*Por Milla Maia e Igor Lucena
As origens do conflito entre a Rússia e a Ucrânia, são bem mais antigas do que os últimos acontecimentos, que tomaram conta das mídias a partir de novembro de 2021. Ambos países possuem raízes comuns, contudo avançaram separadamente durante séculos, o que proporcionou o surgimento de duas línguas e culturas – além de Estados com forças e ideologias diferentes.
No século 17, uma extensa área do território atual ucraniano foi integrada ao Império Russo, e a região foi reorganizada em províncias russas. A Ucrânia formou-se como Estado pela primeira vez após a 1ª Guerra Mundial e passou a fazer parte da União Soviética (URSS) a partir de 1922, só se declarando independente em 24 de agosto de 1991.
Os russos, ao longo da história, lutaram para proteger sua extensão, ao utilizar estratégias imperialistas para expandir seu território pelo leste europeu. No período da URSS, esses países formavam um bloco militar chamado Pacto de Varsóvia. Seu adversário era a OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte), organização militar liderada pelos EUA para proteger aliados de um possível ataque soviético.
Quando a União Soviética acabou, em 1991, esta cortina de ferro, que protegia Moscou, se desmanchou. Contudo, desde então, os russos nunca menosprezaram a possibilidade de serem invadidos. Por consequência da expansão territorialista da Rússia, até o século XX, a Ucrânia foi submetida pela URSS e Rússia a grandes pressões para perda de sua identidade nacional, além de períodos de grande fome, que dizimou uma fração dos habitantes do país.
Leia também
Esse contexto levou à rejeição de parte dos ucranianos ao Kremlin, que tem em seu passado um marco deixado pelo governo de Joseph Stalin. Milhões de ucranianos morreram durante o governo de Stalin e, até os dias atuais, a Ucrânia não esqueceu esse grande trauma. Com a extinção do Pacto de Varsóvia, a OTAN ampliou sua expansão para países do leste europeu, para desagrado de Moscou, como a República Tcheca, Hungria e Polônia, em 1999; Bulgária, Estônia, Letônia, Lituânia, Romênia e Eslováquia, em 2004; e Albânia, em 2009.
PublicidadePós sua independência, no ano de 1991, ocorreu então, uma aproximação da Ucrânia com as demais nações europeias e americanas. Principalmente quando o país passou a demonstrar o seu interesse em participar da União Europeia (UE), e ingressar na OTAN. Ponto crucial esse, para entendermos os desentendimentos que anteciparam a disputa até os dias atuais, já que esses movimentos ucranianos foram vistos com desconfiança e insatisfação pela Rússia, que teme a influência ocidental da Ucrânia e suas fronteiras. Vale ressaltar que, em 1994, foi assinado o Memorando de Budapeste, de acordo com o intuito de gerar segurança política e nuclear, no qual a Ucrânia aderiu ao Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares.
O Memorando foi originalmente assinado por três potências nucleares: a Federação Russa, os Estados Unidos e o Reino Unido. China e França mais tarde deram declarações individuais de garantia também. O memorando foi responsável por conter ameaças, como o uso da força contra a integridade territorial acerca da independência política da Ucrânia, assim como da Bielorrússia e do Cazaquistão. Como resultado, Bill Clinton pressionou a Ucrânia, que cedeu o terceiro maior arsenal de armas nucleares do mundo entre 1994 e 1996.
O interesse geopolítico e econômico pela Crimeia
Apesar da crise que acompanhamos ter a Rússia como seu principal ator dentro do contexto internacional, é importante entendermos que a OTAN – Organização do Tratado do Atlântico Norte – tem um papel central, tanto do ponto de vista geopolítico como do ponto de vista militar e da segurança global. A Otan surgiu em março de 1947, com o Tratado de Dunquerque, o qual foi assinado pela França e pelo Reino Unido como um tratado de aliança e assistência mútua no caso de um possível ataque da Alemanha ou da União Soviética, após a Segunda Guerra Mundial.
Em 1948, essa aliança foi ampliada para incluir os países da Europa Ocidental, e passou a incluir a América do Norte, resultando na assinatura do Tratado do Atlântico Norte, em abril de 1949, inicialmente com 12 países. Ao longo dos anos, ele se expandiu para o leste europeu, contando hoje com 30 nações. O alargamento da OTAN se deu, principalmente, com a adesão de antigas nações da União Soviética como a Letônia, a Estônia e a Lituânia. Neste contexto, os novos membros da OTAN saíram da zona de influência de Moscou e passaram a se tornar membros tanto da União Europeia como ligados aos Estados Unidos, principalmente pelo artigo 5º da OTAN, onde precede que um “Ataque a um membro é um ataque a todos os membros”.
