
Entre maio de 1998 e maio de 2018 a inflação medida pelo IPC-A ficou em 242%, acima, portanto da atualização determinada pelo Decreto 9.412. Mas o ponto central deste trabalho são as denominadas modalidades gerais, previstas pela Lei nº 8.666, de 1993, nas quais o valor estimado da contratação dita a modalidade eleita, registrando-se, desde já, que o pregão e o RDC (Regime Diferenciado de Contratações) podem ser consideradas como modalidades próprias, previstas nas suas leis específicas, a despeito da regência subsidiária daquela lei geral também a essas duas modalidades.
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Em relação à correção determinada pelo governo, uma ação análoga de atualização por decreto reconhecida pelo STF (Supremo Tribunal Federal) é a modernização do valor salário mínimo por decreto. Esse espelhamento para a atualização dos valores da lei 8.666 por decreto tornaria o procedimento mais célere, menos burocratizado, abriria espaço para empresas de vários portes. Não corrigir essa falha é um desrespeito à própria lei. E não pode se falar em insegurança jurídica exatamente devido a esse precedente do STF em relação ao salário mínimo.
A tese similar de atualização do salário mínimo por decreto tem sustentação no STF. No caso da lei de licitações, esse raciocínio jurídico reforça a tese de que a correção por índices de atualização monetária é na verdade a preservação do valor estabelecido na lei 8.666. Reforço que a não correção leva a burocratização da administração pública, eleva os custos, quando a lei não é atualizada gera custo para a máquina e deixa de aproveitar o nível ótimo dos servidores públicos.
É importante apresentar essa métrica que pode simplificar a vida dos fornecedores, dar mais acesso ao público das licitações e torna o processo menos diversificado porque possibilita que empresas de médio e pequeno portes participem das concorrências realizadas pelo setor público. Um processo mais simples traz mais competitividade a partir do ponto que o procedimento seja menos complexo.
A correção dos valores definidos na Lei 8.666 pode ter efeito nos órgãos de fiscalização e controle. Uma visão de órgão de controle mais formalista poderia pensar que um decreto por ser apenas processo administrativo, e passando por apenas uma pessoa, seria precário e desmancharia o processo sistemático de regulamentação. Mas creio que órgãos de controle devem estar tentando reformular um pouco esse módulo monocrático de controle no sentido de focar mais no resultado e não apenas em procedimento, na direção do que prevê a Lei 13.655/2018.
Por fim, atualizar os valores por decreto da licitação da Lei 8.666 vai gerar menos custo e menos burocracia na administração pública, trazer mais licitantes. A correção de valores por meio de procedimentos administrativos vai trazer menos custo e mostra que é possível construir um procedimento sistemático mais voltado ao resultado. Os órgãos de controle externo vão entender que essa atualização por decreto, baseado no raciocínio jurídico aplicado ao salário mínimo e reconhecido pelo STF, gera, como pede o escopo constitucional de origem dessas instituições, a economicidade aliada à legalidade.