No último domingo (18), assisti, já no final do dia, a cenas chocantes. Um cidadão estava dentro do carro com duas crianças, ouvindo música enquanto aguardava o resto da família para embarcar.
Sem saber de onde, surge um homem, ainda jovem, correndo e perseguindo um cachorro. À distancia, vi quando ele jogou um objeto para atingir o animal. Em seguida, recolhe o objeto, que é um de seus sapatos, e se dirige ao cidadão que está dentro do carro. À distância, noto que ele fala alguma coisa e em seguida cospe sobre o cidadão e sobre uma das crianças que também está dentro do carro. O que está dentro do carro não reage.
A cerca de 40 metros do carro, um jovem casal caminha. O mesmo agressor do animal e do motorista se dirige ao casal e não sei o que ocorre, somente vejo os dois homens se soqueando e se atracando no meio da rua.
Essas três cenas que ocorreram em menos de cinco minutos me agridem. Saio rapidamente de perto para também não ser vítima dessa agressividade, aparentemente, sem razão. Ocorre que não saio imune. Saio indignado e triste por não poder fazer nada, pensando nessas crianças que assistem à violência gratuita e que não devem entender nada. Penso no que nos espera no futuro.
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Esse tipo de comportamento não surge da noite para o dia. É fruto de uma construção social. No caso individual, mas muitas vezes é um grupo que se organiza em bandos ou gangues e, sem razão aparente, saem a agredir e a matar.
Pensando, sigo o caminho rumo à minha casa. Estamos às vésperas do Natal e às portas do final de mais um ano. Alguns, talvez uma maioria, dizem que não é momento de olhar para trás, mas sim o da fraternidade, perdão e esperança.PublicidadePara os estudiosos da história e para os que individualmente decidem seu futuro de vida, ou mesmo perante esses fatos a que acabei de assistir, não há como não olhar pelo retrovisor. No passado recente e no momento atual, estamos submetidos à violência física, psicológica, moral e institucional. Portanto, não há como pensar que no Natal se perdoa tudo e todos e a vida ressurge livre, leve, solta e bela.
Posso e devo ser fraterno, caso contrário não conseguiremos uma nova civilização, um novo comportamento e uma cultura de não violência, respeito e solidariedade. Mas, em muitos casos, não há como perdoar.
Após essa breve reflexão, assim como muitos pedem alguma coisa, também peço. Peço aos homens: chega de violência contra as mulheres.
No mesmo domingo de tanta violência (basta ver o noticiário) e da agressão gratuita a um cidadão que, com duas crianças, aguardava a família dentro do carro para sair, houve atos em várias partes do Brasil para denunciar o crime brutal que foi o assassinato de Débora Soriano.
Débora, 23 anos de idade, lutadora da defesa dos direitos humanos, sociais e da igualdade de gênero, foi violentada e assassinada.
Não consigo conceber que homens matem mulheres simplesmente por estas serem mulheres. A violência de gênero, como a agressão física, psicológica, moral, sexual e o assassinato, só ocorrem, no caso do machismo, porque a vitima é uma mulher.
Participei da Comissão Parlamentar Mista (Câmara e Senado) de Inquérito da Violência Contra a Mulher e, sinceramente, em dado momento, cheguei a ter… Me falta a palavra, porque vergonha é pouco para o que quero expressar sobre o comportamento do homem. Não tendo a palavra correta, uso: é nojenta a posição da maioria dos homens em relação às mulheres.
Tenho a certeza de que esse comportamento vergonhoso, nojento, vil, etc, tem um responsável, o Estado. Não há no Brasil políticas públicas de promoção da igualdade de gênero, de prevenção contra a violência e de punição ao agressor.
Não há políticas públicas porque o Estado é machista. Os homens que fazem parte do aparelho de Estado impedem, por serem machistas, que se desenvolvam tais políticas. Não há nada mais concreto acerca da demonstração de um Estado e de um poder mais machista que o governo do usurpador Michel Temer.
Sinceramente não tenho nada a comemorar nestas festas de fim e de começo de um novo ano. Tenho muito a lamentar: golpe de Estado, destruição de políticas públicas de educação, saúde, previdência, assistência social, perseguição político-ideológica aos que pensam diferentemente, aumento da violência contra os pobres, negros, homossexuais, índios e, fundamentalmente, as mulheres.