Esse é o principal ponto da crítica do presidente Vladimir Putin, o qual vê essa expansão como um ataque a soberania russa e uma espécie de “cerceamento” das suas fronteiras, com bases militares ocidentais ao redor do seu território. A Ucrânia, uma nação que historicamente tem ligação como o povo russo, a qual tem na sua região o berço da civilização russa, vem durante anos fazendo movimentos de ascensão à União Europeia, e com interesses reais em se associar a OTAN, e esse é um passo que o presidente Putin considera inaceitável.
Relação com a OTAN
Apesar da crise que acompanhamos ter a Rússia como seu principal ator dentro do contexto internacional, é importante entendermos que a OTAN – Organização do Tratado do Atlântico Norte – tem um papel central, tanto do ponto de vista geopolítico como do ponto de vista militar e da segurança global. A Otan surgiu em março de 1947, com o Tratado de Dunquerque, o qual foi assinado pela França e pelo Reino Unido como um tratado de aliança e assistência mútua no caso de um possível ataque da Alemanha ou da União Soviética, após a Segunda Guerra Mundial. Em 1948, essa aliança foi ampliada para incluir os países da Europa Ocidental, e passou a incluir a América do Norte, resultando na assinatura do Tratado do Atlântico Norte, em abril de 1949, inicialmente com 12 países.
Ao longo dos anos, ele se expandiu para o leste europeu, contando hoje com 30 nações. O alargamento da OTAN se deu, principalmente, com a adesão de antigas nações da União Soviética como a Letônia, a Estônia e a Lituânia. Neste contexto, os novos membros da OTAN saíram da zona de influência de Moscou e passaram a se tornar membros tanto da União Europeia como ligados aos Estados Unidos, principalmente pelo artigo 5º da OTAN, onde precede que um “Ataque a um membro é um ataque a todos os membros”. Esse é o principal ponto da crítica do presidente Vladimir Putin, o qual vê essa expansão como um ataque à soberania russa e uma espécie de “cerceamento” das suas fronteiras, com bases militares ocidentais ao redor do seu território. A Ucrânia, uma nação que historicamente tem ligação como o povo russo, a qual tem na sua região o berço da civilização russa, vem durante anos fazendo movimentos de ascensão à União Europeia, e com interesses reais em se associar a OTAN, e esse é um passo que o presidente Putin considera inaceitável.
O Conflito atual
Desde o final de 2021, a Rússia intensificou suas tropas militares na fronteira com a Ucrânia, o que resultou em uma invasão terrestre, marítima e aérea dessa região, no dia 24 de fevereiro de 2022. Acontecimento, que validou os temores do Ocidente. Foi o maior ataque de um Estado contra outro na Europa, desde a II Guerra Mundial. A tensão entre Rússia e Ucrânia envolve diversos atores políticos em nível mundial e regional.
Os Estados Unidos têm um papel determinante nesse contexto, por serem a maior potência econômica e militar do mundo, além de serem vistos como opositores da política externa russa. Dessa forma, a Ucrânia buscou apoio dos Estados Unidos e seus aliados, com o intuito de fortalecer suas posições militares e políticas em um possível conflito contra os russos. Esse apoio é percebido, por exemplo, por meio da disponibilização estadunidense de armas e treinamentos para o exército ucraniano. Além disso, os Estados Unidos veem no apoio à Ucrânia uma tentativa de enfraquecer as aspirações territoriais russas e, consequentemente, sua influência geopolítica regional. A Rússia e os Estados Unidos são países com visões opostas, o que tem gerado diversos focos de tensão ao longo do tempo, com destaque para o período da Guerra Fria.
O ataque da Rússia à Ucrânia é, mais uma vez, uma forma de combate aos Estados Unidos, que aconteceu semanas depois que o presidente russo Vladimir Putin se reuniu com Xi Jinping, Secretário Geral do Partido Comunista da China e Presidente da República Popular da China desde 2013. Ambos os lados anunciaram uma parceria estratégica destinada a combater a influência dos Estados Unidos. Juntos, Rússia e China possuem o maior arsenal nuclear da atualidade – principalmente pela força bélica e capacidade de cyber ataque por parte da Rússia e a força econômica, tecnológica e tamanho do exército, por parte da China.
