Caranguejo não tinha! Mas os fiéis, os do tempo do Beco do Checo, foram chegando. Aliás, Azolfo já estava lá. Armando entrou junto comigo, e à mesa sentamo-nos. Com pouco, chegaram Zé Botelho, Deuzimar, Patchanga, Ivan Tundelo, Major, Bira, Edmir, Zé Lino, Olívio e mais dois ou três da nova geração. Depois dos calorosos abraços, renovados de sábado em sábado, Celina trouxe a gelada e o peixe frito. Adivinhem por onde começou o bate-papo?
Quem lembrou futebol, Expofeira ou gênero, errou! O assunto introdutório foi a crise.
Deuzimar disse que o desvio de conduta de alguns põe o rebanho a perder. A crise é ética, sustentou. Patchanga não disse nada porque, como sempre, depois do segundo copo, silencia. Botelho falou da retração econômica que está afetando negativamente as vendas de seu pequeno negócio. Azolfo entrou de sola: a crise é política! “Estamos com o barco à deriva, sem governo, tanto lá como aqui, Dilma e Waldez mentiram, estão sem moral para governar”.
Concordo no atacado! A crise é ampla, em sua receita estão presentes os ingredientes que eles apresentaram. Na verdade, a crise é do sistema de poder que nos governa desde sempre. Perguntei-lhes: vocês que são empresários, qual o percentual de impostos sonegados no Brasil?
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Entreolharam-se em silêncio. Deuzimar arriscou: eu acho que ultrapassa 50%. Não? Não chega a tanto, creio que uns 30%, disse Tundelo. Major palpitou, falando em 20%.
Sacanagem, né! Na verdade, a sonegação é a primeira das três grandes sacanagens que infelicitam o Brasil. A sonegação fiscal nada mais é do que o roubo de impostos já devidamente pagos pelo cidadão. Estudos sobre a arrecadação concluíram que 27,6%, ou R$ 518,2 bilhões, foram sonegados em 2014. Dinheiro graúdo surrupiado antes de entrar nos cofres do governo. É no encalço dessa fortuna que os federais se ocupam por meio da Operação Zelotes.
PublicidadeÉ muita grana em poucas mãos.
Para tapar esse gigantesco rombo, o governo nos apronta a segunda sacanagem. Durma-se com um barulho desses: quando não aumenta impostos, recorre aos bancos. Aí, então, o bicho pega de vez! Ficamos reféns da agiotagem do sistema financeiro, de maneira que, de tudo o que produzimos, quase metade vai parar de mão beijada nas burras dos banqueiros. Ano passado, entre juros e amortizações, pagamos R$ 970 bilhões. Eu pensava que a dívida ia diminuir, mas que nada, este ano ela aumentou. Até outubro está próxima de R$ 800 bilhões. Uma desgraça!
Ufa! A terceira grande sacanagem acontece na ponta da aplicação. Atividade criminosa conhecidíssima, identificada como corrupção, que drena, segundo estudos da Fiesp, entre R$ 60 a R$ 100 bilhões ao ano.
Somem as três sacanagens e me digam: tem lógica um negócio desses? Esse sistema político perverso, que assegura a uns poucos o direito de passar a perna na maioria, é tão antigo quanto o Brasil. Tem saída? Claro! Estou seguro que sim, no entanto, urge um freio de arrumação capaz de colocar cada um no seu quadrado, tal qual está fazendo o juiz Sérgio Moro na Operação Lava Jato.
Conversa de boteco é assim: assunto vem… assunto vai… De repente, Zé Botelho interrompeu com suas histórias engraçadas do Afuá, lugar onde metade dos presentes nasceu.
Contou-nos a saga do grego Panajotis Alexopulos, que, descoberto viajando clandestino em um cargueiro, foi atirado ao mar na foz do Amazonas. Reza a lenda que nadou horas até chegar à cidade ribeirinha de Afuá, na Ilha do Marajó. Dali nunca mais saiu, constituiu família e deixou muitos descendentes, entre eles o neto, Alexandre Alexopulos, nosso confrade Patchanga, que não confirma e nem desmente a história, pois, como sabemos, depois do segundo copo, não há no mundo quem consiga dele tirar uma só palavra.
Espero um dia desses encontrá-lo antes do primeiro gole para que, em detalhes, conte-me o que de fato aconteceu com seu avô grego. Afinal! Não custa lembrar, Zé Botelho é um bom contador de causos, logo, pode-se imaginar ter ele entortado, pelo meio do caminho, a história dos Alexopulos.