Mais de 157,9 mil concurseiros foram convocados para as provas da seleção do Senado Federal que serão realizadas neste domingo (veja lista de locais aqui). As avaliações serão aplicadas em todas as capitais brasileiras e em Brasília para os cargos de consultor, analista e técnicos legislativos. Estão em jogo 246 vagas imediatas e formação de cadastro de reserva para funções que pagam até R$ 23 mil.
São oportunidades muito tentadoras e que estão movimentando, pelo menos, R$ 40 milhões – valor estimado de arrecadação com inscrições, impressão das provas, contratação de fiscais e aluguel de salas para aplicação. Sem dúvida, é uma quantia bastante significativa e adequada à importância do concurso.
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Com números tão volumosos, haveria de se esperar que o processo seletivo fosse tratado com a maior transparência possível. Infelizmente, não é o que ocorreu. A escolha de servidores no Senado Federal é maculada por irregularidades e suspeitas. São processos que deixam margem para desconfianças que já não combinam com a relevância que o mundo dos concursos adquiriu ao longo dos anos.
Só para relembrar: depois de quase um ano de discussões, a proposta foi autorizada pelo presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP). A Fundação Getúlio Vargas foi contratada por dispensa de licitação e com direito de ficar com toda a quantia arrecadada com as inscrições. É importante deixar claro que não há qualquer irregularidade nessa ação. A opção é prevista na Lei 8.666/93, a Lei das Licitações.
Lançados os editais, os primeiros problemas: o conteúdo programático para consultor legislativo era idêntico ao edital de 2001 – assunto denunciado com exclusividade pelo SOS Concurseiro/Congresso em Foco –, as taxas de inscrições consideradas altas e as exigências para teste físico dignas do concurso da Polícia Federal. A comissão interna se manifestou prontamente e alterou os itens mais polêmicos. As taxas e cobranças físicas continuaram intactas.
Com as inscrições encerradas, a FGV anunciou que não divulgaria o número de inscritos, prática muito comum em todas as seleções públicas. Como não havia nada contrário no contrato, a comissão interna considerou a atitude normal. Pressionada, a organizadora voltou atrás e revelou que a expectativa do Senado foi mais do que superada: ao invés dos 80 mil, 157,9 mil pessoas aderiram à seleção e, por consequência, R$ 36 milhões foram arrecadados.
Não faltam controversas até com relação à escolha da empresa, a mesma responsável pelo concurso de 2008. Naquele momento, houve denúncias de várias irregularidades, inclusive de questões copiadas de outros concursos. Todos os casos foram tratados com menor importância, e o processo transcorreu sem uma apuração adequada. Meses depois, a mesma FGV foi contratada para realizar a auditoria interna que resultou nos dados usados para a reestruturação administrativa do Senado, que ainda não aconteceu.
O fato é que o aclamado modelo democrático de ingresso no setor público precisa de diretrizes mais rígidas. E quando há legislações que delineiam os concursos não se pode haver exceções. Um exemplo é o que irá ocorrer com a Polícia Federal. Na semana passada, foi autorizada a redução de 60 dias para 45 dias do prazo mínimo entre o lançamento do edital e a realização das primeiras provas para a seleção de 600 servidores, cujas regras estão sendo elaboradas pelo Cespe/UnB e devem ser publicadas ainda em março. O prazo foi definido no Decreto 6.944/2009, que norteia os concursos do Executivo Federal. A mesma estratégia foi usada, em 2010, para a seleção do quadro administrativo da Advocacia da União.
De forma análoga – por também se tratar de um tipo de seleção pública – está o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). O instrumento usado para ingressos dos futuros profissionais nas universidades públicas sofreu com um bombardeio de denúncias e, nesta semana, o indiciamento de cinco pessoas no Ceará. O fato é que os administradores devem fazer jus aos objetivos de transparência, impessoalidade e, por minha conta, decência, ao tratarem de concursos, vestibulares e qualquer outro exame público. Não é mais possível lidar com o tema sem a responsabilidade devida.