As goteiras e infiltrações no velódromo do Rio de Janeiro caem também sobre as urnas na cidade que sediou os Jogos Olímpicos de 2016. Com problemas nas instalações elétricas, a estrutura já sofreu dois incêndios. A qualidade e a efetividade do legado do evento estão em xeque, mostra reportagem da nova edição da Revista Congresso em Foco, cuja versão digital já está disponível para assinantes.
Os problemas se acumulam enquanto o ex-prefeito e um dos principais líderes do evento, o ex-emedebista Eduardo Paes (DEM), tenta se eleger governador do estado.
Determinações do Tribunal de Contas da União (TCU) e ações do Ministério Público questionam a organização e o retorno social da Rio 2016, que custou R$ 39 bilhões, dos quais quase R$ 17 bilhões com recursos públicos da União, do estado e da prefeitura. Só para manter a estrutura de pé são necessários R$ 35 milhões por ano. Além disso, não se sabe ainda como realmente o valor de R$ 1,5 bilhão foi gasto nos jogos.
Leia também
Cuidados com a manutenção não foram tomados. O governo municipal deverá arcar com R$ 7 milhões em razão de, aproximadamente, 1.500 danos causados às estruturas após a realização dos jogos. A ordem é do TCU.
Aliados de Cabral
Problemas na gestão da Olimpíada já resultaram na Operação Unfair Play, em que a Polícia Federal e a Procuradoria da República no Rio de Janeiro entendem como mais uma ação criminosa do ex-governador Sérgio Cabral (MDB), antigo aliado de Paes, que agora procura se desvencilhar da herança política do ex-padrinho.
O Ministério Público Federal (MPF) foi à Justiça cobrar R$ 3 milhões de Paes, do governador Luiz Pezão e do ex-ministro do Esporte Leonardo Picciani, ambos do MDB. Segundo o procurador Leandro Mitidieri, eles entregaram um plano de legado “de faz de conta”. O documento deveria mostrar, em detalhes, como população e atletas teriam acesso às dezenas de arenas, piscinas e pistas esportivas depois do fim dos jogos.
“Esses grandes eventos esportivos são uma pegadinha”, afirmou o procurador à Revista Congresso em Foco. “Eles chegam anunciando que vão custar pouco, que não vai ter uso de dinheiro público e que vão deixar um grande legado. O que você observa é que o orçamento sempre estoura. Houve muito dinheiro público para essas construções e chegamos ao legado. Como esses elefantes brancos podem ser utilizados?”
“Desgovernança”
O ministro-relator dos processos de fiscalização das Olimpíadas no TCU, Augusto Nardes, também critica. Para ele, houve “desgovernança” e falta de planejamento na organização dos jogos. “Foi pouco o que ficou para o Brasil”, concluiu Nardes, em entrevista à revista.
“O Rio de Janeiro perdeu a grande oportunidade de se transformar em uma referência para o turismo mundial, apesar de ter uma estrutura positiva que ficou”, continuou o ministro. “Fiz várias reuniões com o governador Pezão, com Paes também, para eles deixarem um legado de segurança, um ambiental e um de esporte.” Para Nardes, a violência no Rio mostra que a segurança pública não melhorou e os atletas não tiveram um ganho substancial.
Olimpíada barata
O velódromo cheio de danos elétricos e infiltrações foi palco de dois incêndios. Não é só. O Centro de Tênis tem infiltrações; não foram construídas escolas e bosques prometidos; um repasse de R$ 400 milhões para desmontar arenas foi gasto, mas as estruturas continuam de pé. Existem milhares de furtos, danos e vícios de construção para serem corrigidos. Como se não bastasse, faltam prestações de contas de R$ 1,5 bilhão repassados pela União.
Paes diz que não pode ser responsabilizado por problemas ocorridos após seu mandato. “As Olimpíadas terminaram muito próximo ao fim do meu governo e a desmobilização das estruturas das Olimpíadas ocorreu, em grande parte, após a minha gestão”, disse o ex-prefeito. “Esses questionamentos devem ser direcionados à atual gestão da prefeitura e ao Ministério do Esporte”, acrescentou.
Para o candidato a governador, a Olimpíada foi um projeto barato, com baixa participação de recursos públicos, e que deixou um legado efetivo à população. “Para efeitos comparativos, entre 2009 e 2016, investimos R$ 65 bilhões em saúde e educação no Rio. E de dinheiro próprio da prefeitura em construções de estádios para os Jogos usamos apenas 1% disso: R$ 650 milhões”, afirmou.