Cinquenta anos se passaram. A experiência democrática foi abortada naquele 31 de março. Os tanques e as tropas partiram de solo mineiro, da minha Juiz de Fora, para derrubar o governo constitucional de Jango. O Golpe de 64 inaugurou uma das páginas mais tristes e sujas de nossa história. A modernização do capitalismo brasileiro foi feito à sombra do autoritarismo. Tortura, mortes, censura, fim da liberdade de expressão, organização e imprensa, cassação de mandatos, fechamento de partidos e do Congresso, perseguição e exílio. Seriam 21 longos e penosos anos. A sociedade foi castrada. As instituições foram apequenadas. A história brasileira manchada de forma definitiva.
Os “50 anos do Golpe de 64!” deram margem a inúmeras matérias na imprensa, seminários, eventos políticos e culturais. E é bom que assim seja. Só tem direito a reivindicar o futuro a sociedade que tem a compreensão a mais precisa possível de seu processo histórico. Os fantasmas da história não devem ser mandados para debaixo do tapete, precisam ser efetivamente exorcizados. Por mais doloroso que isso possa ser.
Alguns relatos às “Comissões da Verdade” são de embrulhar o estômago. Atores da repressão e da tortura narrando fria e cruamente atos desumanos e cruéis. O aprendizado mostra o caminho. Como disse Mário Covas, certa vez, na Assembleia Legislativa de Minas, em belo discurso: “Só pode entender o verdadeiro sentido das palavras quem conheceu seus contrários. Só pode entender o verdadeiro sentido da liberdade quem vivenciou a dura noite do autoritarismo”. Não há outro caminho, não há outros valores tão absolutos e universais, como os da liberdade e da democracia.
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O Século XX foi presidido por um falso dilema. Liberdade versus igualdade. A guerra fria cristalizou uma falsa contraposição entre liberdade, simbolizada pelo mundo ocidental liderado pelos EUA, e justiça social, encarnada no bloco socialista capitaneado pela URSS. Como “tudo que é sólido desmancha no ar”, a história tratou de repor as coisas em seus devidos lugares. Não há caminho para a solidariedade humana, para a equidade social, para a fraternidade, que não seja o da liberdade e da democracia. A liberdade é a grande ideia vitoriosa a iluminar a travessia deste início de Século XXI.
Esse aprendizado é fundamental para o futuro. Numa América Latina que vê renascer experiências populistas e autoritárias, que agridem as liberdades fundamentais do ser humano, é preciso encher os pulmões e, aos quatro ventos e em alto e bom som, dizer: ditadura, autoritarismo, repressão, tortura, nunca mais!
O mantra a ser repetido no Brasil, em Cuba, na Venezuela, no Oriente Médio, na Coreia do Norte ou em qualquer parte do mundo é o que nos ensinou Cecília Meireles: “Liberdade, essa palavra que o sonho humano alimenta, que não há ninguém que a explique e ninguém que não a entenda”.
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