Impactos Globais
Um conflito, como o da Rússia e da Ucrânia, tem potencial para envolver diversos países, de forma que pode dividir o mundo em dois grandes eixos e gerar grandes prejuízos para a economia global. A Rússia, possui um dos exércitos mais fortes do mundo e um número considerável de armas nucleares. Já a Ucrânia, modernizou sua capacidade bélica com armas e equipamentos oriundos de países ocidentais. Assim, o conflito pode evoluir para uma guerra em nível regional e até mesmo mundial – pelo apoio das nações ocidentais, como Estados Unidos e Reino Unido, à Ucrânia, assim como países aliados à Rússia, como Belarus e China.
Além do perigo iminente bélico, a Rússia é hoje o segundo maior produtor mundial de gás natural e uma das maiores nações produtoras de petróleo do mundo. Com as notícias sobre o conflito, os preços do gás europeu aumentaram e as expectativas sobre o preço do petróleo Brent, de referência internacional, ultrapassaram US$ 100 o barril. Fato que não ocorria desde 2014. O fornecimento de gás proveniente da Rússia, que passa pela Ucrânia, poderá ainda ser interrompido, afetando o abastecimento de vários países da Europa Central e Oriental. Cenário esse que pode ocorrer durante o inverno e em meio à pandemia de coronavírus.
Uma das alternativas para conter o avanço russo foi a criação de novas sanções dos países ocidentais à Rússia. O presidente americano, Joe Biden, disse que haverá restrições envolvendo transações do governo russo em moedas estrangeiras e o bloqueio dos ativos dos quatro grandes bancos russos. Biden, com isso, ainda declarou que as relações entre Washington e o Kremlin se encontram em ruptura completa. O primeiro-ministro do Reino Unido, Boris Johnson, também anunciou sanções econômicas, como congelamento financeiro e o banimento de exportações.
Após os últimos acontecimentos do mês de fevereiro, o fato é que a Ucrânia, após sua invasão, vive um jogo de perde-perde. Se continuar a se defender, provavelmente perderá sua autonomia e teremos em poucos dias a queda do governo central de Kiev para o poder militar russo. E se assinar acordos se comprometendo a não se associar a OTAN, vai demonstrar que sua política externa está subjugada aos desejos de outra nação. Fica evidente que uma “caixa de Conclusão pandora” foi aberta. Um marco do início de uma nova era de conflitos significativos entre as potências ocidentais e as potências totalitárias orientais. Reflexo de um histórico de líderes fracos, pouco preocupados com segurança, democracia e liberdade, que pode culminar em enormes impactos geopolíticos, econômicos, sociais e financeiros para a população global.
Os erros do passado, assim, parecem não terem servido como lição para os envolvidos, ao passo que a história se repete. O conflito se mostra longe de acabar, as sanções aplicadas até agora não surtiram o efeito desejado contra o Kremlin, que se mostra preparado estrategicamente e alinhado com a China comunista de Xi Jinping. Sem uma ofensiva forte por parte da OTAN e principalmente dos EUA, ademais das medidas econômicas e diplomáticas, a Rússia continuará tendo força para continuar sua ofensiva.
Seja qual for o desfecho do ponto de vista geopolítico, é importante firmar que se abre hoje uma nova porta do ponto de vista de relações entre nações, onde o Hard Power passa a ter uma relevância cada vez mais forte nos próximos anos. A segurança nacional passa a ter uma predominância no campo das relações internacionais, tão importante quanto a economia e as finanças. Creio que projetos como um Exército Conjunto Europeu devam avançar com mais rapidez na Europa e nações como a Alemanha e Japão (que possuem conflitos territoriais com a Rússia), devem voltar a se armar para proteção de seus territórios e suas populações. De fato, abrimos uma nova corrida armamentista no planeta.
*Milla Maia e Igor Lucena são economistas e doutores em relações internacionais
O texto acima expressa a visão de quem o assina, não necessariamente do Congresso em Foco. Se você quer publicar algo sobre o mesmo tema, mas com um diferente ponto de vista, envie sua sugestão de texto para redacao@congressoemfoco.com.br.