Auguste Rodin, certa vez, exclamou que “a civilização é apenas uma camada de pintura que qualquer chuvinha lava”. Frase dura, esta. Fiquei a pensar nela há poucos dias, ao rever algumas estatísticas sobre um dos mais antigos e tenebrosos crimes que o ser humano já concebeu: o estupro.
Só para que se tenha uma idéia da extensão do problema, que tal percorrermos rapidamente o planeta? Comecemos pela África do Sul, país no qual uma mulher é violentada a cada 26 segundos. Nos EUA, uma a cada 90 segundos. Na Inglaterra, 167 mulheres são estupradas por dia, e uma a cada 20 já foi vítima deste tipo de crime em algum momento da vida. Na Irlanda, 42% das mulheres sofrem abusos sexuais. Na França, 25 mil mulheres são estupradas a cada ano. E no planeta, em geral, uma em cada cinco mulheres será vítima de estupro em algum momento da vida – algo em torno de espantosos 20%!
O que mais assusta, porém, é a banalização deste tipo de crime, em contraste com o aparente nível de civilização da humanidade. Assim, por exemplo, há poucos meses noticiou-se a comercialização de um videogame no qual o objetivo é estuprar mulheres. Não causa surpresa, pois, a recente prisão, nos EUA, de duas crianças de oito e nove anos de idade, pelo estupro de uma coleguinha de 11 anos.
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Um outro reflexo desta banalização é a impunidade, fruto das barreiras impostas às pobres vítimas. Entre o crime e a punição há as barreiras da vergonha, do preconceito, da indiferença e até da descrença – parece incrível, mas muita gente já começa a analisar este tipo de delito partindo do pressuposto de que “as vítimas tiveram alguma culpa”.
Aos resultados disso tudo: na Austrália, estupradores são condenados em apenas 1% dos casos. Na Inglaterra, o melhor que se conseguiu foi 5% em alguns lugares do país – na média, o índice de condenações ficou entre 1,6% e 2,9%. Na África do Sul apenas 7% dos estupros são objeto de pena. E a “medalha de ouro” ficou com a Áustria, país no qual 20% dos estupros resultam em condenação. Vejam o horror: o “campeão” só consegue punir 20% dos crimes!
Diante deste quadro, mais e mais mulheres simplesmente preferem sufocar a dor aguda que este tipo de crime causa no recato de suas mentes – que jamais voltarão a ser as mesmas. Assim, 47% das mulheres egípcias nunca procuraram as autoridades. No Chile, apenas 3% das vítimas denunciam a violação de que foram vítimas. Nos EUA, não mais que 16%. No Bangladesh, 68% das vítimas preferem o silêncio. Na Irlanda, 80%. Na Rússia, 40%. E no Reino Unido, 87% das mulheres violadas nunca denunciaram os crimes de que foram vítimas na polícia.
PublicidadeÉ diante deste quadro pavoroso que aplaudimos, vivamente, a iniciativa da polícia inglesa de oferecer treinamento psicológico aos agentes encarregados de combater os crimes sexuais. Eles aprenderão sobre os efeitos que este tipo de crime causa nas mentes das mulheres. Terão aulas sobre como atender as vítimas humana e eficientemente em um momento de grande trauma e fragilidade. Receberão instruções até mesmo sobre como livrar-se de preconceitos e julgamentos antecipados, que por vezes acabam causando ainda mais dor às poucas vítimas que ainda se animam em buscar a ajuda do Estado.
Nossos parabéns aos autores deste belo projeto! Afinal, como dizia Einstein, “alegrar-se com a alegria dos outros e sofrer com seus sofrimentos são os melhores guias para os homens”.